TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 104.º volume \ 2019
698 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL jurisdição plena, verificar a efetiva existência de incompatibilidade e determinar a consequência legal para a mesma, designadamente fazendo cessar a incompatibilidade (artigo 112.º, n.º 3, da LTC) ou aplicando a sanção de perda de mandato ou demissão (artigo 10.º, n.º 2 e n.º 3, da Lei n.º 64/93). É o que expressamente resulta do disposto nos n. os 1 e 2 do artigo 112.º. Nos casos em que, na pendência do processo, cessou o exercício do cargo político pelo declarante, é também ao Tribunal Constitucional que cabe determinar o arquivamento dos autos por inutilidade ou impossibilidade superveniente da lide. Foi sempre este o entendimento assumido pelo Tribunal, até ao presente Acórdão, nomeadamente nos Acórdãos n. os 218/05, 219/05, 660/05, 249/06, e 654/18. Existe, assim, uma alteração profunda na juris- prudência estabilizada e uniforme do Tribunal, sem que seja possível compreender a justificação para uma tal inversão. – Maria de Fátima Mata-Mouros. DECLARAÇÃO DE VOTO Vencida, por entender que o presente processo não constitui um processo penal, não estando, em vir- tude da sua natureza sui generis, que conjuga finalidades sancionatórias e preventivas, sujeito a uma estrutura acusatória. Julgo ser esta a solução mais compatível com as funções que o legislador quis atribuir ao Tribunal Constitucional, em matéria de declarações de incompatibilidades e impedimentos de titulares de cargos políticos, cabendo-lhe, em caso de dúvida fundada sobre a ocorrência de uma situação de incompatibilidade, nos termos do artigo 112.º, n.º 3, da LTC, um dever de pronúncia, por razões de interesse público e de pre- venção geral. No mais, remeto para as declarações de voto dos Senhores Conselheiros Fátima Mata-Mouros e Lino Ribeiro. – Maria Clara Sottomayor. DECLARAÇÃO DE VOTO 1. Votei vencido quanto à decisão de arquivamento dos autos. Por entender que no caso vertente se encon- tram preenchidos os pressupostos do conhecimento de fundo, sc. da subsunção e valoração dos factos impu- tados ao declarante nas normas pertinentes, concretamente nos artigos 4.º e 10.º da Lei n.º 64/93, de 26 de agosto. Não creio, com efeito, que esta solução esteja insuprivelmente prejudicada pela circunstância de, na sua promoção, o Ministério Público ter entendido não haver “justificação para aplicar ao declarante a sanção pre- vista no artigo 10,º, n.º 3, alínea b), da Lei 64/93”. E isto não obstante (o Ministério Público) ter dado como provado que o declarante incorreu em “incumprimento da lei”, ainda que com a culpa reduzida, por ter agido com “boa fé (…) admite-se que por errada pressuposição de inexistência de tal incompatibilidade”. 2. Vai neste sentido, desde logo, a formulação literal da lei: o artigo 112.º, n.º 1, da Lei do Tribunal Constitucional (LTC) determina simplesmente que o Ministério Público «promova a intervenção do Tribu- nal, se entender que se verifica incumprimento da lei». Tem sido essa, de resto, a interpretação perfilhada pelo Tribunal. Nunca constituiu motivo determinante do não conhecimento o facto de o Ministério Público se ter limitado a promover a intervenção do Tribunal, sem mais (cfr. os Acórdãos n. os 219/05, 660/05 e 249/06), de ter promovido o arquivamento dos autos, por inutilidade superveniente (cfr. o Acórdão n.º 218/05), ou mesmo de ter promovido a não aplicação de sanção (cfr. o recente Acórdão n.º 654/18). Ao contrário do entendimento que obteve vencimento, não me parece que o princípio do acusatório, aplicado ao caso vertente, imponha o arquivamento com a consequente subtração dos factos – ilícitos e culposos – ao juízo do Tribunal. Considero, pelo contrário, que a solução plasmada na lei – concretamente no artigo 112.º da LTC –, tal como vem sendo interpretada e aplicada pelo Tribunal, não deixa de satisfazer as exigências do princípio do acusatório. Que, em primeira linha, postula a separação entre, por um lado, a
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