TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 104.º volume \ 2019

675 acórdão n.º 229/19 situações jurídico-subjetivas, sem que para a medida de desigualdade seja achada uma certa e determinada razão. É que não cabe ao juiz constitucional garantir que as leis se mostrem, pelo seu conteúdo, “racionais”. O que lhe cabe é apenas impedir que elas estabeleçam regimes desrazoáveis, isto é, disciplinas jurídicas que diferenciem pessoas e situações que mereçam tratamento igual ou, inversamente, que igualizem pessoas e situações que mereçam tratamento diferente. Só quando for negativo o teste do “merecimento” – isto é, só quando se concluir que a diferença, ou a iguali- zação, entre pessoas e situações que o regime legal estabeleceu não é justificada por um qualquer motivo que se afigure compreensível face à ratio que o referido regime, em conformidade com os valores constitucionais, pretendeu prosseguir – é que pode o juiz constitucional censurar, por desrazoabilidade, as escolhas do legislador. Fora destas circunstân- cias, e, nomeadamente, sempre que estiver em causa a simples verificação de uma menor “racionalidade” ou congruência interna de um sistema legal, que, contudo, se não repercuta no trato diverso – e desrazoavelmente diverso, no sentido acima exposto – de posições jurídico-subjetivas, não pode o Tribunal Constitucional emitir juízos de inconstitucionalidade. Nem através do princípio da igualdade (artigo 13.º) nem através do princípio mais vasto do Estado de direito, do qual em última análise decorre a ideia de igualdade perante a lei e através da lei (artigo 2.º), pode a Constituição garantir que sejam sempre “racionais” ou “congruentes” as escolhas do legislador. No entanto, o que os dois princípios claramente proíbem é que subsistam na ordem jurídica regimes legais que impliquem, para as pessoas, diversidades de tratamento não fundados em motivos razoáveis.». […]” (itálicos acrescentados). A comparação a que a recorrente alude deve ser feita entre: (a) os proprietários com acessos à estrada construídos antes da entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 13/71, de 23 de janeiro, e que ampliam as suas instalações industriais após a entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 13/71, de 23 de janeiro; e (b) os propri- etários com acessos à estrada construídos depois da entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 13/71, de 23 de janeiro. Para a recorrente, a desigualdade decorreria de, estando os primeiros e os segundos em situações comparáveis, os segundos serem tributados nos termos da alínea g) do n.º 1 do artigo 15.º do Decreto-Lei n.º 13/71, de 23 de janeiro, não o sendo os primeiros. Sucede que a desigualdade – leia-se, a desigualdade proibida pela constituição – não é demonstrável pela comparação que a recorrente construiu, por dois motivos, no essencial. Em primeiro lugar, porque não se retira com suficiente segurança da decisão recorrida que a inter- pretação normativa ali aplicada (que, como vimos, o Tribunal Constitucional não reaprecia) conduziria à tributação do segundo grupo. Aliás, e embora não fosse essa a hipótese em causa, os fundamentos da decisão parecem até apontar para solução contrária: nenhum dos grupos de sujeitos seria tributado (“assim, o facto constitutivo da obrigação de pagamento de taxa é apenas e tão só a construção ou modificação desse acesso, nada sendo referido quanto à ampliação das instalações industriais, ainda que estas sirvam de referência para o cálculo da taxa a pagar quando tal deva suceder, designadamente através do fator multiplicador metro quadrado de pavimento das referidas instalações. Nenhum dos normativos fala em ampliação de instalações fabris mas apenas em estabelecimento do acesso à zona de estrada, o que significa que a ampliação das insta- lações fabris que são servidas por acesso construído antes de 1971, e que no caso dos autos não se sabe se foi modificado/melhorado, não tem relevância constitutiva para efeitos de incidência da taxa em causa”). Em segundo lugar – e sem perder de vista as especificidades do controlo normativo no plano do res- peito pelo princípio da igualdade, atrás assinaladas – não parece possível construir um termo de comparação adequado. Na verdade, não se encontram substancialmente na mesma situação, pelo que não podem ser comparados, os sujeitos que agiram antes e os sujeitos que agiram depois da previsão legal do facto tributário (tal como resultou definido na interpretação afirmada na decisão recorrida – cfr. item 2.1.3., supra ). Sem necessidade de outros argumentos eventualmente mobilizáveis – designadamente, quanto à posição da recorrente, que, mesmo a aceitar-se a sua tese sobre a (des)igualdade (que, como vimos, não se aceita), estaria fora da esfera de proteção do princípio, o qual se destinaria a salvaguardar sujeitos que não seriam sequer partes no processo, ou seja, os hipotéticos terceiros tributados, por oposição à Recorrida –, as

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