TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 104.º volume \ 2019
649 acórdão n.º 216/19 VI É totalmente inaceitável e injustificada qualquer discriminação entre as exigências que são impostas ao Minis- tério Público, em sede acusatória, ou ao Sr. Juiz de Instrução, em sede de pronuncia, quer no que toca à fundamen- tação de facto das decisões, quer no que concerne aos meios de prova que as sustentam. VII Em qualquer dessas fases processuais, impera o rigor, para que a defesa do arguido não possa ser posta em causa, ao invés de um facilitismo em sede de julgamento, quando se trata de alteração não substancial dos factos, onde, na tese perfilhada pela decisão recorrida, se permitem atropelos aos direitos dos arguidos, com total omissão dos meios de prova que fundamentam tal alteração. VIII A omissão perpetrada naquela comunicação impediu que fossem asseguradas todas as garantias de defesa dos arguidos, bem como impediu que a audiência de julgamento ficasse subordinada ao princípio do contraditório, funções constitucionalmente impostas ao processo penal pelos n. os 1 e 5 do artigo 32º da Constituição da Repú- blica Portuguesa. IX Deverá ser julgada inconstitucional a interpretação extraída do n.º 1 do artigo 358º do código de processo penal, conducente ao sentido de que a comunicação da alteração não substancial dos factos, efectuada no decurso da audiência de julgamento, nos termos do citado preceito, não carece de ser acompanhada da referência aos meios de prova indiciária em que se fundamenta». 5. Notificado, o Ministério Público apresentou contra-alegações, tendo concluído do seguinte modo: «1.ª) O presente recurso de constitucionalidade não reveste utilidade prática para o ora recorrente, pois ainda que o recurso tivesse provimento, o que só para raciocinar se pode conceber, o arguido, e ora recorrente, não pode- ria obter mais do que o que já teve nos autos, ou seja, a reiteração da “Comunicação”, de 16 de março de 2017, que contém a enunciação minuciosa da alteração dos factos descritos na acusação que, em substância, respeitam à emissão de faturas nos anos fiscais de 1999 a 2002, com identificação das faturas em causa, como fontes da prova, montantes a considerar para os diversos efeitos, identificação dos sujeitos intervenientes nas relações jurídicas em causa, prejuízos apurados, disposição subjetiva dos arguidos intervenientes e a qualificação jurídica da matéria em causa (fls. 5903 a 5907). 2.ª) O arguido e, ora recorrente, não suscitou, quando podia e devia, a questão de constitucionalidade agora em apreço, da pretensa preterição da indicação dos meios de prova relativos à alteração não substancial dos factos descritos na acusação, com a arguição da irregularidade da “Comunicação” de 16 de março de 2017, com tal fundamento, pois esse era o momento processualmente adequado para o tribunal reapreciar e, sendo caso, reparar a decisão, pelo que não tem agora legitimidade para a presente impugnação e, como quer que seja, tal “Comunica- ção”, por virtude do acatamento que lhe deu o arguido e, ora recorrente, adquiriu força de caso julgado formal e, como tal, é intraprocessualmente imutável. 3.ª) Finalmente, quanto aos pressupostos processuais do presente recurso de constitucionalidade, o caso não é de “aplicação de norma cuja inconstitucionalidade haja sido suscitada durante o processo”, que é a específica causa de abertura do recurso prevista no artigo 70.º, n.º 1, alínea b) , da LOFPTC, antes é de aplicação de interpretação normativa em tudo coincidente com a interpretação propugnada, aqui e agora, pelo arguido e ora recorrente, no sentido em que “a comunicação da alteração não substancial dos factos, efetuada no decurso da audiência de julgamento, nos termos daquele preceito legal, […] carece de ser acompanhada da referência aos meios de prova indiciária em que se fundamenta”».
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