TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 104.º volume \ 2019

636 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL O princípio da igualdade não proíbe o legislador da realização de todas e quaisquer distinções, mas apresenta-se aqui, como decorrência do artigo 13.º, n.º 1, da Constituição, como limite objetivo da discri- cionariedade legislativa, proibindo o arbítrio. Assim, pode o legislador, no âmbito da sua liberdade de con- formação, estabelecer diferenciações de tratamento, desde que fundadas racional e objetivamente e ditadas pela razoabilidade. Pode considerar-se não existir censura constitucional, por outras palavras, quando ocorre um fundamento material suficiente que neutralize o arbítrio e afaste a discriminação infundada (cfr., v. g. , os Acórdãos do Tribunal Constitucional n.º 335/94, do Plenário, ponto III. 2.1., n.º 563/96, Plenário, ponto III. 1.2., n.º 546/11, 3.ª Secção, ponto 12, n.º 641/13, Plenário, ponto 10, n.º 93/14, Plenário, ponto 17, n.º 609/17, 1.ª Secção, ponto 11, e n.º 130/18, 1.ª Secção, ponto 13). Como refere o Acórdão n.º 437/06, 3.ª Secção, ponto 7: «Na verdade, o princípio da igualdade, entendido como limite objetivo da discricionariedade legislativa, não veda à lei a adoção de medidas que estabeleçam distinções. Todavia, proíbe a criação de medidas que estabeleçam distinções discriminatórias, isto é, desigualdades de tratamento materialmente não fundadas ou sem qualquer fun- damentação razoável, objetiva e racional. O princípio da igualdade, enquanto princípio vinculativo da lei, traduz- -se numa ideia geral de proibição do arbítrio (cfr. por todos Acórdão n.º 232/03, (…))». O tratamento diferenciado também não pode ser desrazoável tendo em conta a diferença de situações em presença. 12. A questão de inconstitucionalidade colocada no presente processo está relacionada com a diferença de duração do período experimental legalmente consagrada relativamente aos dois possíveis tipos de contrato – que tem a duração de 90 dias para os contratos de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado (artigo 19.º do Decreto-Lei n.º 248/2009) e de 180 dias para os contratos individuais de trabalho por tempo indeterminado [artigo 112.º, n.º 1, alínea b) , do Código do Trabalho]. Existindo, efetivamente, uma distin- ção entre a duração do período experimental, é de aferir se tal é reconduzível a um tratamento arbitrário ou discriminatório à luz do princípio da igualdade. A aplicação do princípio da igualdade pressupõe a necessidade de comparação prévia das situações em referência para aferir do seu caráter semelhante ou dissemelhante. Só após este raciocínio se poderá aferir se estamos perante situações de facto essencialmente iguais, que devem ser tratadas de forma igual, ou não. O Tribunal Constitucional já teve a oportunidade de se pronunciar sobre as diferenças existentes entre os regimes, embora apenas quanto à questão salarial. No Acórdão n.º 131/18, da 1.ª Secção, o Tribunal Constitucional julgou a norma «segundo a qual o regime remuneratório contido» no Decreto-Lei n.º 122/2010 «se aplica subjetivamente apenas aos enfer- meiros com contrato de trabalho em funções públicas, excluindo os enfermeiros com contrato individual de trabalho (sendo a carreira destes últimos regida pelo Decreto-Lei n.º 247/2009, de 22 de setembro)» resultante da interpretação «dos artigos 1.º, 2.º, 4.º e 5.º do Decreto-Lei n.º 122/2010, de 11 de novembro» (ponto 2.2 do Acórdão). Dito de outra forma, «se a circunstância de existir um regime remuneratório para enfermeiros com vínculo emergente de um contrato de trabalho em funções públicas mais favorável do que o regime decorrente dos contratos celebrados com os Autores, durante certo período, obrigava ou não a ré a remunerar os Autores nos termos do primeiro ao longo desse período» (ponto 2.3.2). Quanto a essa questão, concluiu o Acórdão que: «2.6.1. (…) para efeitos de aplicação do princípio trabalho igual, salário igual, há que determinar se o traba- lho em causa é, efetivamente, igual e que, por regra, não é igual (por natureza) o trabalho prestado ao abrigo de um contrato de trabalho em funções públicas, face ao trabalho prestado ao abrigo de um contrato individual de trabalho.

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