TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 104.º volume \ 2019
635 acórdão n.º 208/19 O recorrente pretende «demonstrar, comparativamente, toda a igualdade entre os regimes legais previs- tos no Decreto-Lei n.º 247/2009, de 22 de setembro, e no Decreto-Lei n.º 248/2009, de 22 de setembro» e que «tal igualdade de regime legal se surpreende, designadamente, no que concerne ao nível habilitacional exigido para a contratação de enfermeiros (cfr. artigo 3.º de ambos os diplomas legais), qualificação para enfermagem exigida (cfr. artigo 4.º nos dois diplomas legais), áreas de exercício profissional (cfr. artigo 6.º em ambos os decretos-leis), estrutura das carreiras profissionais (artigo 7.º), deveres funcionais (artigo 8.º), conteúdo funcional das categorias de enfermeiro e de enfermeiro principal (artigo 9.º e 10.º), condições de admissão (cfr. artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 247/2009, e artigo 12.º do Decreto-Lei n.º 248/2009). Perante tal igualdade de regulação legal, uma categoria de profissionais enfermeiros (os admitidos na entidade empre- gadora ao abrigo de contrato de trabalho em funções públicas) são sujeitos a um período experimental de “somente” 90 dias ( ex vi artigo 19.º do Decreto-Lei n.º 248/2009), enquanto outra categoria (…) (os admi- tidos com contrato individual de trabalho) veem os seus contratos de trabalho submetidos a um período experimental de 180 dias, isto é, o dobro da duração [ao abrigo do artigo 112.º, n.º 1, alínea b) , do Código do Trabalho]» (cfr. alegações de recurso de constitucionalidade, p. 6, fls. 215, verso ). Desta forma, não exis- tiria «fundamento material» para o tratamento diferenciado. 10. O princípio da igualdade «é um dos principais eixos estruturantes do regime constitucional dos direitos fundamentais – um princípio estruturante do Estado de direito democrático e do sistema constitucional da República Portuguesa» (cfr. Acórdão n.º 526/16, ponto 5, disponível em www.tribunalconstitucional.pt , bem como os demais arestos deste Tribunal doravante citados), que «postula, como o Tribunal Constitucional tem repetidamente afirmado, que se dê tratamento igual ao que for essencialmente igual e que se trate diferente- mente o que for essencialmente diferente» (cfr. Acórdão n.º 437/06, 3.ª Secção, ponto 7). A consagração constitucional do princípio da igualdade pode ser encontrada no artigo 13.º da Cons- tituição. O n.º 1 deste preceito estabelece uma afirmação geral do princípio e o seu n.º 2 proíbe a discrimi- nação com base numa listagem exemplificativa de razões. A este propósito, como sumarizado no Acórdão n.º 266/15, 1.ª Secção, ponto 19, do Tribunal Constitucional, lê-se o seguinte: «Recorre-se aqui à conhecida e abundante jurisprudência do Tribunal Constitucional relativa ao princípio da igualdade. Enquanto “vínculo específico do poder legislativo (pois só essa sua ‘qualidade’ agora nos interessa), o princípio da igualdade não tem uma dimensão única. Na realidade, ele desdobra-se em duas ‘vertentes’ ou ‘dimensões’: uma, a que se refere especificamente o n.º 1 do artigo 13.º, tem sido identificada pelo Tribunal como proibição do arbítrio legislativo; outra, a referida especialmente no n.º 2 do mesmo preceito constitucional, tem sido identificada como proibição da discriminação. Em ambas as situações está em causa a dimensão negativa do princípio da igualdade. Do que se trata – tanto na proibição do arbítrio quanto na proibição de discriminação – é da determinação dos casos em que merece censura constitucional o estabelecimento, por parte do legislador, de diferenças de tratamento entre as pessoas. Mas enquanto, na proibição do arbítrio, tal censura ocorre sempre que (e só quando) se provar que a diferença de tratamento não tem a justificá-la um qualquer fundamento racional bastante, na proibição de discriminação a censura ocorre sempre que as diferenças de tratamento introduzidas pelo legislador tiverem por fundamento algumas das características pessoais a que alude – em elenco não fechado – o n.º 2 do artigo 13.º. É que a Constituição entende que tais características, pela sua natureza, não poderão ser à partida fundamento idóneo das diferenças de tratamento legislativamente instituídas” (cfr. Acórdão n.º 569/08, n.º 5.1. Neste ponto o aresto cita o Acórdão n.º 232/03, n.º 2 da Fundamentação, onde se analisa a jurisprudência relativa a este princípio. Esta posição foi reafirmada recentemente através do Acórdão n.º 581/14, n.º 8)». 11. O parâmetro que o recorrente convoca é o princípio da igualdade na sua dimensão de proibição do arbítrio (artigo 13.º, n.º 1, da Constituição), não constando o tipo de vínculo entre trabalhador e emprega- dor (público, através de um contrato de trabalho em funções públicas, ou privado, através de um contrato de trabalho) entre as características que poderiam justificar a aplicação do artigo 13.º, n.º 2, da Constituição.
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