TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 104.º volume \ 2019

629 acórdão n.º 208/19 36.ª) Igualmente, o segundo argumento apresentado pelo Tribunal da Relação de Coimbra no seu acórdão – a circunstância dos enfermeiros com contrato de trabalho em funções públicas estarem sujeitos a um sistema de avaliação de desempenho adaptado do SIADAP (“Sistema Integrado de Gestão da Avaliação de Desempenho na Administração Pública”), por força do art. 21.º do DL n.º 248/2009, não é minimamente relevante para funda- mentar a diferenciação de regime em matéria de período experimental. 37.ª) O referido SIADAP encontra-se legalmente estruturado, em termos gerais, na Lei n.º 66-B/2007, de 28.12 (com as alterações introduzidas por diversos diplomas posteriores: Lei n.º 64-A/2008, de 31.12, Lei n.º 55-A/2010, de 31.12, e Lei n.º 66-B/2012, de 31.12), de ora em diante designada, abreviadamente, por LSIADAP, sendo que aos enfermeiros com contrato de trabalho em funções públicas aplica-se, em alguns pontos, a Portaria n.º 242/2011, bem como o subsistema “SIADAP 3” ( ex vi artigo 9.º, n.º 1, alínea c) da LSIADAP). 38.ª) Porém, os objetivos do SIADAP não respeitam à avaliação dos trabalhadores durante o período experi- mental (cfr. artigo 6.º da LSIADAP). 39.ª) Acresce que a periodicidade da avaliação dos enfermeiros seria, se não bienal (artigo 9.º, n.º 3, alínea c) , e artigo 41.º da LSIADAP), quando muito, anual e referir-se-á ao desempenho demonstrado no ciclo de avaliação anterior e os objetivos traçados para o mesmo (artigo 3.º, n.º 3, e artigo 18.º, n.º 1, ambos da Portaria n.º 242/2011). 40.ª) Logo, a avaliação em sede de SIADAP será efetuada em momento já muito posterior ao fim do período experimental a que tais enfermeiros da função pública estão sujeitos (90 dias), pelo que não poderá relevar para efeitos de apreciação da adequação do trabalhado durante tal período inicial. 41.ª) E, se bem se entende o disposto nos artigos 52.º e 53.º, n.º 1, da LSIADAP, os efeitos da avaliação do desempenho individual não contemplam a possibilidade de extinção do contrato de trabalho pela entidade empre- gadora (incluindo ao abrigo do período experimental). 42.ª) Considerando que a norma legal em crise trata de matéria de período experimental, não se pode olvidar que tal período “corresponde ao tempo inicial de execução do contrato de trabalho, durante o qual as partes apre- ciam o interesse na sua manutenção” (artigo 111.º do “Código do Trabalho”). 43.ª) Ou seja, é o momento inicial da relação laboral, que serve para possibilitar aos contraentes uma avaliação dos termos concretos da execução do contrato de trabalho (Tatiana Guerra de Almeida, Do Período Experimental no Contrato de Trabalho , Livraria Almedina, Coimbra, 2007, pág. 28), com a finalidade de possibilitar “a certificação a posteriori daquilo que não é possível certificar a priori ” (Jorge Leite, Direito do Trabalho , volume II, Coimbra, “Serviços de Ação Social da Universidade de Coimbra”, 2004, p. 75). 44.ª) É certo que até ao fim do período experimental, e salvo acordo escrito das partes, qualquer uma destas poder fazer terminar (denunciar) o contrato de trabalho, sempre sem necessidade de invocar justa causa e tenden- cialmente sem observar aviso prévio (artigo 114.º, n.º 1 do CT). 45.ª) No entanto, mesmo para além do fim do período experimental, o trabalhador goza sempre, em princípio, da faculdade de terminar o seu contrato de trabalho por mera denúncia e sem necessidade de invocar qualquer justa causa (artigo 400.º do CT), embora obrigado a cumprir avisos prévios – cumprimento que, no entanto, não condi- ciona a validade ou eficácia da denúncia, embora gere responsabilidade civil – artigo 401.º do Código do Trabalho. 46.ª) Diversamente, o empregador, findo o período experimental apenas poderá, por sua unilateral iniciativa e vontade, fazer extinguir a relação laboral nos precisos termos e condições prescritos na lei, designadamente, nos artigos 343.º e seguintes do “Código do Trabalho”. 47.ª) Assim, no que tanja, designadamente, aos motivos, formalidades e procedimento para a extinção do contrato de trabalho pelo empregador, este encontra-se severamente mais vinculado à observância da lei – conside- rando, igualmente, o disposto no artigo 339.º desse mesmo diploma. 48.ª) As normas legais consagradoras de períodos experimentais nos contratos de trabalho devem ser conside- radas como de natureza excecional e não podem deixar de ser qualificadas como verdadeiras restrições à garantia de segurança no emprego e ao direito do trabalho na sua “dimensão negativa, que é aquela que decorre do direito à não privação arbitrária do emprego que se procurou e obteve” – conforme consignado no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 632/08 e, v. g. , Jorge Reis Novais ( As restrições aos Direitos Fundamentais não expressamente

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