TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 104.º volume \ 2019
607 acórdão n.º 186/19 20.º E um tal procedimento não se pode configurar como uma restrição arbitrária ao duplo grau de jurisdição, mas, muito pelo contrário, como uma efetiva aplicação deste mesmo grau de jurisdição (cfr. Acórdão recorrido): “Ora, a permissão legal para que o tribunal de recurso supra uma nulidade da sentença de primeira instân- cia consistente na omissão de pronúncia sobre uma questão que a ter disso [sido] decidida desfavoravelmente, teria facultado ao arguido o direito de recorrer para o mesmo tribunal, não se afigura uma restrição arbitrária ao duplo grau de jurisdição, na medida em que fica assegurado que a concreta questão é sujeita a decisão em recurso pelo Tribunal da Relação.” 21.º Por último, como igualmente referido pelo Tribunal da Relação do Porto, a solução legal encontrada responde a preocupações de realização da justiça penal com economia e celeridade (cfr. ibidem ) (destaques do signatário): “Ademais, existem boas razões de efetividade na realização da justiça penal com economia e celeridade para o legislador ter consagrado essa solução no artigo 379.º n.º 2 do CPP. Se ao tribunal de recurso não fossem con- cedidos os poderes de cognição necessários para suprir uma omissão de pronúncia na sentença recorrida, isso levaria apenas que a sentença tivesse que ser anulada e o tribunal de primeira instância de se pronunciar sobre uma questão da qual caberia de novo recurso para o Tribunal da Relação e, até salvo caso de impossibilidade, para o mesmo relator (ver artigo 426.º n.º 4 do CPP). Portanto, de uma ou de outra forma, a decisão sobre a questão suscitada pelo arguido sempre caberia ao tribunal de recurso, não se vendo assim em que medida a solução comprimiu de forma irrazoável o seu direito ao recurso. 22º Quanto à violação do art. 201.º da Constituição, também se crê que assiste razão ao tribunal recorrido, quando afirma (cfr. Acórdão recorrido) (destaques do signatário): “Não vemos, de todo, como possa o artigo 426.º n.º 4 do CPP violar o artigo 210º da CRP. É para nós manifesto que a possibilidade de suprimento da nulidade da sentença de primeira instância pelo tribunal de recurso não ofende em nada a norma que define a nomenclatura e instâncias dos tribunais judiciais. ” Dir-se-ia, até, que justamente a respeita e concretiza, ao permitir que o tribunal superior supra as deficiências do decidido pelo tribunal inferior. 23.º Em termos de jurisprudência deste Tribunal Constitucional, foi, desde sempre, sublinhada a ampla margem de conformação do legislador em matéria de recursos (cfr., por exemplo, Acórdãos 489/95, 501/96, 125/98, 77/01, 94/11, 147/12, 774/14, 280/15). 24.º Por outro lado, não existe um ilimitado direito de recurso, extensivo a todas as matérias (cfr. por exemplo, Acórdãos 287/90, 107/12, 243/13, 7/14, 482/14, 266/15). 25.º Todavia, há que ter presente que, «se o legislador, apesar de a tal não estar constitucionalmente obrigado, prevê, em certas situações, um duplo ou triplo grau de jurisdição, na respetiva regulamentação não lhe é consentido adotar soluções desrazoáveis, desproporcionadas ou discriminatórias, devendo considerar-se vinculado ao respeito
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