TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 104.º volume \ 2019
57 acórdão n.º 134/19 prevalecentes, devendo recorrer-se aqui ao princípio da proporcionalidade, explicitamente consagrado, a propósito dos direitos, liberdades e garantias, no n.º 2 do artigo 18.º da Constituição. É o que ocorre, manifestamente, com aquela interpretação dos artigos 1.º, n.º 6, e 2.º, da Lei n.º 1/2004: estando reunidos, antes da publicação da Lei n.º 1/2004, todos os requisitos legais para o reconhecimento, através de ato estritamente vinculado, do direito do interessado à aposentação nos termos do Decreto‑Lei n.º 116/85 – e sendo esse direito efetivamente exercitado em plena vigência deste diploma –, do que se trata, com o critério normativo em apreciação, é, em rigor, da destruição retroativa de um “direito adquirido” (Acórdão n.º 158/08). Por outro lado, é de notar que o critério normativo em apreciação “conduz ao tratamento desigual de situações idênticas, em função de o processo ser ou não enviado à Caixa Geral de Aposentações, o que não pode deixar de violar o princípio da igualdade enquanto manifestação do princípio do Estado de Direito” (Acórdão n.º 615/07).» 9. A diversidade entre a norma apreciada no Acórdão n.º 186/09 e a que constitui o objeto do pre- sente processo prende-se com o critério de determinação da lei aplicável ao cálculo da pensão: num caso, o momento em que é proferido o despacho que reconhece o direito à aposentação; no outro, o momento em que o processo de aposentação é enviado à CGA. Em ambos os casos, porém, coloca-se a questão de saber se é constitucionalmente admissível um critério de determinação do regime aplicável que desconsidere a salvaguarda dos direitos adquiridos em matéria de cálculo da pensão. Com efeito, o artigo 43.º, n.º 1, do EA, na parte aqui em apreciação, aparentando ser uma norma de direito transitório formal neutra, determina a aplicação da lei nova a situações jurídicas já constituídas, nomeadamente o direito à fixação da pensão de acordo com a lei vigente no momento em que é apresentado o pedido de aposentação, caso o interessado reúna já nesse momento todos os requisitos legais para a apo- sentação. Tal direito integra a sua esfera jurídica com a natureza jurídica de verdadeiro direito subjetivo e, quanto ao mesmo, o reconhecimento do direito à aposentação possui uma eficácia declarativa. Isso mesmo decorre da alínea a) do n.º 2 do artigo 66.º das Bases Gerais do Sistema de Segurança Social, estabelecidas pela Lei n.º 4/2007, de 16 de janeiro, com as alterações introduzidas pela Lei n.º 83-A/2013, de 30 de dezembro, quando define «direitos adquiridos», por contraposição a «direitos em formação», como aqueles que «já se encontram reconhecidos ou possam sê-lo por se encontrarem reunidos todos os requisitos legais necessários ao seu reconhecimento.» (vide os Acórdãos n. os 187/13 e 862/13). Ou seja, desde que se verifi- quem os pressupostos legais da aposentação voluntária, incluindo o respetivo pedido, o conteúdo da situação jurídica de aposentado encontra-se fixado ope legis , passando a gozar a partir desse momento da tutela própria dos direitos adquiridos. Isto sem prejuízo das faculdades previstas nos n. os 4, 5 e 6 do artigo 39.º do EA e, bem assim, do dever de a CGA considerar a situação do requerente à data em que é proferido o despacho a reconhecer o direito à aposentação (artigo 43.º, n.º 1). O principal fundamento invocado pelo Tribunal para a declaração de inconstitucionalidade da norma apreciada no Acórdão n.º 186/09 foi o princípio da proteção da confiança, que respeita a expetativas quanto à continuidade e estabilidade da ordem jurídica e à permanência e regularidade das situações e relações jurí- dicas constituídas. A jurisprudência constitucional densificou-o através da definição dos respetivos pressu- postos essenciais (Acórdão n.º 287/90) e da tradução destes numa sequência de requisitos ou testes (Acórdão n.º 128/09). A síntese dessa jurisprudência, regularmente reiterada nas decisões que aferem da violação do princípio da proteção da confiança, encontra-se nas seguintes palavras do Acórdão n.º 128/09: «Para que [a confiança] seja tutelada é necessário que se reúnam dois pressupostos essenciais: a) a afetação de expectativas, em sentido desfavorável, será inadmissível, quando constitua uma mutação da ordem jurídica com que, razoavelmente, os destinatários das normas dela constantes não possam contar; e ainda b) quando não for ditada pela necessidade de salvaguardar direitos ou interesses constitucionalmente prote- gidos que devam considerar-se prevalecentes (deve recorrer-se, aqui, ao princípio da proporcionalidade,
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