TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 104.º volume \ 2019
555 acórdão n.º 159/19 Ora, o princípio da igualdade não funciona apenas na vertente formal e redutora da igualdade perante a lei; implica, do mesmo passo, a aplicação igual de direito igual (cfr. Gomes Canotilho, Constituição Dirigente e Vincu- lação do Legislador, Coimbra, 1982, p. 381; Alves Correia, ob. cit., p. 402) o que pressupõe averiguação e valoração casuísticas da “diferença” de modo a que recebam tratamento semelhante os que se encontrem em situações seme- lhantes e diferenciado os que se achem em situações legitimadoras da diferenciação. Sublinhe-se ainda que, como se afirmou no Acórdão n.º 370/07, o qual seguiu, no mesmo sentido, os Acórdãos n. os 157/88 e 187/90, «a vinculação jurídico-material do legislador ao princípio da igualdade não elimina a liberdade de conformação legislativa, pertencendo-lhe, dentro dos limites constitucionais, definir ou qualificar as situações de facto ou as relações da vida que hão de funcionar como elementos de referência a tratar igual ou desigualmente». Continua o mesmo aresto, afirmando que «aos tribunais, na apreciação daquele princípio, não compete verdadeiramente «substituírem-se» ao legislador, ponderando a situação como se estivessem no lugar dele e impondo a sua própria ideia do que seria, no caso, a solução “razoável”, “justa” e “oportuna” (do que seria a solução ideal do caso); compete-lhes, sim “afastar aquelas soluções legais de todo o ponto insuscetíveis de se credenciarem racionalmente” (Acórdão da Comissão Constitucional, n.º 458, in Apêndice ao Diário da República , de 23 de agosto de 1983, p. 120)». Em conclusão, ainda nas palavras do acórdão que se vem de citar, «pode dizer-se que a caracterização de uma medida legislativa como inconstitucional, por ofensiva do princípio da igualdade, dependerá, em última análise, da ausência de fundamento material suficiente, isto é, de falta de razoabilidade e consonância com o sistema jurídico». Tendo presente a densificação da jurisprudência constitucional a respeito do conteúdo do princípio da igualdade, cabe averiguar se a solução normativa em análise contende com tal princípio, como pretende a recorrente. Pese embora a alegação da recorrente não se apresente com a necessária clareza no que respeita aos termos da comparação que procura estabelecer, é possível retirar do seu discurso argumentativo algumas hipóteses que cabe ponderar. A primeira hipótese parte, justamente, da alegação de que o núcleo nevrálgico da questão de consti- tucionalidade corresponde à alteração legislativa de 2013 que, concomitantemente, reintroduziu o recurso para o Supremo Tribunal de Justiça com vista à uniformização de jurisprudência dos acórdãos das Relações e procedeu à reconfiguração dos requisitos de acesso a esse Supremo Tribunal, nos termos gerais, ou seja, tomou por referência, para efeitos de admissão do recurso, a decisão da Relação e não a de 1.ª instância. Com tal fundamento a recorrente pretende estabelecer um paralelo comparativo entre os sujeitos processuais que, nos termos do CPC atual, pretendem aceder ao Supremo Tribunal de Justiça para uniformizar jurisprudência contraditória dos tribunais da Relação e os que o fizeram ao abrigo do CPC de 2007, quando a admissibi- lidade do recurso de revista, nos termos gerais, dependia da prolação de um acórdão da Relação que se pro- nunciasse sobre a decisão do tribunal de 1.ª instância que pusesse termo ao processo ou que, sem pôr termo ao processo, decidisse o mérito da causa, por despacho saneador (artigo 721.º, n.º 1, do CPC de 2007). Ora, sendo certo que, como desde há muito tem reiteradamente afirmado a jurisprudência deste Tribu- nal, o «princípio da igualdade não opera diacronicamente» (Acórdãos n. os 309/93 e 43/88), «ou, pelo menos, não opera diacronicamente de forma a impedir a sucessão de leis no tempo» (Acórdãos n. os 546/09, 222/08, 99/04, 467/03), cumpre, ainda assim, sublinhar que a argumentação da recorrente sofre de um evidente erro de raciocínio que decorre, desde logo, do facto de os termos da comparação da situação jurídica da recor- rente em relação a outros recorrentes tomar por referência a redação do recurso de revista constante do artigo 721.º, n.º 1, do CPC que vigorou depois da reforma de 2007, olvidando que, no período de vigência desse diploma já não vigorava o recurso previsto no artigo 678.º, n.º 4, antecessor do atual artigo 629.º, n.º 2, alínea d) . Ora, não existindo no CPC de 2007 um recurso como o atualmente consagrado na alínea d) do n.º 2 do artigo 629.º do CPC, e anteriormente no n.º 4 do artigo 678.º do CPC de 1995, cuja admissibi- lidade, de acordo com a interpretação adotada pelo tribunal a quo, depende da verificação dos pressupostos
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