TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 104.º volume \ 2019
554 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL E, assim sendo, afigura-se que o critério normativo elegido como objeto do recurso, reservando o acesso ao Supremo Tribunal de Justiça, no âmbito do recurso previsto no artigo 629.º, n.º 2, alínea d) , do CPC, apenas às causas nas quais haja sido proferida uma decisão final, não contende com o princípio da propor- cionalidade. 11. Defende ainda a recorrente que o critério normativo em apreciação acarreta a violação do princípio da igualdade, sendo, pertinente, para tal sindicância, retomar a síntese relativa à jurisprudência deste Tribu- nal quanto a tal princípio, exarada no Acórdão n.º 96/05: “O princípio da igualdade do cidadão perante a lei é acolhido pelo artigo 13.º da Constituição da República que, no seu n.º 1, dispõe, genericamente, terem todos os cidadãos a mesma dignidade social, sendo iguais perante a lei, especificando o n.º 2, por sua vez, que “ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica ou condição social”. Princípio estruturante do Estado de direito democrático e do sistema constitucional global (cfr., neste sentido, Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada , 3.ª edição, Coimbra, 1993, pág. 125) o princípio da igualdade vincula diretamente os poderes públicos, tenham eles competência legislativa, administrativa ou jurisdicional (cfr. ob. cit., pág. 129) o que resulta, por um lado, da sua consagração como direito fundamental dos cidadãos e, por outro lado, da “atribuição aos preceitos constitucionais respeitantes aos direitos, liberdades e garantias de uma força jurídica própria, traduzida na sua aplicabilidade direta, sem necessidade de qualquer lei regulamentadora, e da sua vinculatividade imediata para todas as entidades públicas, tenham elas com- petência legislativa, administrativa ou jurisdicional (artigo 18.º, n.º 1, da Constituição)”(cfr. Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 186/90, publicado no Diário da República , II Série, de 12 de setembro de 1990). Muito trabalhado, jurisprudencial e doutrinariamente, o princípio postula que se dê tratamento igual a situa- ções de facto essencialmente iguais e tratamento desigual para as situações de facto desiguais (proibindo, inversa- mente, o tratamento desigual de situações iguais e o tratamento igual das situações desiguais) – cfr., entre tantos outros, e além do já citado Acórdão n.º 186/90, os Acórdãos n. os 39/88, 187/90, 188/90, 330/93, 381/93, 516/93 e 335/94, publicados no referido jornal oficial , I Série, de 3 de março de 1988, e II Série, de 12 de setembro de 1990, 30 de julho de 1993, 6 de outubro do mesmo ano, e 19 de janeiro e 30 de agosto de 1994, respetivamente. “O princípio da igualdade não impede que, tendo em conta a liberdade de conformação do legislador, se possam (se devam) estabelecer diferenciações de tratamento, “razoável, racional e objetivamente fundadas”, sob pena de, assim não sucedendo, “estar o legislador a incorrer em arbítrio, por preterição do acatamento de soluções objetivamente justificadas por valores constitucionalmente relevantes”,(…). Ponto é que haja funda- mento material suficiente que neutralize o arbítrio e afaste a discriminação infundada (o que importa é que não se discrimine para discriminar, diz-nos J. C. Vieira de Andrade – Os Direitos Fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976, Coimbra, 1987, pág. 299).” Perfila-se, deste modo, o princípio da igualdade como “princípio negativo de controlo” ao limite externo de conformação da iniciativa do legislador – cfr. Gomes Canotilho e Vital Moreira, ob. cit. , p. 127 e, por exemplo, os Acórdãos n. os 157/88, publicado no Diário da República , I Série, de 26 de julho de 1988, e os já citados n. os 330/93 e 335/94 – sem que lhe retire, no entanto, a plasticidade necessária para, em confronto com dois (ou mais) grupos de destinatários da norma, avalizar diferenças justificativas de tratamento jurídico diverso, na comparação das con- cretas situações fácticas e jurídicas postadas face a um determinado referencial ( tertium comparationis ). A diferença pode, na verdade, justificar o tratamento desigual, eliminado o arbítrio (cfr., a este propósito, Gomes Canotilho, in – Revista de Legislação e de Jurisprudência, ano 124, p. 327; Alves Correia, O Plano Urbanístico e o Princípio da Igualdade, Coimbra, 1989, p. 425; Acórdão n.º 330/93).
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