TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 104.º volume \ 2019

549 acórdão n.º 159/19 8. Atentas as considerações expendidas, a limitação da admissibilidade do recurso para o SupremoTribunal de Justiça pressuposta pelo critério normativo em análise deve ser entendida à luz da ratio do recurso previsto no artigo 629.º, n.º 2, alínea d) , do CPC – que visa garantir que não fiquem sem possibilidade de resolução con- flitos de jurisprudência verificados entre acórdãos das Relações em processos que, pela especialidade da matéria, não têm possibilidade de alcançar o Supremo Tribunal de Justiça, por nunca ser admissível o recurso de revista por motivo estranho à alçada – conjugada com o objetivo de racionalização do acesso ao Supremo Tribunal de Justiça, que se pretende reservado para a sua qualificada função de estabilização da interpretação e aplicação da lei, em ordem a garantir a unidade do direito, desiderato este que «merece tutela sob pena de os valores da segurança jurídica e da igualdade sofrerem intolerável erosão no momento da aplicação da lei pelos tribunais» (vide o Acórdão n.º 383/09, disponível em www.tribunalconstitucional.pt , bem como os demais arestos deste Tribunal doravante citados). Ora, tal limitação, sublinhe-se, assenta na ponderação dos requisitos de admissibilidade que estreita o acesso ao triplo grau de jurisdição dirigido à uniformização de jurisprudência dos tribunais da Relação, com base num critério de reserva de jurisdição para as questões que tenham natureza final, ou seja, que conheça do mérito da causa ou que ponha termo ao processo, absolvendo da instância o réu ou algum dos réus quanto a pedido ou reconvenção deduzidos, com vista a alcançar um descongestionamento do Supremo Tribunal de Justiça, com sacrifício da reapreciação da justiça material relativa a matérias que não tenham obtido ainda uma decisão final.  Antes de iniciarmos, porém, a análise a empreender quanto à conformidade constitucional da norma objeto do recurso, cabe recordar que este Tribunal adotou um conceito funcional de norma mediante o qual o objeto do recurso de fiscalização concreta da constitucionalidade tanto se pode reportar à norma que resulta do teor literal plasmado num preceito de direito positivo como ainda ao sentido interpretativo, assente num preceito ou conjugação de preceitos legais, adotado pelo tribunal a quo, isto é, ao modo como foi perspetivado e aplicado na decisão recorrida. Contudo, a adoção desta visão do objeto do recurso não legitima que a competência deste Tribunal se expanda à aferição da bondade da interpretação adotada pelo tribunal a quo. Na verdade, o critério normativo que funda o juízo decisório a quo apresenta-se, no âmbito do recurso de constitucionalidade, como um dado da questão, não tendo este tribunal credencial, legal ou constitucional, para proceder ao escrutínio do mérito da interpretação normativa alcançada pelo tribunal a quo, na medida que apenas pode sindicar a constitucionalidade de normas ou interpretações normativas e não de decisões jurisdicionais. No caso, perscrutadas as alegações produzidas neste Tribunal, ressalta uma sub-reptícia intenção de se colocar à apreciação deste Tribunal a interpretação do direito infraconstitucional levada a cabo pelo Supremo Tribunal de Justiça. Com efeito, a argumentação desenvolvida pela recorrente é, em certa medida, votada a demonstrar o desacerto do sentido atribuído pelo acórdão recorrido aos artigos 629.º, n.º 2, alínea d) , e 671.º, n.º 1, ambos do CPC, e, paralelamente, a justeza da interpretação que entende mais correta, traduzida no sentido de que a admissibilidade do recurso para uniformização de jurisprudência das Relações se basta com o cumprimento dos pressupostos constantes daquele primeiro preceito legal, sendo justamente para ultrapassar a irrecorribilidade nos termos da revista normal, determinada pelo artigo 854.º do CPC, que o legislador consagrou tal recurso. Ora, não cabendo ao Tribunal Constitucional tomar posição sobre qual o sentido interpretativo mais correto de determinado preceito legal ou da conjugação de preceitos legais, apenas cumpre sindicar, no âmbito deste recurso, se o critério normativo adotado pela decisão recorrida implica a violação das normas constitucionais invocadas pela recorrente ou qualquer outro parâmetro de constitucionalidade. 9. Na argumentação exposta nas alegações apresentadas neste Tribunal, a recorrente centra o núcleo essencial da questão de constitucionalidade delimitada como objeto do recurso vertente na dupla alteração operada pela Lei n.º 41/2013, de 26 de junho, isto é, por um lado, a reintrodução do recurso para uniformi- zação de jurisprudência constante da alínea d) do n.º 1 do artigo 629.º do CPC, e, por outro lado, a revisão

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