TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 104.º volume \ 2019

53 acórdão n.º 134/19 maio de 1992), a Caixa Geral de Aposentações proferiu despacho, datado de 26 de outubro de 1992, a fixar defi- nitivamente a pensão de aposentação (despacho impugnado nos presentes autos). Por força da norma contida no artigo 43.º, n.º 1, alínea a) , do Decreto-Lei n.º 498/72, de 9 de dezembro, a entidade recorrida, na fixação do valor da pensão, fez aplicação do disposto no artigo 10.º, n.º 1, da Lei n.º 2/92, de 9 de março, fixando a pensão de aposentação no valor de 355 689$00. Ora, a recorrente, no presente recurso de constitucionalidade, impugna precisamente este bloco normativo, uma vez que, alegadamente, de acordo com o regime vigente no momento em que requereu a pensão (artigo 53.º do Estatuto de Aposentação), a mesma deveria ter o valor de 460 000$00. 7. A recorrente sustenta, por um lado, que as normas impugnadas violam os princípios da confiança e da boa- -fé, ínsitos no princípio do Estado de direito democrático, consagrado no artigo 2.º da Constituição. OTribunal Constitucional, no Acórdão n.º 303/90 ( Diário da República , I Série, de 26 de dezembro de 1990), afirmou que no princípio do Estado de direito democrático “está, entre o mais, postulada uma ideia de proteção da confiança dos cidadãos e da comunidade na ordem jurídica e na atuação do Estado, o que implica um mínimo de certeza e de segurança no direito das pessoas e nas expectativas que a elas são juridicamente criadas”. Por outro lado, no Acórdão n.º 237/98 ( Diário da República , II Série, de 17 de junho de 1998), o Tribunal considerou que “uma norma jurídica apenas violará o princípio da proteção da confiança do cidadão, ínsito no princípio do Estado de direito, se ela postergar de forma intolerável, arbitrária, opressiva ou demasiado acen- tuada aquelas exigências de confiança, certeza e segurança que são dimensões essenciais do princípio do Estado de direito”. Nesse aresto, afirmou‑se ainda que o “princípio do Estado de direito democrático (...) é um princípio cujos contornos são fluidos (...), pelo que tem um conteúdo relativamente indeterminado”. Em consequência, concluiu- -se que tais características “sempre inspirarão prudência ao intérprete e convidá‑lo‑ão a não multiplicar, com apoio nesse princípio, as ilações de inconstitucionalidade”. Resulta da jurisprudência citada que o Tribunal Constitucional tem entendido que a tutela constitucional da confiança não abrange todo e qualquer juízo de previsibilidade que o sujeito possa fazer em face de determinado quadro normativo vigente. Com efeito, apenas colidirá com a tutela da confiança a afetação infundada e arbitrária de expectativas legítimas objetivamente consolidadas. Nos presentes autos, a recorrente requereu uma pensão de aposentação num momento em que vigorava um regime que levaria à fixação do respetivo valor num determinado montante (460 000$00). Contudo, nesse momento, vigorava também a norma que estabelecia que o regime aplicável à fixação da pensão de aposentação seria o regime vigente no momento em que o despacho de reconhecimento do direito à pensão de aposentação voluntária viesse a ser proferido [artigo 43.º, n.º 1, alínea a) , do Estatuto de Aposentação]. Nessa medida, a recorrente sabia, quando requereu a pensão, que o respetivo montante seria fixado de acordo com a lei vigente no momento da prolação desse despacho. A pensão foi definitivamente fixada no valor de 363 528$00, nos termos do artigo 10.º, n.º 1, da Lei n.º 2/92, de 9 de março. O regime legal aplicado determinou, portanto, uma redução do valor da pensão em relação ao valor que resultaria da aplicação do regime vigente no momento em que a pensão foi requerida. No entanto, na data em que apresentou o requerimento (altura em que a situação jurídica da requerente como pensionista não se encontrava ainda definida), a recorrente tinha apenas a expectativa de lhe vir a ser atribuída uma pensão (caso se verificassem os respetivos pressupostos) nos termos da lei vigente no momento da prolação do despacho que viesse a reconhecer o direito à pensão, tendo, naturalmente, o legislador a possibilidade de, no âmbito da liberdade de conformação legislativa, vir a estabelecer novos critérios de fixação da pensão aplicáveis, desse modo, no momento da fixação definitiva. Uma vez que era já configurável a possibilidade de a sua situação vir a ser definida de acordo com o regime introduzido por uma eventual alteração legislativa, a recorrente não tinha uma expectativa consolidada de ver a sua pensão fixada de acordo com a lei vigente no momento em que apresentou o respetivo requerimento. Com efeito, em face do quadro legal vigente, a requerente apenas podia, como se referiu, representar que lhe seria, em princípio, concedida uma pensão de aposentação, de acordo com o regime vigente na data do despacho de reconhecimento do direito à pensão.

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