TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 104.º volume \ 2019

519 acórdão n.º 141/19 Assim, como se assinalou no Acórdão n.º 236/07, 2.ª Secção, ponto 2.2., «(…) a jurisprudência mais relevante do Tribunal Constitucional sobre os fundamentos constitucionais do princípio da proibição da reformatio in pejus » revela que estes «não se cingem à consideração do direito de recurso, mas se baseiam, mais amplamente, na plenitude das garantias de defesa que o processo criminal deve assegurar». 11. Já no plano infraconstitucional, a proibição da reformatio in pejus encontra consagração quer no Direito Processual Penal, quer no Direito de Mera Ordenação Social. No âmbito do processo penal, a proibição da reformatio in pejus encontra-se prevista no artigo 409.º do Código de Processo Penal, entendendo-se que esta é uma medida protetora do direito de recurso em favor do arguido, visando evitar que neste tipo de impugnação o arguido possa ser punido com sanções mais graves, o que, a acontecer condicionaria de modo intolerável o exercício do direito ao recurso. No que respeita ao domínio do ilícito de mera ordenação social, o Regime Geral das Contraordenações, instituído pelo Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de outubro, não continha na sua redação inicial norma seme- lhante. Só com as alterações introduzidas ao aludido regime pelo Decreto-Lei n.º 244/95, de 14 de setembro, foi aditado o artigo 72.º-A que, sob a epígrafe «Proibição da reformatio in pejus », que dispõe, no n.º 1 que «[i]mpugnada a decisão da autoridade administrativa ou interposto recurso da decisão judicial somente pelo arguido, ou no seu exclusivo interesse, não pode a sanção aplicada ser modificada em prejuízo de qualquer dos arguidos, ainda que não recorrentes», acrescentando o n.º 2 que tal «não prejudica a possibilidade de agravamento do montante da coima, se a situação económica e financeira do arguido tiver entretanto melho- rado de forma sensível». 12. Referindo-se à proibição de reformatio in pejus consagrada no Regime Geral das Contraordenações, Paulo Pinto de Albuquerque considera que esta «é “inconveniente”, “injustificável” e tem “efeitos perversos”, tais como aumenta o número de recursos independentemente da gravidade das sanções e torna os recursos economicamente compensadores sempre que estejam em causa sanções muito elevadas, por via do diferi- mento no tempo do respetivo pagamento. […] Pior ainda: a regra da proibição da reformatio in pejus contra- ria a própria natureza “provisória” da decisão administrativa e, portanto, também, a natureza da impugnação judicial, que consubstancia uma verdadeira “transferência da questão do domínio da administração para o juiz”» (cfr., Comentário do Regime Geral das Contraordenações à luz da Constituição da República e da Conven- ção europeia dos Direitos do Homem, Lisboa: Universidade Católica Editora, 2011, pp. 294-295, onde o autor faz ainda uma síntese das diversas críticas apontadas pela doutrina a este regime, com referência a outros autores com idênticas posições). Também Alexandra Vilela (cfr., O Direito de Mera Ordenação Social: entre a Ideia de “Recorrência” e a de “Erosão” do Direito Penal Clássico, Coimbra: Coimbra Editora, 2013, p. 485) defende que não se justifica a proibição de reformatio in pejus no âmbito do Direito de Mera Ordenação Social, pelo menos nos casos em que a impugnação judicial seja decidida em audiência, referindo, a este respeito o seguinte: «[…] o princípio da proibição da reformatio in pejus não faz sentido quando o tribunal decide o recurso em audiência, pois, nesse momento, os autos já foram “examinados à lupa”, primeiro pela administração, segundo pelo MP e, em último lugar, pelo juiz. Assim sendo, se, apesar de tudo, prosseguiu sem que o MP e o arguido fizessem uso dos seus poderes de, respetivamente, retirar a acusação […] e de retirada do recurso […], de duas uma: ou o arguido acredita no bem fundado da sua pretensão, coisa que nenhuma das três entidades que analisou os autos conseguiu enxergar, ou então aquele encontra-se disposto a arriscar tudo, pois no fundo nada perde. Dentro deste cenário, cremos que não se justifica que o arguido, que ainda assim, pretenda ver a sua impugna- ção judicial decidida em audiência de julgamento, se encontre respaldado pelo princípio da proibição de reformatio in pejus ».

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