TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 104.º volume \ 2019
499 acórdão n.º 130/19 jurisdição, aos magistrados do Ministério Público e aos demais trabalhadores do Estado (Gomes Canotilho/Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, 3.ª edição, citada, p. 821). (…) A razão de ser do preceito radica antes na necessidade de dar cobertura à garantia de independência dos juízes, em função da sua qualidade de titular de órgão de soberania encarregado de exercer a função jurisdicional. O estatuto subjetivo dos magistrados está, pois, indissociavelmente ligado à reserva de jurisdição e constitui um princípio constitucional material concretizador do Estado de direito, na medida em que se destina a garantir a independência e imparcialidade dos juízes no exercício da função jurisdicional (sobre este aspeto, Gomes Canoti- lho, Direito Constitucional e Teoria da Constituição, citado, pp. 667-668; Paulo Rangel, Reserva de jurisdição , citada, p. 48). A unicidade de estatuto, tal como está constitucionalmente consagrada, pressupõe duas características essen- ciais: (a) um estatuto unificado, constituído por um complexo de normas que são apenas aplicáveis aos juízes dos tribunais judiciais; (b) um estatuto específico, no sentido de que são as suas disposições, ainda que de natureza remissiva, que determinam e conformam o respetivo regime jurídico-funcional». 12. Como já referimos, o artigo 215.º da Constituição estabelece que «os juízes dos tribunais judiciais formam um corpo único e regem-se por um só estatuto». A propósito deste estatuto, o artigo 164.º estabelece uma reserva absoluta de competência legislativa da Assembleia da República, ao dispor, na sua alínea m) , que é da exclusiva competência da Assembleia da República legislar sobre «o estatuto dos titulares de órgãos de soberania e do poder local, bem como dos restantes órgãos constitucionais ou eleitos por sufrágio direto e universal». Sendo os tribunais órgãos de soberania, nos termos do artigo 110.º, n.º 1, da CRP, conclui-se, da conjugação dos dois referidos preceitos constitucionais, estarmos num domínio absolutamente reservado, em que apenas a Assembleia da República pode legislar. É certo que, nos termos da alínea p) do n.º 1 do artigo 165.º da CRP, se inclui na reserva relativa de competência legislativa da Assembleia da República «a organização e competência dos tribunais e do Ministério Público e estatuto dos respetivos magistrados, bem como das entidades não jurisdicionais de composição de conflitos», o que poderia suscitar dúvidas sobre se esta referência ao estatuto dos respetivos magistrados abrange os juízes. No entanto, as aludidas dúvidas foram dissipadas pelo Plenário do Tribunal Constitucional que, por unanimidade, decidiu, no Acórdão n.º 472/95, que se extrai de várias normas da Constituição «um conceito constitucionalmente adequado do estatuto dos juízes enquanto titulares de órgãos de soberania, e que pela própria relevância sistemática derivada do atrás referido enquadramento constitucional, é matéria que tem necessariamente de se considerar integrada na reserva absoluta da competência da Assembleia». No mesmo sentido, vide Gomes Canotilho e Vital Moreira ( Constituição da República Portuguesa Anotada, Vol. II, 4.ª edição revista, pp. 314 e 315). Para os referidos autores, esta conclusão parece impor-se com base na consideração de que «não seria lógico excluir os juízes, quando esta mesma norma inclui na reserva parlamentar absoluta o estatuto dos membros dos órgãos de poder local, bem como os titulares “dos restantes órgãos constitucionais” (…) e ainda os titulares dos demais órgãos “eleitos por sufrágio direto e universal”». É de considerar assente, assim, que se integra na reserva absoluta de competência legislativa da Assem- bleia da República a definição do estatuto específico dos magistrados judiciais. Como se lê no Acórdão n.º 620/07, o n.º 1 do artigo 215.º da CRP determina que os juízes dos tribu- nais judiciais «formam um corpo único e regem-se por um só estatuto», do que decorre: a) Que a mesma categoria de juízes possui uma especificidade estatutária própria em face dos restantes juízes, bem como em relação ao Ministério Público e aos funcionários públicos em geral; b) Que sendo os tribunais judiciais órgãos de soberania (n.º 1 do artigo 110.º da CRP) e os juízes titula- res dos mesmos órgãos (n.º 1 do artigo 215.º da CRP), impõe-se que o conteúdo nuclear e funcional
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