TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 104.º volume \ 2019
480 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL dos ónus e cominações e o regime de citação em processo civil, in Estudos em Homenagem ao Conselheiro José Manuel Cardoso da Costa , Coimbra Editora, 2004, pp. 855-856. Um dos regimes de citação por via postal simples que o referido autor especificamente criticou, por violação dos referidos princípios constitucionais, foi precisamente o instituído no referido artigo 238.º do CPC para os casos de frustração da citação por via postal registada. No seu entendimento, o Decreto-Lei n.º 183/2000 criou através desse regime um «verdadeiro domicílio judicial necessário», qualquer que seja «a natureza e o valor da relação material controvertida», assente nos «elementos que constem, em alternativa, das quatro bases de dados a que alude o artigo 238.º, n.º 1». De acordo com o mesmo autor, «[n]ão se exig- indo uma precisa e exaustiva identificação do réu, através da indicação de todos os elementos que relevam para a sua identificação (…), fica obviamente comprometida a praticabilidade e a fiabilidade da consulta ‘ofi- ciosa’ às bases de dados referenciadas no n.º 1 do artigo 238.º (imaginando-se facilmente o resultado prático de se questionarem 4 bases de dados acerca da residência dos réus ‘António Silva’ ou ‘José Santos’…); na verdade, tal consulta arrisca-se a introduzir no processo um ‘rol’ de todas as residências que correspondem a determinado ‘nome’, ignorando-se obviamente se se estará perante o mesmo réu com diversas residências ou perante cidadãos diferentes com o mesmo nome e, naturalmente, domicílios diferenciados» – op. cit. , p. 855. Apesar da sensibilidade constitucional da matéria, o Tribunal Constitucional só foi chamado a contro- lar a constitucionalidade das soluções inovatórias introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 183/2000 no Código de Processo Civil decorridos alguns anos da sua entrada em vigor. Fê-lo nos Acórdãos n. os 287/03, 91/04, 243/05, 104/06, 582/06, 632/06 e 376/10, que apreciaram, em termos aparentemente não coincidentes, a inconstitucionalidade do citado artigo 238.º do CPC (e da norma conexa do artigo 238.º-A) – que previa, como vimos, um regime substancialmente idêntico àquele que veio a ser restritivamente adotado para o pro- cedimento de injunção no ora questionado artigo 12.º do Anexo ao Decreto-Lei n.º 269/98 –, e no Acórdão n.º 182/06, que apreciou a inconstitucionalidade da norma constante do artigo 236.º-A, n.º 1, do CPC, nessa mesma redação. A diversidade de juízos formulados pelo Tribunal Constitucional, naquele primeiro conjunto de acórdãos, acerca do artigo 238.º do CPC, põe em evidência, não apenas a diversidade de hipóteses que este preceito legal sujeitou à mesma regra (subsidiária) de citação por via postal simples, mas também a sensibi- lidade própria do sistema de fiscalização concreta da constitucionalidade à diferença inarredável dos casos judiciais solucionáveis (e solucionados) por aplicação das normas sujeitas a esse tipo de controlo. Para o que agora interessa, o artigo 238.º do CPC autonomizava, tal como o artigo 12.º do Anexo do Decreto-Lei n.º 269/98 faz atualmente, duas hipóteses distintas a que aplicava, não obstante, idêntico regime jurídico-processual: os casos em que, feita a averiguação nas bases de dados oficiais aí especificadas, se verificava haver coincidência entre a residência para onde foi remetida a carta registada com aviso de receção e o local obtido em todas essas bases; e a situação diversa de as bases de dados indicarem várias residências diferentes ou residência diferente daquela para onde se remeteu a carta registada. Como se referiu, a solução adotada pelo legislador para ambas as hipóteses era essencialmente idêntica, a da citação por via postal simples, que se considerava feita no dia em que o distribuidor do serviço postal depositava a carta na caixa postal do endereço ou endereços indicados nas bases de dados de todos os serviços públicos (serviços de iden- tificação civil, da segurança social, da Direção-Geral dos Impostos e da Direção-Geral de Viação) e tinha-se por efetuada na pessoa do citando. Embora sem convocação expressa dessa diferença nem argumentação explícita justificativa do seu relevo jurídico-constitucional, verifica-se que esse dado não se revelou indiferente ao Tribunal Constitucional em alguns dos referidos Acórdãos. O Acórdão n.º 287/03, que contém a primeira pronúncia do Tribunal Constitucional sobre o regime inovatório estabelecido pelo Decreto-Lei n.º 183/2000, julgou inconstitucional, por violação dos princípios da proibição de indefesa e do processo equitativo, consagrados no artigo 20.º da Constituição, a norma do artigo 238.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, na redação introduzida por aquele diploma legal, «inter- pretada no sentido de, em ação declarativa que se segue ao procedimento de injunção em que se frustrou a
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