TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 104.º volume \ 2019

479 acórdão n.º 108/19 Pretendia-se com essas importantes alterações «enquadrar o regime de citação na sociedade atual, ade- quando-o aos problemas de morosidade processual que o sistema judiciário enfrenta» (cfr. preâmbulo do Decreto-Lei n.º 183/2000). A esse propósito, afirmava-se preambularmente nesse diploma legal o seguinte: «É unânime que uma das fases mais demoradas no processo civil é a da citação, não sendo raro esperar-se meses ou mais de um ano até à sua realização. Tal acontece porque a frustração da primeira modalidade de citação, que em regra é a citação por via postal registada, tem de ser seguida da citação por contacto pessoal do funcionário judicial com o citando, sistema concebido quando ainda não existia uma grande pendência processual e os meios urbanos apresentavam uma densidade populacional que permitia ao funcionário, em tempo razoável, efectuar a citação através de contacto direto com o citando ou colocar um aviso para citação com hora certa. Essa não é a realidade que hoje enfrentamos, pois a pendência processual é enorme e o funcionário judicial tem muita dificuldade em gerir o seu tempo de molde a proceder às citações necessárias em todos os processos, ao que acresce a probabilidade do citando não se encontrar na sua residência durante o dia, porque está no seu local de trabalho, tornando quase sempre necessária a citação com hora certa, ou seja, a deslocação do funcionário judicial à residência do citando pela segunda vez, para depois se deslocar pela terceira vez, desta feita ao seu domicílio profissional, caso o autor o indique». Os resultados registados ao nível do descongestionamento dos tribunais, após a aprovação do Decreto- Lei n.º 269/98, com os ajustamentos introduzidos pelo Decreto-Lei n.º 383/99 e pelo Decreto-Lei n.º 183/2000, foram assinalados pelo legislador como um êxito, o que justificou nova ampliação do âmbito de aplicação do procedimento de injunção, em dois momentos sucessivos: com a entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 32/2003, de 17 de fevereiro, passou a reconhecer-se também aos credores de obrigações pecuniárias emergentes de transações comerciais a possibilidade de recorrer ao procedimento de injunção, sem limite de valor; posteriormente, o Decreto-Lei n.º 107/2005, de 1 de julho, elevou mais uma vez o valor dos procedimentos especiais previstos no Decreto-Lei n.º 269/98, designadamente o de injunção, para a alçada dos tribunais da relação, então fixada em € 14 963,94. Porém, o primeiro dos enunciados diplomas legais não se limitou a ampliar o âmbito de aplicação do procedimento de injunção. Embora conste do respetivo preâmbulo uma referência incidental ao facto de se terem introduzido «alterações não substanciais» ao regime de notificação no procedimento de injunção com o objetivo de o «tornar mais claro», a verdade é que o Decreto-Lei n.º 32/2003 exportou para o regime da injunção a solução – entretanto revogada pelo Decreto-Lei n.º 38/2003, de 8 de março – que o Decreto-Lei n.º 183/2000 havia introduzido no referido artigo 238.º do CPC de 1961, determinando para a notificação do requeridos em procedimento de injunção, tal como no passado esse preceito legal havia determinado para a citação na generalidade das ações civis, que, frustrando-se a notificação por via postal registada, a notifica- ção do requerido se fizesse por via postal simples para morada ou moradas que viessem a ser localizadas pela secretaria após consulta nas bases de dados públicas acima referidas, consoante houvesse ou não coincidência entre a residência indicada pelo requerente e o local obtido pela secretaria nesses registos públicos (artigo 12.º, n. os 3, 4 e 5, do Anexo ao Decreto-Lei n.º 269/98). 2.3. Como se sublinha no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 182/06, a inovação introduzida pelo Decreto-Lei n.º 183/2000 suscitou polémica, quer entre os profissionais forenses, quer na doutrina, por causa da «alegada insegurança, não só do conhecimento, mas da própria cognoscibilidade do ato de citação por parte do destinatário». Por exemplo, para Lopes do Rego «o amplíssimo regime [então] instituído pelo legislador para a citação por via postal simples [podia] implicar – ao menos em determinadas situações proces- suais – desproporcionada e injustificada restrição ao direito de defesa, colidindo com os princípios da igual- dade e do contraditório (que a jurisprudência constitucional sempre considerou ínsitos no direito de acesso aos tribunais) e com a garantia do ‘processo equitativo’ proclamada pela versão atual do artigo 20.º da Con- stituição» (itálico original) – «Os princípios constitucionais da proibição de indefesa, da proporcionalidade

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