TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 104.º volume \ 2019
457 acórdão n.º 105/19 Para além de o próprio legislador, aquando da aprovação do CIMI (cfr. Decreto-Lei n.º 287/2003, de 12 de novembro), ter optado por manter no Preâmbulo do Código a referência ao «princípio do benefício», a que já aludia o Código da Contribuição Autárquica, como princípio-base do imposto (vide, a este respeito, o Acórdão n.º 57/95), a «característica particular de comutatividade» deste tributo levou Saldanha Sanches, por exemplo, a classificá-lo como uma contribuição especial e a defender que apenas o princípio do benefí- cio pode «justifica[r] que a quantificação da prestação dependa não do rendimento que o prédio rústico ou urbano pode proporcionar, mas, sim, do seu valor patrimonial» ( Manual de Direito Fiscal, 3.ª edição, Coim- bra Editora, Coimbra, 2007, pp. 53-54). Apesar da legitimação do IMI à luz do princípio do benefício se ter tornado alvo de acesa contestação na doutrina – de acordo com a ideia segundo a qual a capacidade contributiva revelada pela titularidade de direitos reais sobre os imóveis não poderia deixar de constituir o pressuposto necessário da exigência do imposto (assim, por exemplo, José Casalta Nabais, “As Bases Constitucionais da Reforma da Tributação do Património”, in Fisco n.º 111/112, janeiro de 2004, [pp. 3-22], pp.18-19 e Sá Gomes, Nuno, Tributação do Património, Almedina, Coimbra, 2005, pp. 109-110) –, o seu resoluto afastamento não obstou a que, ainda na expressão de Casalta Nabais, se reconhecesse a «especial configuração» da capacidade contributiva visada pelo IMI: para além de «a capacidade contributiva, em tais casos, não [ser] uma variável que se reconduza, como é a situação que podemos considerar corrente, integralmente ou mesmo predominantemente à ativi- dade dos contribuintes» (Casalta Nabais, ibidem , p. 19), destaca-se o facto de, através do IMI, se tributarem «os beneficiários da utilidade económica resultante da existência dos respetivos prédios, como recursos gera- dores de riqueza», assim se explicando o afastamento dos proprietários do âmbito «da incidência subjetiva do imposto» no caso dos prédios onerados com o direito de usufruto ou de superfície»; em qualquer uma destas hipóteses, «o direito de propriedade é […] vazio de conteúdo útil, dado que a utilidade que resulta da existência do respetivo prédio não é usufruída pelo proprietário, mas pelos titulares daqueles direitos» (cfr. José Maria Fernandes Pires, O Adicional ao IMI e a Tributação Pessoal do Património, Almedina, Coimbra, 2017, p. 51). Ora, a capacidade contributiva visada pelas verbas 28 e 28.1 da TGIS inscreve-se igualmente nesta lógica e assume também esta «especial configuração»: aí, onde exista um prédio com o valor patrimonial tributário de um milhão de euros, surgirá o dever de suportar o imposto, uma vez presumida a especial uti- lidade económica que a mera existência deste proporciona a quem o possua a algum dos títulos previstos na norma de incidência – proprietário, usufrutuário ou superficiário, ou, na falta de inscrição matricial, quem tenha a posse do prédio em 31 de dezembro do ano a que respeita o imposto. 9. O Tribunal Constitucional confrontou já diversas dimensões normativas extraídas das verbas 28 e 28.1 da TGIS com os princípios constitucionais da igualdade, da capacidade contributiva e da proporciona- lidade, tendo concluído, na generalidade dos casos, pela ausência de fundamento para um juízo de incons- titucionalidade (salvo no caso apreciado no Acórdão n.º 250/17, cujo juízo foi revertido, em Plenário, pelo Acórdão n.º 378/18). Não julgou, designadamente, inconstitucionais as verbas 28 e 28.1 da TGIS: (i) na medida em que impõem a tributação anual sobre a propriedade de prédios urbanos com afetação habitacional, cujo valor patrimonial seja igual ou superior a um milhão de euros (Acórdãos n. os 590/15, 83/16 e 247/16); (ii) no sentido de que nela se incluem os prédios urbanos habitacionais em propriedade total compostos por partes suscetíveis de utilização independente e consideradas separadamente na inscrição matricial (Acórdãos n. os 620/15 e 692/15); (iii) na medida em que impõem a tributação anual sobre a propriedade de terreno para construção cuja edificação, autorizada ou prevista, seja para habitação, cujo valor patrimonial seja igual ou superior a um milhão de euros (Acórdãos n. os 568/16, 692/16, 70/17, 378/18, 493/18, 605/18 e 22/19). Em todos os referidos julgamentos, o Tribunal atendeu, em face do recorte legislativo da incidência do imposto, ao que considerou ser a vertente real do imposto.
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