TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 104.º volume \ 2019
436 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL ou confiável. Ora […] um poder político assim, incapaz de merecer a confiança daqueles a quem se dirige, não pode ser nunca um poder limitado pelo direito e destinado a garantir a justiça, a dignidade da pessoa humana e a liberdade. O princípio da proibição do excesso, que postula a mensurabilidade de todos os atos estaduais, integra o conteúdo material do princípio do Estado de direito exatamente pelas mesmas razões por que o fazem os outros princípios […] e que visam assegurar a calculabilidade possível dos com- portamentos públicos. É que não haverá nunca tal calculabilidade aí onde não for estabelecido o seguinte princípio de segurança: os atos estaduais, além de serem atos previsíveis, devem ser também, sempre, atos equilibrados, medidos e ponderados.» (vide Maria Lúcia Amaral, A Forma da República , cit., p. 187) No controlo da proibição do excesso, tem este Tribunal seguido na análise da relação de adequação entre um meio e o respetivo fim (princípio da proporcionalidade em sentido amplo) uma metódica de aplicação assente num triplo teste, assim sintetizado no Acórdão n.º 634/93: «O princípio da proporcionalidade desdobra-se em três subprincípios: princípio da adequação (as medidas restritivas de direitos, liberdades e garantias devem revelar-se como um meio para a prossecução dos fins visados, com salvaguarda de outros direitos ou bens constitucionalmente protegidos); princípio da exigibilidade (essas medidas restritivas têm de ser exigidas para alcançar os fins em vista, por o legislador não dispor de outros meios menos restritivos para alcançar o mesmo desiderato); princípio da justa medida, ou proporcionalidade em sentido estrito (não poderão adotar-se medidas excessivas, desproporcionadas para alcançar os fins pretendidos).» Recorde-se, em todo o caso, que o controlo exercido deve ser, em vista da salvaguarda do princípio da separação de poderes, não só menos intenso quando esteja em causa a atuação do legislador (vide, por exemplo, os Acórdãos n. os 484/00 e 187/01), como meramente negativo (vide, entre outros, os Acórdãos n. os 509/15 e 81/16: existe violação do princípio da proporcionalidade se a medida em análise for considerada inadequada (convicção clara de que a medida é, em si mesma, inócua, indiferente ou até negativa, relativamente aos fim visado); ou desnecessária (convicção clara da existência de meios adequados alternativos mas menos onerosos para alcançar o fim visado); ou desproporcionada (convicção de que o ganho de interesse público inerente ao fim visado não justifica nem compensa a carga coativa imposta; relação desequilibrada entre os custos e os benefícios).” 28.º Ora, a opção legislativa subjacente ao artigo 80º, n.º 1 do Código Penal é uma medida adequada aos fins pretendidos – melhorar, por um lado, a situação do arguido sem, para tal, colocar em causa o fim preventivo das penas –, e não se afigura nem desnecessária, nem excessivamente onerosa ou restritiva. Pelo contrário, entre o sentido da alteração da referida norma e o fim por ela prosseguido, há um equilíbrio, uma ponderação e, sobretudo, uma justa medida. Tal finalidade é, por outro lado, facilmente detetável e compreensível para os seus destinatários, com exceção, talvez (ou talvez não, dada a profusa argumentação por ele utilizada em defesa da sua tese), do arguido. Por último, a alteração legislativa subjacente ao atual art. 80º, n.º 1 do Código Penal, em termos de eventual restrição aos direitos do arguido ora recorrente, resiste ao triplo teste atrás indicado: afigura-se adequada, necessária e não desproporcionada. 29.º Também em termos de direito internacional, não parece que a solução legislativa encontrada para o art. 80º, n.º 1 do Código Penal viole qualquer norma. Assim, relativamente ao art. 9.º do Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos, designadamente o n.º 5 desta disposição, o Comentário Geral 35, elaborado pelo Comité de Direitos Humanos, refere, no n.º 51:
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