TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 104.º volume \ 2019

435 acórdão n.º 104/19 Como referido, por exemplo, no Acórdão 277/16, de 4 de maio (Relator: Conselheiro Pedro Machete) (des- taques do signatário): “8. A proibição do excesso constitui, tal como o princípio da proibição do arbítrio, uma componente ele- mentar da ideia de justiça, razão por que aquele princípio pode reclamar uma validade geral. Como realça Reis Novais, «[s]ó essa vinculação entre proibição do excesso, proporcionalidade, Estado de direito e justiça explica que, apesar das substanciais diferenças dos textos constitucionais ou mesmo da sua ausência nesses textos, seja idêntica ou muito próxima a tendência de evolução que, a propósito, se desenvolve nos Estados Unidos da América ou nos diferentes países europeus, na jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem ou na jurisdição comunitária» (Autor cit., Os Princípios Constitucionais Estruturantes da República Portuguesa , Coimbra editora, Coimbra, 2004, p. 165). A mencionada conexão imediata com a ideia de justiça e de Direito justifica igualmente que, no tempo presente, se retomem as preocupações clássicas em matéria de moderação e, por conseguinte, não se confine o âmbito de aplicação da proibição do excesso às relações jusfundamentais em que esteja em causa a liberdade, alargando-o a toda e qualquer atuação dos poderes públicos. (…) E, na verdade, a proibição do excesso (ou a proporcionalidade em sentido amplo) tem vindo a ser reco- nhecido como princípio geral de limitação do poder público, pertinente para sindicar atuações públicas que interfiram, por exemplo, com direitos económicos, sociais e culturais. Tal aponta decisivamente para uma base normativo-constitucional daquele princípio que seja o mais abrangente possível. Nesse sentido, o Acórdão n.º 187/01, afirmou que «[r]elativamente às restrições a direitos, liberdades e garantias, a exigência de propor- cionalidade resulta do artigo 18º, n.º 2, da Constituição da República. Mas o princípio da proporcionalidade, enquanto princípio geral de limitação do poder público, pode ancorar-se no princípio geral do Estado de direito. Impõem-se, na realidade, limites resultantes da avaliação da relação entre os fins e as medidas públicas, devendo o Estado-legislador e o Estado-administrador adequar a sua projetada ação aos fins pretendidos, e não configurar as medidas que tomam como desnecessária ou excessivamente restritivas». Com efeito, o princípio do Estado de direito democrático consagrado no artigo 2.º da Constituição, pelas suas conotações históricas e devido à sua natureza de “princípio fundamental”, é expressão da ideia de que a garantia da liberdade, igualdade e segurança dos cidadãos se funda na sujeição do poder público a normas jurídicas: um Estado informado pela ideia de Direito não pode, sem negar a sua essência, ser um Estado pre- potente, arbitrário ou injusto (cfr. os Acórdãos n. os 205/00 e 491/02). Nessa perspetiva, o Acórdão n.º 73/09 entendeu «o princípio da proporcionalidade [como um] princípio geral de limitação do poder público que pode ancorar-se no princípio geral do Estado de direito, impondo limites resultantes da avaliação da relação entre os fins e as medidas públicas, devendo o Estado (também o Estado‑legislador) adequar a sua ação aos fins pretendidos, e não estatuir soluções desnecessárias ou excessivamente onerosas ou restritivas». Deste modo, «as decisões que o Estado ( lato sensu ) toma têm de ter uma certa finalidade ou uma certa razão de ser, não podendo ser ilimitadas nem arbitrárias, e [tal] finalidade deve ser algo de detetável e compreensível para os seus destinatários. O princípio da proibição de excesso postula que entre o conteúdo da decisão do poder público e o fim por ela prosseguido haja sempre um equilíbrio, uma ponderação e uma “justa medida” e encontra sede no artigo 2.º da Constituição. O Estado de direito não pode deixar de ser um “Estado proporcional”» (cfr. o Acórdão n.º 387/12; itálico aditado). Por isso, as atuações dos poderes públicos, justamente pelo facto de não poderem ser ilimitadas nem arbitrárias, são perspetivadas em cada caso concreto, real ou representado, como meios para atingir um certo fim – pressupondo-se naturalmente a legitimidade constitucional tanto dos pri- meiros como do segundo. Assim: «[S]e se tolerasse que os encargos impostos pelas suas decisões aos cidadãos fossem desmedidos, não justificados pelos seus fins específicos e – por isso mesmo – levianos, dificilmente se conseguiria assegurar a ideia segundo a qual a atividade estadual deve surgir, para os seus destinatários, como algo sério, seguro

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