TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 104.º volume \ 2019

418 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL 42. Assim sendo, o elemento literal do tipo previsto no artigo 374.º, n.º 1, do Código Penal, assenta na previsão de duas proposições ligadas por uma conjunção disjuntiva, exprimindo, nesta exata medida, uma dupla hipótese de preenchimento («der ou prometer»). 42. [sic] O enunciado normativo é, nestes termos, particularmente claro e preciso: (i) o tipo legal encon- tra-se preenchido nos casos em que agente proceda à efetiva entrega da vantagem indevida ao funcionário, sem que previamente tenha dado a conhecer ao funcionário essa intenção («der»); (ii) o tipo legal dá-se tam- bém por preenchido pela promessa enquanto manifestação da vontade de oferta da vantagem («prometer»). Aquele que “prometer” a entrega de vantagem patrimonial ou não patrimonial indevida pratica um crime de corrupção ativa ao abrigo do artigo 474.º do Código Penal, e, se assim é, nos casos em que antes da entrega ocorra uma promessa de entrega, o crime dá-se por consumado com a “ação de prometer”. 43. De facto, no entendimento do legislador, quer a promessa quer a entrega são penalmente censurá- veis e, por isso, aptas a desencadear as consequências jurídicas da prática de um crime de corrupção ativa. Basta a promessa para que o crime seja dado por consumado, independentemente de a ela se seguir a entrega efetiva da “coisa prometida”; a “entrega” não constitui, pois, um elemento necessário do tipo. Sendo certo que o elemento literal é já por si esclarecedor neste sentido, veja-se o que, a este propósito, escreve Jorge de Figueiredo Dias (“Parecer solicitado pela Alta Autoridade contra a Corrupção, in Colectânea de Jurisprudência, Ano XIII, Tomo I, 1998, p. 33): «(…) a separação típica que se observa entre as corrupções “ativa” e “passiva” impõe que a punição dos respec- tivos agentes se determine isoladamente, em função de cada um dos correspondentes preceitos legais – pelo que, repita-se, a consumação ou a tentativa da primeira não dependem do facto de a segunda ter atingido determinado estádio “executivo”». Bem como António M. de Almeida Costa [ Comentário Conimbricense ao Código Penal, Tomo III, (coord. Jorge de Figueiredo Dias), Coimbra Editora, Coimbra, 2001, p. 682]: «(…) a corrupção ativa consuma-se com o simples oferecimento ou promessa de suborno por parte do agente, independentemente de a reação do funcionário se traduzir numa atitude de aceitação ou de repúdio. Além de corresponder ao conteúdo de ilícito característico da presente infração (…), é esse o entendimento que melhor se ajusta à própria letra dos n. os 1 e 2 do art. 374º que se limitam a declarar possível de sanção o indivíduo que “(…) der ou prometer (…)” uma vantagem indevida para os fins dos artigos 372º e 373º, omitindo qualquer referência ao facto de um funcionário receber ou, pelo contrário, recusar a peita (ou a promessa)» E ainda Manuel Leal-Henriques e Simas Santos ( Código Penal Anotado , Vol. II, 3.ª edição, Rei dos Livros, Lisboa, p. 1616): «O crime de corrupção ativa consuma-se com a simples dádiva ou promessa de dádiva e nesse momento é violado o bem jurídico protegido. O que quer dizer que a ilicitude a considerar é a resultante da prática daquelas condutas e não a que resulta da execução do ato ilícito por parte do corrupto passivo. No entanto, no plano das consequências do crime, é de aceitar que a não execução do ato ilícito possa ser atendida na fixação da pena, fun- cionando como atenuante geral.» 44. Em suma, a letra da lei tipifica a “promessa” enquanto conduta que satisfaz plenamente a previsão normativa, pelo que os efeitos jurídicos decorrentes da estatuição não ficam dependentes da entrega da van- tagem nem da sua aceitação.

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