TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 104.º volume \ 2019

414 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL  24. Neste contexto, e tal como afirmado pelo Ministério Público, não se nega que o Supremo Tribunal de Justiça procedeu à aplicação do n.º 1 do artigo 119.º do Código Penal no sentido de que o prazo de pres- crição dos procedimento criminais corre desde a consumação material do crime ou terminação. 25. No entanto, tal interpretação não foi feita de forma isolada, mas sim assumidamente realizada em função de uma dada interpretação daquele tipo criminal, o que, aliás, não poderia deixar de ser, dado que a aplicação da norma extraível do n.º 1 do artigo 119.º do Código Penal encontra-se dependente da determi- nação do momento da consumação em razão do tipo de crime. Aliás, tal foi, por um lado, implicitamente assumido no intróito realizado pelo Supremo Tribunal de Justiça à apreciação da questão prévia da prescrição dos procedimentos criminais em escrutínio, pela asserção de que essa questão sempre teria de ser decidida em aplicação da lei substantiva penal resultante do Decreto- -Lei n.º 48/95, de 15 de março, em concreto, dos artigos 372.º e 374.º do Código Penal. E, por outro, tal assumido de forma explícita pelo tribunal a quo, pela concreta afirmação de que, para efeitos da determinação do início da contagem do prazo prescricional, a consumação do crime de corrupção ativa se dá, no seu entendimento, apenas aquando da entrega de uma dada vantagem, e não da promessa de vantagem. 26. Isto é, o tribunal recorrido, em aplicação conjugada do artigo 119.º, n.º 1, e do artigo 374.º, n.º 1, adotou a interpretação normativa segundo a qual o início do prazo prescricional do crime de corrupção ativa verifica-se apenas com a efetiva transferência da vantagem (“data do pagamento dos subornos”) enquanto momento da consumação do crime. 27. Deste modo, o Supremo Tribunal de Justiça adotou, de facto, uma interpretação normativa dos artigos 119.º, n.º 1, e 374.º, n.º 1, do Código Penal, no sentido de que o prazo de prescrição do crime de corrupção ativa é contado a partir da data em que ocorra a entrega de uma dada vantagem ao funcionário, e não a partir da data em que ocorra a promessa dessa vantagem, tendo sido precisamente ao abrigo deste critério normativo que procedeu à apreciação da prescrição dos procedimentos criminais a fls. 53461-53464. 28. No mais, não pode ser dado como procedente o entendimento do Ministério Público segundo qual aquilo que o recorrente contesta «é a aplicação do direito ao caso por parte do Supremo Tribunal de Justiça», para assim se concluir que a questão de constitucionalidade invocada não tem dimensão normativa. 29. Pelo contrário, a interpretação no sentido de que o prazo de prescrição do crime de corrupção ativa é contado a partir da data em que ocorra a entrega de uma dada vantagem ao funcionário, e não a partir da data em que ocorra a promessa dessa vantagem, encontra-se dotada de uma elevado grau de abstração, dizendo, aliás, respeito à aplicação de uma categoria normativa legal, em concreto ao critério normativo aplicável à determinação do momento da consumação do crime de corrupção ativa. De facto, o entendimento adotado pelo tribunal recorrido é suscetível de ser replicado numa multitude de casos, grosso modo, em todas as situações em que o agente prometa entregar a funcionário uma vantagem patrimonial ou não patrimonial indevida, tornando-se sempre necessário apurar qual o momento da consu- mação desse crime para efeitos do início da contagem do prazo de prescrição. 30. Pelo que, afastadas as dúvidas levantadas pelo douto Ministério Público quanto à admissão do recurso no que respeita à primeira questão de constitucionalidade, importa sobre ela decidir.

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