TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 104.º volume \ 2019
410 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL i. Admissibilidade da segunda, terceira, quarta e quinta questões de constitucionalidade invocadas pelo recorrente 11. As questões de constitucionalidade sob escrutínio foram delimitadas pelo recorrente nos seguintes termos (fls. 53705 a 53706; fls. 53707 a 53708): «(…) inconstitucionalidade material, por violação do princípio da legalidade criminal, vertido no artigo 29.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa, das normas penais contidas nos artigos 372.º, n.º 1, e 374.º, n.º 1, ambas do Código Penal, na versão resultante do Decreto-Lei n.º 48/95, de 15 de março, interpretadas e aplicadas no sentido segundo o qual a prática de um ato contido nos poderes discricionários do funcionário que haja atuado motivado pela promessa do pagamento de um suborno se traduz na prática de crimes de corrupção para ato ilícito» «(…) inconstitucionalidade material, por violação das garantias de defesa e do direito ao recurso previstos no artigo 32.º, n.º 1, e da garantia do processo justo e equitativo, prevista também no artigo 32.º, n. os 1 e 2, e no artigo 20.º, n. os 1 e 4, da Constituição da República Portuguesa, da norma constante do artigo 410.º, n.º 1, do CPP, interpretada e aplicada no sentido de que o tribunal de última instância pode conhecer de questões novas (não suscitadas perante o tribunal recorrido)» «(…) inconstitucionalidade material, por violação das garantias de defesa e do direito ao recurso previstos no artigo 32.º, n.º 1, e da garantia do processo justo e equitativo, prevista também no artigo 32.º, n. os 1 e 2, e no artigo 20.º, n. os 1 e 4, da Constituição da República Portuguesa, da norma constante do artigo 434.º do CPP, interpre- tada e aplicada no sentido de que o tribunal de última instância pode conhecer de questões novas (não suscitadas perante o tribunal recorrido)» «(…) inconstitucionalidade material, por violação dos princípios do Estado de direito Democrático, consa- grado no artigo 2.º, da garantia do processo justo e equitativo, previsto nos artigos 20.º, n. os 1 e 4, 32.º, n. os 1 e 2, e 205.º, n.º 1, do dever de fundamentação, previsto no artigo 205.º, n.º 1, e das garantias de defesa, bem como do direito ao recurso, consagrados no artigo 32.º, n.º 1, todos da Constituição da República Portuguesa, das normas constantes dos artigos 374.º, n.º 2, e 375.º, n.º 1, do CPP, interpretadas e aplicadas no sentido de que a reformu- lação do cúmulo jurídico, em sede de recurso, pelo tribunal de recurso, não carece de fundamentação.» 12. Ora, ao contrário do pugnado pelo recorrente, o tribunal a quo não procedeu à aplicação das normas e interpretações normativas, nos termos acima delimitados. 13. Desde logo, quanto à segunda questão de constitucionalidade, o Supremo Tribunal de Justiça, ao aplicar os artigos 372.º, n.º 1, e 374.º, n.º 1, do Código Penal, fê-lo na interpretação segundo a qual cons- titui crime de corrupção para ato ilícito a prática de ato por funcionário que se mostre desconforme com os deveres do cargo por influência do suborno, ou respetiva promessa, independentemente de se tratar de um ato praticado ao abrigo de um poder tido por discricionário. Neste sentido, o tribunal recorrido afirmou expressamente que «(…) independentemente da ultrapas- sagem da esfera de discricionariedade, o ato dever-se-á considerar ilegal, ferido de uma invalidade que con- tende com o seu conteúdo ou substância, fundada em vício de desvio de poder (…), quando o agente se deixou influenciar pelo suborno, tomando uma decisão diversa da que tomaria se a gratificação (ou respec- tiva promessa) não tivesse ocorrido, sendo que só se estará perante corrupção imprópria quando o suborno em nada influiu na conduta do funcionário (…) não podemos deixar de concluir no sentido da ocorrência de corrupção própria, uma vez que é patente em todas as situações ora em apreciação os agentes passivos se terem deixado influenciar pela dádiva proposta pelo arguido A. (…)» (fls. 53472 a 53474 v) . 14. Deste modo, resulta claro não ser imputável ao tribunal recorrido uma interpretação dos enunciados normativos constantes dos artigos 372.º, n.º 1, e 374.º, n.º 1, do Código Penal, no sentido de que a prática
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