TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 104.º volume \ 2019

406 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL 115. Atento o explanado, verificando-se que, conforme antevisto pelo Exm.º Sr. Conselheiro relator, as inter- pretações normativas constantes das segunda a quinta questões, cuja inconstitucionalidade foi suscitada pelo recor- rente, não foram efectivamente aplicadas pelo tribunal a quo , não deverá o Tribunal Constitucional, também por esta razão, tomar conhecimento do objeto do recurso. 116. Por força de tudo o que foi exposto, quer por se verificar que o recurso ficou deserto, quer porque as inter- pretações normativas contestadas não foram efetivamente aplicadas pelo tribunal a quo , afigura-se-nos que deverá o Tribunal Constitucional, no caso vertente, decidir pelo não conhecimento do objeto do recurso. 117. Passando a examinar a primeira questão apresentada, qual seja, a da interpretação do disposto, conjugada- mente, nos artigos 119.º, n.º 1 e 374.º, n.º 1, do Código Penal, na versão posterior à entrada em vigor do Decreto- -Lei n.º 48/95, de 15 de março, “no sentido de que o prazo de prescrição do crime de corrupção ativa é contado a partir da data em que ocorra a entrega de uma dada vantagem ao funcionário, e não a partir da data em que ocorra a promessa dessa vantagem”, entendemos dever ponderar, previamente à sua apreciação substantiva, se, também aqui, os julgadores a quo aplicaram efectivamente a dimensão normativa identificada e impugnada pelo recorrente. 118. Tendo comprovado que, em nosso entender, a dimensão normativa extraível do disposto, conjugada- mente, nos artigos 119.º, n.º 1 e 374.º, n.º 1, do Código Penal, na versão posterior à entrada em vigor do Decreto- -Lei n.º 48/95, de 15 de março, identificada e impugnada pelo recorrente não foi, efectivamente, aplicada pelo douto tribunal a quo no acórdão recorrido, resta-nos concluir que, também quanto a esta questão de constitucio- nalidade, deverá o Tribunal Constitucional decidir pelo não conhecimento do objeto do recurso. 119. Sem prejuízo do exposto, e para a hipótese que, sem conceder, admitimos de, ainda assim, entender o Tri- bunal Constitucional dever conhecer do objeto do recurso quanto a esta questão de constitucionalidade, passamos, ainda que brevemente, a pronunciar-nos sobre a substância do dissídio. 120. No juízo do recorrente, a interpretação normativa que emerge da conjugação entre o disposto nos artigos 119.º, n.º 1 e 374.º, n.º 1, do Código Penal, na versão posterior à entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 48/95, de 15 de março, viola “o princípio do Estado de direito (artigo 2.º da Constituição), os princípios da proteção da confiança e da segurança jurídica (artigo 2.º da Constituição), o princípio da proporcionalidade (artigos 2.º e 18.º, n.º 2, da Constituição), o princípio da legalidade em matéria criminal (artigos 29.º, n. os 1 e 3, da Constituição), o princípio da igualdade (artigo 13.º da Constituição) e o direito à liberdade (artigo 27.º da Constituição)”. 121. Contudo, antes de escalpelizarmos a argumentação expendida pelo recorrente sobre esta temática, pro- curámos recordar as razões substantivas e processuais fundamentais que justificam o acolhimento, em sede de procedimento criminal, do instituto da prescrição, tendo concluído, para além do mais, que Constituição da República Portuguesa não consagra, implícita ou explicitamente, uma regra de imprescritibilidade, ou de proibição da imprescritibilidade do procedimento criminal. 122. Do exposto resultou, não só, a confirmação da inexistência de um direito constitucional à prescrição do procedimento criminal mas, igualmente, a afirmação da inexistência de quaisquer constrangimentos constitucio- nais à liberdade de conformação do legislador ordinário no que concerne à regulamentação da prescrição, desde que tal regulamentação seja estabelecida de forma precisa e concreta e impeça situações em que se opere, na prática, a ineficácia do instituto. 123. Sucede que, no caso que nos ocupa, não só a interpretação normativa que o recorrente contesta não cria qualquer situação de imprescritibilidade do procedimento criminal como ainda, concorrentemente, estabelece precisa e concretamente, qual o prazo de prescrição do procedimento criminal e, essencialmente, qual o momento do início da contagem desse prazo. 124. Com efeito, a interpretação normativa impugnada ao estabelecer que o momento do início da contagem do prazo prescricional ocorre na data da consumação do crime, permite prever com segurança, excepcionadas as consequências de eventuais factos suspensivos ou interruptivos, a data da ocorrência da prescrição do procedi- mento criminal e, consequentemente, não transmuta em imprescritível, em qualquer circunstância, o crime de corrupção ativa.

RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=