TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 104.º volume \ 2019

396 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL  3. O requerimento de recurso para este Tribunal foi admitido por despacho do tribunal a quo, proferido em 23 de maio de 2018 (fls. 53729). 4. Por despacho proferido a fls. 53737 determinou-se a produção de alegações, nos seguintes termos: «Para alegações quanto à seguinte questão de constitucionalidade: interpretação dos artigos 119.º, n.º 1 e 374.º, n.º 1, ambos do Código Penal, na versão posterior à entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 48/95, de 15 de março, no sentido de que o prazo de prescrição do crime de corrupção ativa é contado a partir da data em que ocorra a entrega de uma dada vantagem ao funcionário, e não a partir da data em que ocorra a promessa dessa vantagem. No mais, promovendo a harmonia processual dos autos, notifique-se as partes para, em sede de alegações e querendo, se pronunciarem quanto a um possível juízo de não admissão das restantes questões de constituciona- lidade, pelo facto de o tribunal recorrido não ter aplicado as dimensões normativas cuja inconstitucionalidade é invocada pelo recorrente (questões de constitucionalidade invocadas no requerimento de interposição de recurso a fls. 53712; fls. 53715; fls. 53719; fls. 53720).» 5. O recorrente apresentou as suas alegações e concluiu nos seguintes termos (fls. 53741 a 53864): «Da inconstitucionalidade material da interpretação normativa objeto do presente recurso A. O recorrente pretende que seja julgada inconstitucional a interpretação normativa resultante da conjugação das normas constantes dos artigos 374.º, e 119.º, n.º 1, do Código Penal, na versão resultante do Decreto- -Lei n.º 48/95, de 15 de março, interpretadas e aplicadas no sentido segundo o qual o prazo de prescrição do crime de corrupção ativa previsto e sancionado pelo artigo 374.º, n.º 1, nas situações em que à promessa de vantagem se siga a efectiva entrega da mesma ao funcionário, se conta a partir do momento em que tal entre- ga tenha ocorrido, por violar o princípio do Estado de direito (artigo 2.º da Constituição), os princípios da proteção da confiança e da segurança jurídica (artigo 2.º da Constituição), o princípio da proporcionalidade (artigos 2.º e 18.º, n.º 2, da Constituição), o princípio da legalidade em matéria criminal (artigos 29.º, n. os 1 e 3, da Constituição), o princípio da igualdade (artigo 13.º da Constituição) e o direito à liberdade (artigo 27.º da Constituição), revogando-se em consequência a decisão recorrida, a qual deverá ser reformada em conformidade com o decidido quanto à questão de constitucionalidade. B. O presente recurso vem interposto ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, na medida em que o Acórdão recorrido aplicou, como ratio decidendi , a referida interpretação normativa cuja inconstitucionali- dade foi suscitada, pelo recorrente, durante o processo. C. Apesar de não se encontrar na Constituição qualquer menção à prescrição, a verdade é que a prescrição, na medida em que é imposta por princípios inerentes ao Estado de direito, nomeadamente pelo princípio da proporcionalidade, na dimensão da necessidade das penas, bem como pelos princípios da proteção da con- fiança e da segurança jurídica, e favorece e consolida a paz jurídica, não poderá deixar de ser considerada um valor jurídico-constitucional, conforme enfatizado no Acórdão n.º 483/02 do Tribunal Constitucional. D. Assim, por imposição dos referidos princípios e valores constitucionais, uma vez consagrada na Lei ordinária, de forma precisa e concreta, a prescrição do procedimento criminal respeitante a determinado crime, não serão admissíveis quaisquer interpretações normativas que se traduzam, na prática, na sua imprescritibilidade. E. Acontece que a interpretação normativa objeto do presente recurso conduz, ao fim e ao cabo, a verdadeiras situações de imprescritibilidade, que não se encontram expressamente previstas na Lei – e, por isso, também conflituam com o princípio da legalidade –, na medida em que, por efeito desta, o termo a quo do prazo de prescrição do procedimento criminal fica suspenso até ao momento do pagamento do último suborno, apesar de o crime se ter por consumado com a promessa da vantagem e de, a partir desse exato momento, poder ser perseguido criminalmente. F. Efectivamente, a ocorrência de pagamentos de subornos muito para além da ocorrência da promessa de vantagem (que determina a consumação do crime) levaria, na tese subjacente àquela interpretação, a uma

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