TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 104.º volume \ 2019
395 acórdão n.º 90/19 em conta a solução jurídica acolhida no acórdão recorrido (consubstanciada na ausência total de fundamentação), sempre se terá de concluir que a mesma foi implicitamente aplicada, e constituiu o seu fundamento jurídico. 9.4. Perante o exposto, impõe-se a conclusão de que a interpretação normativa cuja inconstitucionalidade o Arguido suscita foi efectivamente aplicada pelo Supremo Tribunal de Justiça no Acórdão recorrido, na medida em que consubstancia o fundamento jurídico determinante (ainda que implícito) para a solução jurídica encontrada quanto à (ausência de) fundamentação da reformulação do cúmulo jurídico. – Normas e princípios constitucionais que se considera terem sido violados 9.5. A dimensão normativa dos artigos 374.º, n.º 2, e 375.º, n.º 1, do CPP, aplicada no sentido explicitado no ponto 9 supra, adoptado pelos Acórdãos recorridos, viola o princípio do Estado de direito Democrático, consa- grado nos artigos 1.º e 2.º, da garantia do processo justo e equitativo, previsto nos artigos 20.º, n. os 1 e 4, 32.º, n. os 1 e 2, e 205.º, n.º 1, bem como no artigo 6.º da CEDH e no artigo 14.º do Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos, violando ainda o dever de fundamentação, previsto no artigo 205.º, n.º 1, e das garantias de defesa, bem como do direito ao recurso, consagrado no artigo 32.º, n.º 1, todos da Constituição da República Portuguesa e ainda no artigo 2.º do Protocolo n.º 7 adicional à CEDH e no artigo 14.º, n. os 1 e 5, do Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos. – Peças processuais em que foi suscitada a questão de (in)constitucionalidade 9.6. A questão de (in)constitucionalidade normativa referida no ponto 9 supra foi suscitada no ponto 159 do Requerimento de arguição de vícios processuais apresentado pelo Arguido A. a fls. …, com entrada em 10 de abril de 2018. Conforme acima explicado, reitera-se que tal questão de (in)constitucionalidade normativa só foi, rectius , só pôde ser suscitada no mencionado requerimento, na medida em que não era exigível ao Arguido A. que antecipasse como possível a aplicação ao caso dos autos dos artigos 374.º, n.º 2, e 375.º, n.º 1, do CPP, na referida interpre- tação normativa, tendo sido, por isso, completamente surpreendido com a sua aplicação no Acórdão recorrido do Supremo Tribunal de Justiça, de 21 de março de 2018. Com efeito, a regra que obriga a suscitar a questão de inconstitucionalidade antes da prolação da decisão recor- rida não pode ser interpretada e aplicada no sentido de exigir ao Arguido que, na formulação de juízo de prognose a que está obrigado, de modo a confrontar tempestivamente os tribunais com as questões de constitucionalidade, tenha de antecipar todas as possíveis interpretações normativas que possam vir a ser aplicadas para dirimir a causa, mesmo as de conteúdo insólito ou flagrantemente inconstitucional, na medida em que tais interpretações não são minimamente expectáveis num Estado de direito. O juízo de prognose a que o Arguido está obrigado, em conformidade com um dever de litigância diligente e de prudência técnica, terá sempre de partir de um pressuposto de razoabilidade na aplicação do Direito. Ora, não pode ser tido por razoável e, por isso, por expectável, que um Tribunal Superior proceda à reformu- lação da medida do cúmulo jurídico sem fundamentar essa decisão. Se assim não se entender, terá de chegar-se à (insustentável e impraticável) conclusão de que todo e qualquer Arguido deverá suscitar nos recursos que apresente a inconstitucionalidade dos artigos 374.º, n.º 2, e 375.º, n.º 1, do CPP, quando interpretados e aplicados no sen- tido de não ser obrigatória a fundamentação da decisão. Não é, nem pode, evidentemente, ser assim. Como tal, só em reação à aplicação de tal interpretação normativa (surpresa) haveria, como se julgou e julga haver, cabimento em colocar a questão agora submetida à apreciação deste Tribunal. Sendo certo que, no seguimento da orientação jurisprudencial do Tribunal Constitucional a que acima se fez alusão, tal interpretação normativa consubstancia simultaneamente a nulidade da decisão, nos termos da aplicação conjugada dos artigos 379.º n.º 1, alínea a) , primeira parte, e 425.º, n.º 4, do CPP, tendo, por isso, o Arguido A. suscitado a questão de inconstitucionalidade que agora pretende ver apreciada perante o Tribunal recorrido no “momento mais próximo” em que a mesma surgiu.»
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