TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 104.º volume \ 2019
373 acórdão n.º 89/19 marido da mãe e obter o reconhecimento da sua paternidade, só podendo intervir processualmente através do Ministério Público e depois de previamente reconhecida a viabilidade do pedido. A enunciada interpretação integra duas componentes normativas que, não sendo totalmente autónomas entre si, são diferenciáveis: aquela que afasta a legitimidade do pretenso progenitor para intentar a ação de impugnação de paternidade; e aquela que configura a alternativa que o sistema normativo confere àquele que se declara pai do filho – nascido ou concebido na constância do matrimónio da mãe – para poder afastar a presunção da paternidade do marido da mãe e obter o reconhecimento da sua, que é a de agir processual- mente por intermédio do Ministério Público e apenas se for reconhecida pelo tribunal a viabilidade da ação de impugnação da paternidade. Como decorre do relatório da presente decisão, o recorrente instaurou o processo que deu origem ao presente recurso, invocando o direito, que alega ser objeto de tutela constitucional, de propor por si próprio ação que lhe permita afastar a paternidade presumida do marido da mãe e obter o reconhecimento da sua paternidade; simultaneamente, arguiu a inconstitucionalidade da solução imposta ao pretenso progenitor pelas normas conjugadas dos artigos 1838.º, 1839.º, n.º 1, e 1841.º do CC, de agir processualmente, para esse efeito, apenas através do Ministério Público. Esta foi, pois, a questão central que foi apreciada e decidida, em sentido negativo, pelas instâncias – a de saber se aquele que se declara pai do filho tem legitimidade processual (ativa) para intentar ação judicial que lhe permita afastar a paternidade presumida do marido da mãe e obter o reconhecimento da sua paternidade. Sendo este o objeto da controvérsia, parece claro que o eixo normativo da discussão se situa no disposto no n.º 1 do artigo 1841.º do CC, conjugado com os artigos 1838.º e 1839.º, n.º 1, do mesmo Código, normas que precisamente reservam ao Ministério Público o poder de propor a ação de impugnação de paternidade, a requerimento de quem se declara pai do filho, negando a este, na interpretação sindicada, a possibilidade de o fazer de motu proprio. As normas constantes dos n. os 2 a 4 do artigo 1841.º do CC, que são difusamente sindicadas pelo recor- rente, no presente recurso, através da referência global a este preceito legal, apenas regulam o requerimento através do qual o pretenso progenitor pede ao tribunal a intervenção do Ministério Público, com vista à instauração da ação de impugnação de paternidade, e os termos processuais subsequentes à apresentação em juízo desse requerimento. Impõe-se, por isso, reajustar o objeto do recurso em função das exigências processuais de utilidade do juízo de mérito a formular pelo Tribunal Constitucional, já enunciadas, restringindo a pronúncia à questão da inconstitucionalidade apenas à norma do n.º 1 do artigo 1841.º do CC, conjugada com as normas dos artigos 1838.º e 1839.º, n.º 1, do CC, na interpretação segundo a qual o pretenso progenitor não tem legiti- midade ex novo para afastar a presunção do marido da mãe e obter o reconhecimento da sua paternidade, só podendo intervir processualmente através do Ministério Público e apenas se for reconhecida pelo tribunal a viabilidade da ação de impugnação da paternidade. Mérito do recurso 3. Defende o recorrente que as referidas normas legais, na descrita interpretação, violam o direito à identidade pessoal (artigo 26.º, n.º 1, da Constituição), o direito de constituir família (artigo 36.º da Cons- tituição), o direito fundamental do pai e mãe biológicos não serem separados dos filhos injustificadamente, o direito de ação (artigo 20.º da Constituição), o princípio da igualdade (artigo 13.º da Constituição) e o princípio da proporcionalidade (artigo 18.º da Constituição). Vejamos.
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