TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 104.º volume \ 2019

372 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL 1841.º, n.º 1 do Código Civil) e no prazo de sessenta dias a contar da data em que a paternidade do marido da mãe conste do registo (art. 1841.º, n.º 2 do Código Civil)». Apesar da ambiguidade da explicação adiantada pelo recorrente, acima transcrita, deve concluir-se que o recurso deixou de incluir, por sua opção expressa, a questão da inconstitucionalidade do n.º 2 do artigo 1841.º do CC, norma que, como antecipado pelo relator, não foi, em rigor, aplicada pelo tribunal a quo em fundamento do julgado. Com efeito, a decisão recorrida apenas se pronunciou sobre o problema da legitimidade processual ativa do pretenso progenitor para intentar diretamente a ação de impugnação de paternidade, e não sobre os termos em que a lei regula o requerimento pelo qual aquele que se declara pai do filho pede a intervenção mediadora do Ministério Público, para o efeito de instauração dessa ação, em cujo âmbito normativo se coloca a questão do prazo previsto no n.º 2 do artigo 1841.º do CC. Acresce que não teria qualquer sentido útil aferir da inconstitucionalidade do prazo previsto para a apresentação em juízo do citado requerimento quando, no processo que deu origem ao presente recurso, esse requerimento não foi sequer intempestivamente apresentado no tribunal sob invocação da inconstituciona- lidade do prazo previsto no n.º 2 do artigo 1841.º do CC. Diversamente, a opção processual do recorrente foi a de instaurar diretamente a ação que visa o afastamento da paternidade presumida e o reconhecimento da sua própria paternidade. Ora, tendo sido essa a opção do recorrente, o único problema de inconstitucio- nalidade cuja solução se pode repercutir utilmente no desfecho dessa ação é precisamente aquele que tem por objeto a norma, ou interpretação, que impede o pretenso progenitor de a intentar, obrigando-o a intervir processualmente através do Ministério Público e depois de previamente reconhecida a viabilidade da ação de impugnação. Por outro lado, também não é possível aferir da inconstitucionalidade da norma, ou interpretação, que constitui objeto do presente recurso, tendo em consideração as soluções que o legislador adotou na regu- lamentação do pedido de intervenção do Ministério Público, designadamente no que respeita ao prazo de caducidade previsto para a sua apresentação em juízo, como parece pretender o recorrente. Apesar de os regimes jurídicos formarem um complexo normativo integrado, sendo hermenêuticamente exigível a consideração do elemento sistemático na compreensão de cada uma das suas normas, o sistema de fiscalização da constitucionalidade não se dirige ao controlo de conformidade de regimes globais ou conjun- tos normativos abstratos, mas de normas que, individualmente ou em conjunto, tenham sido efetivamente aplicadas pelo tribunal a quo por estarem verificadas as hipóteses de facto nelas previstas. Ora, a norma constante do n.º 2 do artigo 1841.º é autónoma daquelas que basearam a interpretação sindicada no presente recurso e, por não se ter verificado no caso sub judice a hipótese a que se aplica, não foi usada pelo tribunal a quo em fundamento da decisão recorrida, que se limitou a resolver a questão da legitimidade processual do autor, ora recorrente. Por isso, não pode o Tribunal Constitucional sequer considerar na apreciação do mérito do recurso a argumentação desenvolvida pelo recorrente no sentido de que, por força da exiguidade do prazo previsto no n.º 2 do artigo 1841.º do CC para o pretenso progenitor requerer a intervenção do Ministério Público (60 dias a contar da data em que a paternidade do marido da mãe consta do registo), há que formular um juízo de inconstitucionalidade consequencial dirigido à interpretação, objeto do presente recurso, segundo a qual o pretenso progenitor não tem legitimidade ex novo para afastar a presunção do marido da mãe e obter o reconhecimento da sua paternidade, só podendo intervir processualmente através do Ministério Público e depois de previamente reconhecida a viabilidade do pedido. 2. Quanto à questão de inconstitucionalidade subsistente, incidente sobre as normas dos artigos 1838.º, 1839.º, n.º 1, e 1841.º do CC, verifica-se que ela tem por objeto interpretação que textualmente corres- ponde àquela que o Supremo Tribunal de Justiça, no acórdão recorrido, julgou não inconstitucional: a interpretação segundo a qual o pretenso progenitor não tem legitimidade ex novo para afastar a presunção do

RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=