TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 104.º volume \ 2019
368 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acordam na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional: I – Relatório A. intentou no Tribunal Judicial da Comarca de Braga (Secção Cível da Instância Local de Vila Verde) ação declarativa contra B. e C., casados entre si, e o menor D., filho de ambos, pedindo, no essencial, que: a) se reconheça e declare que «o réu C. não é o pai biológico do menino D.», decretando-se, em consequência, «a anulação/nulidade do (…) registo de paternidade declarada/presumida [daquele] constante do assento de nascimento [deste último]»; b) se reconheça e declare que «o menino D. é filho de A. e que este é pai bioló- gico daquele», ordenando-se, em consequência, «a menção/inscrição/averbamento da identidade de A. como pai do menino D. [no assento de nascimento deste último]». Alegou, em síntese, como causa de pedir, que teve uma relação amorosa com a ré B., na constância do matrimónio desta última com o réu C., no âmbito da qual mantiveram relações sexuais, nomeadamente durante os primeiros 120 dias dos 300 que precederam o nascimento do menor D., não tendo a ré, durante esse período, qualquer relacionamento sexual com outro homem, nem sequer com o seu cônjuge, razão pela qual deve ser reconhecido como pai biológico do menor, considerando que lhe assiste e, bem assim, ao menor D., «o direito absoluto à identidade biológica», com consagração constitucional, entre outros, «nos artigos 11.º, 12.º e 26.º da CRP». Remetido o processo para a 1.ª Secção de Família e Menores da Instância Central de Braga na sequência de decisão de incompetência absoluta do tribunal, em razão da matéria, foi proferido despacho que convidou o autor a «precisar qual a sua legitimidade processual ativa, causa de pedir e pedido, atentando nas normas vigentes, em particular nas (limitações) decorrentes dos artigos 1838.º, 1839.º, 1848.º, 1869.º, 1861.º, do Código Civil». O autor, em resposta, esclareceu que «o (seu) interesse agir e legitimidade ativa (…) advém de princípios fundamentais de direito consagrados na lei fundamental (…), designadamente o direito à identidade biológica e/ou verdade biológica, o princípio da universalidade, o princípio da igualdade e o princípio da proibição de discriminação dos filhos nascidos fora do casamento (cfr., respectivamente, arts. 26.º, n. os 1 e 3, 12.º, 13.º e artigo 36.º, n.º 4, (…) da CRP)». Nesta sequência, arguiu a inconstitucionalidade das normas legais invocadas pelo tribunal no despacho de convite ao aperfeiçoamento, na «interpretação que vede a legitimidade do proge- nitor ver reconhecida a identidade do filho e o inerente direito ao reconhecimento da paternidade/filiação». No final, insistiu para que o tribunal lhe reconhecesse legitimidade processual ativa e requereu subsidiariamente, para a hipótese de assim não se entender, a intervenção provocada principal do Ministério Público, a fim de intervir nos autos como (seu) associado, nos termos do disposto no artigo 316.º e seguintes do Código de Pro- cesso Civil (CPC), conjugado com o n.º 1 do artigo 1841.º do Código Civil (CC). Por sentença de 20 de dezembro de 2016, o tribunal julgou o autor parte ilegítima e, em consequência, absolveu os réus da instância, considerando, além do mais, que a requerida intervenção principal do Minis- tério Público carecia de fundamento legal, sendo certo que este, «aliás, já intervém nos autos acessoriamente e [o incidente] nunca poderia viabilizar uma ação há muita caduca pelos ditames do citado artigo 1841.º». O autor, inconformado, interpôs da sentença recurso per saltum para o Supremo Tribunal de Justiça, suscitando a inconstitucionalidade material, quer das normas dos artigos 1838.º e 1841.º do CC, na inter- pretação segundo a qual «a legitimidade ativa para impugnar a visada paternidade apenas é deferida ao Ministério Público, ao marido da mãe ou ao filho, nos termos limitados dos arts. 1839.º/1841.º do Código Civil», quer deste último artigo 1841.º, na parte que estabelece o prazo de caducidade a que está sujeito o requerimento pelo qual aquele que se declara pai do filho pede a intervenção do Ministério Público (n.º 2), «por violação dos princípios da universalidade (artigo 12.º da CRP), da igualdade (artigo 13.º da CRP), da identidade pessoal e genética (artigo 26.º, n. os 1 e 3 da CRP), da proibição de discriminação dos filhos nasci- dos fora do casamento (artigo 36.º, n.º 4), do direito de procriar e constituir família (artigo 36.º da CRP), da
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