TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 104.º volume \ 2019

353 acórdão n.º 80/19 12. Ora, não há dúvida de que a norma em apreço versa sobre um relevante aspeto do regime de exercício de funções em juízos de competência especializada, uma vez que condiciona a ocupação da vaga à manutenção dos requisitos de acesso a tais cargos. Porém, estes requisitos são os definidos no artigo 45.º do EMJ; o regime jurídico a que obedece um dos principais requisitos de nomeação (ou seja, a classificação de serviço) encontra- -se no EMJ; e a competência para decidir, a final, sobre a vacatura do lugar e a colocação dos magistrados, é do órgão de governo próprio da magistratura judicial, ou seja, do Conselho Superior da Magistratura (tal como determina o n.º 1 do artigo 217.º da Constituição). Trata-se de uma regra aplicável apenas aos magistrados judiciais, ainda que vise especificamente os magistrados nomeados para o exercício de funções em juízos de competência especializada, em virtude do especial conteúdo funcional associado ao exercício de tais cargos (no sentido de serem admissíveis as diferenciações entre magistrados judiciais, quando justificadas pelas diferenças de conteúdo funcional, vide o Acórdão n.º 656/98). E é uma regra que não gera qualquer situação «de assi- milação ou equiparação, ainda que parcial» ao estatuto de quaisquer outros magistrados ou trabalhadores em funções públicas (como a norma objeto do recurso decidido pelo Acórdão n.º 620/07). Em suma, se a opção de inserir a regra na LOSJ poderá ser censurável no plano da legística, por não favorecer a clareza do regime de exercício de funções nos juízos de competência especializada ou por ser incongruente com as disposições de direito ordinário que reclamam a unidade formal dos regimes que atin- gem a inamovibilidade dos juízes, não constitui uma quebra da unidade estatutária dos juízes dos tribunais judiciais imposta pelo n.º 1 do artigo 215.º da Constituição. 13. A inamovibilidade dos juízes é uma garantia de respeito pelos princípios constitucionais do juiz natural e da independência dos tribunais – e não um direito subjetivo dos cidadãos que exercem as funções de magistrados judiciais −, mas tem de articular-se com a boa administração da justiça. Sendo certo que ina- movibilidade e boa administração convergem no sentido de valorizar a estabilidade pessoal dos magistrados – proporcionando-lhes tranquilidade de vida e condições de habituação ao trabalho −, não pode negar-se que necessidades de serviço determinem a movimentação dos juízes. De facto, a inamovibilidade não pode obstruir «a transferência de juízes para tribunais onde eles são mais necessários», desde que «predeterminada na lei» (Gomes Canotilho/Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, Vol. II, 4.ª edição, Coimbra, p. 587). 14. Considerando que a norma sindicada comprime a garantia da inamovibilidade dos juízes, cabe indagar se extravasa do domínio para esse efeito outorgado ao legislador pelo n.º 1 do artigo 216.º da Cons- tituição. Desde já se adianta a resposta negativa. Não se vê que a medida seja arbitrária. Prossegue o interesse público na nomeação dos magistrados que revelem maior aptidão para o exercício das funções inerentes aos cargos de maior exigência, com vista a favo- recer uma melhor administração da justiça. Através dela, logra-se evitar que magistrados colocados nos juízos de competência especializada se mantenham indefinidamente em funções, mesmo que não revelem um nível de desempenho digno de uma classificação de serviço igual ou superior a bom com distinção – nível este que é o considerado exigível para aceder a esses cargos, e é justificado pelas especiais exigências das funções a exercer nos juízos em causa. Assegura-se, por outro lado, que magistrados com classificações mais elevadas possam aceder a vagas limitadas para esses mesmos cargos, desde que adquirida a experiência mínima exigí- vel. Relembre-se, a propósito, que a valorização do mérito (além da antiguidade) dos magistrados judiciais, para efeitos de evolução na carreira, não é de modo algum estranha à arquitetura constitucional da organi- zação judiciária que, no que respeita ao recrutamento dos juízes dos tribunais judiciais de segunda instância, concede prevalência a esse mesmo critério (vide n.º 3 do artigo 215.º). Ora, não se afigura que tal desiderato – legítimo e valioso − pudesse ser prosseguido pelo legislador através de qualquer outra solução que não redundasse na cessação dos efeitos da nomeação dos juízes para os cargos em que se encontravam colocados. Acresce que a circunstância de essa consequência estar associada à classificação de serviço atenua significativamente a instabilidade associada a uma potencial alteração da

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