TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 104.º volume \ 2019

333 acórdão n.º 51/19 de contabilização dos serviços a remunerar no âmbito do patrocínio oficioso que compute como uma sessão apenas a intervenção em o ato ou diligência que tenha lugar nos períodos da manhã e da tarde do mesmo dia. O único segmento que porventura escapa à imprecisão com que é estabelecida a relação entre a norma sindicada e cada um dos «princípios e subprincípios» extraídos do princípio do Estado de direito, consagrado no artigo 2.º da Constituição, diz respeito à invocação do princípio da «segurança jurídica e [da proteção] da confiança dos cidadãos»: de acordo com a recorrente, «a interpretação normativa levada a cabo pelos acórdãos recorridos põe em causa a segurança jurídica e a confiança dos cidadãos nas decisões públicas, uma vez que não é exigível que o Advogado exerça tal patrocínio sem a certeza de que será retribuído em confor- midade com a lei». Assim explicitada, a censura constitucional para que aponta a recorrente não é de todo em todo viável. Enquanto refração do princípio do Estado de direito democrático consagrado no artigo 2.º da Consti- tuição, o princípio geral da segurança jurídica amplamente entendido, aponta para o reconhecimento a todo o indivíduo do «direito de poder confiar em que aos seus atos ou às decisões públicas incidentes sobre os seus direitos, posições ou relações jurídicas alicerçadas em normas jurídicas vigentes e válidas se ligam os efeitos jurídicos previstos e prescritos no ordenamento jurídico» (cfr. Acórdão n.º 345/09). Com este significado, o princípio da segurança jurídica é diretamente invocável contra os atos do poder legislativo – mais concretamente contra «a normação que, por sua natureza, obvie de forma intolerável, arbitrária ou demasiada opressiva àqueles mínimos de certeza e segurança que as pessoas, a comunidade e o direito têm de respeitar» –, mas não contra os atos do poder jurisdicional. Conforme refere Gomes Canotilho (cfr. Direito Constitucional e Teoria da Constituição, Coimbra, Almedina, 7.ª edição, p. 265), fora do âmbito do instituto do caso julgado, não existe, para o cidadão, um direito à «uniformidade ou estabilidade da juris- prudência», ou, dito de outro modo, à proteção da expetativa de que determinada lei venha a ser interpretada num certo sentido ou mediante a exclusão ou o afastamento de um outro. A «bondade da decisão pode ser discutida pelos tribunais superiores, que inclusivamente a poderão «revogar» ou «anular», mas o juiz é, nos factos submetidos a julgamento, autonomamente responsável» ( idem ). O resultado do exercício dessa responsabilidade – cometida, em exclusivo, aos outros Tribunais – não é sindicável pelo Tribunal Constitucional – que é umTribunal de normas e não dos atos do poder judicial (cfr. Acórdãos n. os  429/14 e 695/16) – não podendo passar a sê-lo a pretexto de que determinada interpretação do direito infraconstitucional contraria aquela que os respetivos destinatários teriam por acertada e expectável no caso. 20. Apesar de não ser inteiramente clara a razão pela qual cada um dos demais «princípios e sub- princípios» extraídos do princípio do Estado de direito, consagrado no artigo 2.º da Constituição, deverá obstar, de acordo com a tese defendida, à possibilidade de modelação da regra de cômputo da compensação devida aos profissionais forenses nos termos em que a aplicou o tribunal a quo, o sentido das reservas ou objeções que, no essencial, lhe são apontadas não deixa de sugerir a ideia de que, segundo a recorrente, tal critério afetará a justa remuneração do patrocínio judiciário que é devida nos termos da Constituição: segundo parece poder extrair-se do teor das alegações produzidas, a recorrente considera que a contabilização como uma única sessão apenas da intervenção em ato ou diligência judicial que tenha lugar nos períodos da manhã e da tarde do mesmo dia constitui uma afetação do direito à justa retribuição dos prestadores do apoio judiciário incompatível com as exigências a que o princípio da proibição do excesso, consagrado no n.º 2 do artigo 18.º da Constituição, sujeita as leis restritivas de direitos, liberdades e garantias. Ora, ainda que pudesse reconhecer-se na norma impugnada algum tipo de restrição do direito à justa retribuição, o certo é que a mesma sempre seria insuscetível de ser invalidada no âmbito do controlo da vali- dade constitucional para que remete o princípio da proibição do excesso. No controlo da proibição do excesso, a jurisprudência constitucional tem seguido na análise da relação entre um meio e o respetivo fim (princípio da proporcionalidade em sentido amplo) uma metódica de apli- cação assente num triplo teste, assim sintetizado no Acórdão n.º 634/93:

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