TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 104.º volume \ 2019

332 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL De acordo com a recorrente, o artigo 208.º da Constituição, ao enfatizar a relevância do exercício do patrocínio forense na efetivação do direito de acesso ao direto e à tutela jurisdicional efetiva, consagrados no artigo 20.º, n. os 1 e 2, da Constituição, impede que a representação judicial dos cidadãos, que aos advogados compete assegurar, não seja retribuída, ou seja retribuída de forma apenas insipiente. Não merece qualquer contestação a ideia de que o artigo 208.º da Constituição, ao reconhecer o patrocínio forense um elemento essencial à administração da justiça, acentua ou reforça o mandamento extraível já dos n. os 1 e 2 do respetivo artigo 20.º, obstando a que representação ou patrocínio judiciários possam ser excluídos do conjunto das prestações que ao Estado cabe assegurar no âmbito do cumprimento do seu dever de proteção jurídica dos cidadãos economicamente mais carenciados. Embora do referido preceito possa extrair-se, como pretende a recorrente, o entendimento de que o patrocínio forense, quando oficiosamente exercido, não pode deixar de ser compensado – e adequadamente compensado, conforme assegura o artigo 3.º, n.º 2, da Lei n.º 34/2004 –, o certo o mesmo nada diz sobre a concreta conformação dos critérios de medição dos serviços a remunerar, nem dos exatos valores que, em função do tipo de processo em causa e/ou da natureza ou duração do ato ou diligência em que a intervenção tenha lugar, o legislador se encontra habilitado a fixar como elementos referenciais do sistema de compen- sação. Acresce que, ao invés do que sucedia no âmbito do regime originariamente consagrado na Lei n.º 7/1970, de 9 de junho – cujas normas impunham aos profissionais do foro a aceitação e o exercício do patrocínio oficioso dos cidadãos economicamente carenciados, sem a garantia de virem a ser por eles remunerados –, o sistema de acesso ao direito e aos tribunais instituído pela Lei n.º 34/2004 tem na voluntariedade da participação dos profissionais do foro no sistema de apoio judiciário (cfr. artigo 10.º, n.º 1, da Portaria n.º 10/2008) um dos seus aspetos essenciais ou nucleares. Quer isto significar que, no âmbito do regime em vigor, cada profissional forense mantém incólume o seu direito de participar ou não no sistema de apoio judiciário, direito esse que é inteiramente livre de exercer num sentido ou noutro, levando, designadamente, em consideração a compensação que, por cada ato de representação ou assistência judiciária, se lhe encontra previamente assegurada de acordo com os valores e critérios de referência objetivos, estabelecidos na THPJ. Neste contexto, qualquer sistema de contabilização e remuneração dos serviços de representação ou assistência oficiosa só seria censurável, em face do artigo 208.º da Constituição, se a compensação do mesmo resultante fosse de tal forma exígua ou inapropriada que não pudesse deixar de constituir um desincentivo à livre participação dos advogados no sistema de acesso ao direito, pondo em causa a essencialidade do patrocínio forense no âmbito da plena efetivação do direito à tutela jurisdicional efetiva. Ora, para além de nenhum dado apontar nesse sentido, o diferencial em que se baseia a tese susten- tada pela recorrente não é, conforme adiante melhor se verá, significativo ao ponto de, no confronto com a solução alternativa defendida, comprometer a imprescindibilidade da função que os advogados são chama- dos a desempenhar no âmbito da administração da justiça, quando a ela pretendam aceder os cidadãos economicamente mais carenciados. 19. O terceiro e último plano em que é posta em causa a conformidade constitucional da norma sindicada assenta na invocação de um conjunto de «princípios e subprincípios» extraídos do princípio do Estado de Direito, consagrado no artigo 2.º da Constituição – mais concretamente os subprincípios «do Estado Constitucional ou da constitucionalidade» (artigo 3.º, n.º 3), «da independência dos Tribunais e do acesso à justiça» (artigos 20.º e 205.º e seguintess), «da prevalência da lei», «da segurança jurídica e da con- fiança dos cidadãos» e, por último, «das garantias processuais e procedimentais ou do justo procedimento» (artigo 20.º, n.º 4). Considerado o teor das alegações produzidas, não é fácil perceber com que base ou em que medida poderá cada uma das normas paramétricas invocadas obstar à possibilidade de acolhimento de um critério

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