TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 104.º volume \ 2019

312 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL O que o princípio proíbe é que se pague de maneira diferente a trabalhadores que prestam o mesmo tipo de trabalho, têm iguais habilitações e o mesmo tempo de serviço. O que, pois, se proíbe são as discriminações, as distinções sem fundamento material, designadamente porque assentes em meras categorias subjetivas. Se as diferenças de remuneração assentaram em critérios objetivos, então elas são materialmente fundadas, e não discriminatórias.» Não são, pois, consideradas censuráveis à luz da Constituição todas as medidas que estabeleçam diferencia- ções remuneratórias (ou que se abstenham de as estabelecer, estando em causa trabalho de valor aparentemente diferente), mas apenas aquelas que se revelem arbitrárias ou desprovidas de suficiente fundamento material (mais recentemente, vide, entre outros, os Acórdãos n. os 157/18, 131/18, 828/17, 339/17, 248/16, 364/15, 46/15, 421/14, 239/13, 215/13, 129/13, 378/12 e 365/11). Sendo comummente admitidos, como crité- rios objetivos adequados para justificar diferenciações remuneratórias entre trabalhadores que exercem funções substancialmente idênticas, não apenas as qualificações ou habilitações detidas ou exigíveis; como também a antiguidade ou tempo de serviço detido pelos trabalhadores (cfr., entre outros, os Acórdãos n. os  338/17, 239/13, 215/13, 107/11 e 323/05). «Com efeito», como se afirmou no Acórdão n.º 239/13, «sendo o tempo de serviço, por regra, um fator potenciador de maior conhecimento prático e maior capacidade de desempenho profissio- nal, ele poderá ser mais ou menos valorizado, mas não poderá obviamente ser por si só negativamente valorado em termos de prestação de trabalho e, consequentemente, de remuneração.» A jurisprudência constitucional dá, aliás, testemunho da relevância que o tempo de serviço prestado pelos trabalhadores em determinada carreira ou categoria pode assumir como fator de diferenciação, sendo um dos critérios mais frequentemente invocados nos arestos em que o Tribunal se pronunciou pela violação do princípio da igualdade retributiva. Em especial, têm-se presentes os acórdãos que versaram sobre medidas legislativas adotadas em matéria de progressão ou reestruturação de carreiras, de que resultavam situações de desvantagem relativa (as comummente designadas ultrapassagens), em prejuízo dos trabalhadores com mais tempo de serviço na carreira ou categoria (vide os Acórdãos n. os  317/13 e 323/05 e os numerosos arestos aí citados; bem como o Acórdão n.º 364/15). Mas, já não se encontra testemunho, na jurisprudência deste Tribunal, da existência de um dever de diferenciação dos trabalhadores em função das respetivas habilitações ou qualificações (vide, a este respeito, o Acordão n.º 107/11 e Jorge Miranda/Rui Medeiros, Constituição da República Portuguesa Anotada – Vol. I., 2.ª edição revista, Lisboa, 2017, pp. 835 e 836). Pelo contrário, à afirmação em abstrato de deveres de diferenciação retributiva opõe-se a liberdade de conformação legislativa que constantemente tem sido reco- nhecida e que «o princípio da igualdade, enquanto proibição do arbítrio e da discriminação, não elimina (…), pois é ao legislador que compete definir ou qualificar as situações de facto ou as relações da vida que hão de funcionar como elementos de referência a tratar igual ou desigualmente.» (Acórdão n.º 248/16 – e, no mesmo sentido, os Acórdãos n. os 131/18, 421/14, 129/13, 12/12 e 107/11, entre outros). Refira-se, por último, que a atenção a esse espaço reservado ao legislador na conformação do direito à retribuição é devida, com maior intensidade, quando em causa está a adoção de disposições inovatórias em matéria remuneratória, já que, como se reafirmou no Acórdão n.º 364/15, «a mera diferença de direitos resultantes da sucessão de regimes legais do tempo não convoca a dimensão de censura assacável ao princípio da igualdade. Deste parâmetro apenas resulta a proibição de tratamentos diferenciados sincrónicos e não diacrónicos, sob pena de inadmissível cerceamento da liberdade de conformação do legislador, enquanto espaço autónomo do poder legislativo configurado pela própria Constituição.»

RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=