TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 104.º volume \ 2019

307 acórdão n.º 49/19 3. Esta interpretação é inconstitucional por violação expressa do disposto no art.º 13.º, 59.º, n.º 1, alínea), ambos da CRP; 4. Da interpretação fixada resulta (a ser aplicada) uma dupla descriminação dos trabalhadores de Ação Médica pois que faz colocar trabalhadores com qualificações inferiores e funções com menor grau de exigência a auferir salários iguais aos colegas que efetivamente têm qualificações e exercem as funções de especialistas e, por outro lado, leva a que trabalhadores com as mesmas funções vejam os seus colegas única e exclusivamente por força desta interpretação a auferir salários superiores aos seus; 5. Desigualdades salariais injustificadas, decorrentes tão só de uma interpretação de um normativo, que inter- pretado de tal modo é inconstitucional; 6. Não existem razões materialmente fundadas para a descriminação e diferenciação de tratamento de trabalha- dores com qualificações iguais e funções iguais; 7. Repare-se que a supressão das ditas categorias profissionais e a sua integração na categoria de auxiliar da ação médica deveria levar a que os trabalhadores fossem enquadrados nos mesmos patamares em que se encontravam. A ser assim, para a interpretação da presente cláusula ter-se-ia que analisar a convenção coletiva anterior e perceber os níveis das carreiras ora integradas para posteriormente se reclassificarem corretamente os trabalhadores. 8. Não foi esta situação que ocorreu, o que ocorre com a interpretação fixada é a atribuição de uma categoria de especialista (grau máximo e a qual tem na génese o exercício de funções especificas as quais exigem conhecimentos técnicos mais profundos e especializados), a quem não tem competência para o efeito, criando assim trabalhadores com categoria de nome e esvaziados das suas funções próprias. Levando a que os efetivos especialistas recebem igual salário aos seus colegas que não tem competência para o efeito mas que decorrente de uma reclassificação viram-se colocados numa situação que os descrimina e leva a que detenham uma categoria que não corresponde às suas funções. 9. O princípio a trabalho igual salário igual encontra expressão a nível constitucional, mais propriamente no Art.º 59.º/1-a) que estabelece que todos os trabalhadores têm direito à retribuição do trabalho segundo a quanti- dade, natureza e qualidade, observando-se o princípio de que para trabalho igual salário igual, de forma a garantir uma existência condigna. Como se sabe este princípio é uma das expressões do princípio da igualdade de trata- mento, também constitucionalmente protegido (Art.º 13.º), e veio a ser acolhido ao nível das leis laborais, e muito concretamente, no que por ora releva, no Art.º 270.º do atual CT (263.º do precedente). 10. Ensina Monteiro Fernandes que o sentido geral do princípio assenta em que “uma idêntica remuneração deve ser correspondida a dois trabalhadores que, na mesma organização (ou seja, sob as ordens de uma mesma enti- dade empregadora) ocupem postos de trabalho iguais, isto é, desempenhem tarefas qualitativamente coincidentes, em idêntica quantidade (duração)” ( Direito do Trabalho , 12.ª Ed., Almedina, 446). 11.Assim, a base do princípio reside na identidade de natureza da atividade e na igualdade do tempo de traba- lho. Nunca no regime legal sob o qual os trabalhadores exercem funções. O que significa, no caso sub-judice, que a interpretação veiculada faça com que, apenas e tão só por decorrência da convenção coletiva aplicável, a recor- rente tenha que aplicar aos seus trabalhadores salários iguais para situações manifestamente diferentes, resultando que pela mesma atividade uns estejam a receber um valor e outros outro valor pese embora estejamos exatamente perante trabalhadores que exercem as mesmas funções em termos de identidade e tempo de trabalho. Descrimina- ção imposta por uma interpretação dada à convenção coletiva que, apenas se irá acentuar com o tempo pois que, os trabalhadores que não foram reclassificados por uma razão de lhes faltar tempo de antiguidade (segundo o alegado critério) verem-se agora impossibilitados de alguma vez aceder à mesma categoria que os seus pares que por via da reclassificação e tendo em conta a interpretação assim dada acabara por a obter. 12. A única exceção que se admite ao princípio da igualdade é se, porém, a identidade de funções possa não corresponder a trabalho igual, se houver como ponderar fatores que influam no rendimento individual, como por exemplo o maior rendimento de um trabalhador, a maior perfeição na execução das tarefas, o maior grau de autonomiza na execução – o que aqui não está em causa pois que, estão isso sim em causa tarefas especializadas que os trabalhadores reclassificadas não podem exercer (como as mesmas reconhecem) por falta de competência).

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