TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 104.º volume \ 2019
30 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL No Acórdão n.º 728/17, entendeu-se que a norma, na parte em que consagra o princípio do efeito devo- lutivo da impugnação judicial e condiciona a obtenção de efeito suspensivo do recurso, constitui lei restritiva de direitos, liberdades e garantias, nomeadamente, do princípio da presunção de inocência, consagrado no n.º 2 do artigo 32.º da Constituição, e aplicável, por força do n.º 10 do mesmo preceito da Lei Fundamental, em matéria contraordenacional. Assim sendo, constando a norma restritiva de um Decreto-Lei emitido pelo Governo sem para tal estar autorizado, considerou-se violada a reserva legislativa da Assembleia da República prevista na alínea b) do n.º 1 do artigo 165.º da Constituição, parâmetro constitucional que fundou o julga- mento de inconstitucionalidade orgânica que versou, sem distinção, todos os sentidos normativos contidos no n.º 5 do artigo 67.º dos Estatutos da ERS. A mesma fundamentação e juízo encontra-se nas Decisões Sumárias n. os 869/17 e 150/18. Por seu turno, nos Acórdãos n. os 335/18, 336/18 e 363/18 – que versaram a norma com a formulação indicada pelo requerente – assim como no Acórdão n.º 394/18 – que, como se disse supra , apreciou uma dimensão normativa mais ampla – o juízo de inconstitucionalidade orgânica fundou-se igualmente na vio- lação do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 165.º, em conjugação com os n. os 2 e 10 do artigo 32.º da Constituição, e também na violação do disposto na alínea d) do n.º 1 do artigo 165.º da Lei Fundamental. No mesmo sentido decidiram igualmente, com remissão para a jurisprudência atrás referida, os Acórdãos n. os 468/18, 467/18 e 554/18, assim como as Decisões Sumárias n. os 638/18, 748/18, 756/18 e 898/18. Vejamos, então, cada um dos parâmetros constitucionais mobilizados nas decisões referidas. 10. O princípio da presunção da inocência consta do artigo 32.º, n.º 2, da Constituição, sendo assegu- rado, por via do n.º 10 do mesmo artigo, no domínio sancionatório contraordenacional. Assim vem sendo afirmado pelo Tribunal, mormente no Acórdão n.º 674/16: «O Tribunal Constitucional tem afirmado reiteradamente que não existe um paralelismo automático entre os institutos e regimes próprios do processo penal e do processo contraordenacional, não sendo, por conseguinte, diretamente aplicáveis a este todos os princípios constitucionais próprios do processo criminal. Como ainda recentemente se afirmou no Acórdão n.º 373/15, no ponto 1 da Fundamentação, o «conteúdo das garantias processuais é diferenciado, consoante o domínio do direito punitivo em que se situe a aplicação (...) no âmbito contraordenacional, atendendo à diferente natureza do ilícito de mera ordenação e à sua menor resso- nância ética, em comparação com o ilícito criminal, é menor o peso do regime garantístico, pelo que as garantias constitucionais previstas para os ilícitos de natureza criminal não são necessariamente aplicáveis aos ilícitos con- traordenacionais ou a outros ilícitos no âmbito de direito sancionatório (cfr., neste sentido, entre muitos outros, os Acórdãos n. os 158/92, 50/99, 33/02, 659/06, 99/09 e 135/09)». De outro lado, o Tribunal tem também sublinhado que a inexigibilidade de estrita equiparação entre processo contraordenacional e processo criminal não invalida «a necessidade de serem observados deter- minados princípios comuns que o legislador contraordenacional será chamado a concretizar dentro de um poder de conformação mais aberto do que aquele que lhe caberá em matérias de processo penal» (Acórdão n.º 469/97, ponto 5, retomado no Acórdão n.º 278/99, ponto II.2.). 11. O princípio da presunção de inocência pertence àquela classe de princípios materiais do processo penal que, enquanto constitutivos do Estado de direito democrático, são extensíveis ao direito sancionatório público. Sendo expressão do direito individual das garantias de defesa e de audiência, este princípio encon- tra, pois, aplicação também no processo contraordenacional, como decorre dos n. os 2 e 10 do artigo 32.º da Constituição. Nestes termos, no processo contraordenacional, como em qualquer outro processo sancionatório, o arguido presume-se inocente até se tornar definitiva a decisão sancionatória contra si proferida, o que, neste
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