TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 104.º volume \ 2019
294 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL 4. Assim as condutas tipificadas terão de ser idóneas a provocar fraude fiscal sendo que a expressão “visem” significa que as condutas terão de ser “adequadas” 5. As condutas previstas no artigo 103.º do RGIT terão de ser operadas de forma idónea a originarem a não liquidação, entrega ou pagamento de prestação tributaria ou obtenção indevida de benefícios fiscais ou outras vantagens suscetíveis de causarem diminuição das receitas. O dolo do tipo tem pois de incidir sobra a idoneidade. 6. Sendo as condições de punibilidade externas ao ilícito, futuras e incertas não dependendo da vontade do agente, sendo pois as circunstâncias que se encontram em relação imediata com o facto mas que não pertencem nem ao tipo de ilícito nem à culpabilidade, o consagrado no artigo 103 n.º 2 não poderá ser dogmaticamente classificado como tal mas sim como elemento do tipo. 7. Sendo a situação tributária de um sujeito passivo apurada com base em normas tributárias que, em regra, na sua aplicação, recorrem aos dados e informações fornecidas pelo próprio contribuinte quando o agente pratica dolosamente o comportamento proibido, tem maneira de saber a quanto a sua vantagem patrimonial ilegítima poderá ascender. 8. O resultado idóneo não inferior a € 15 000 não é alheio ao domínio individual do agente, pelo que não constitui uma condição (um facto futuro e incerto) nem é objetiva, dado que não resulta plenamente alheio à von- tade do autor já que no crime de fraude fiscal, com recurso a faturas falsas, o agente tem controlo absoluto sobre o valor indevidamente deduzido em sede de IVA na medida em que quando incorpora a fatura sabe qual o valor de IVA constante da mesma e consequentemente o valor que irá deduzir indevidamente e quando procede à entrega da DP (declaração periódica) o agente sabe qual o montante de IVA dedutível que fez constar daquela declaração. 9. A vantagem patrimonial ilegítima de € 15.000 tem pois de estar compreendida no dolo do agente. 10. Consagrando o n.º 3 do artigo 103.º do RGIT que Para efeitos do disposto nos números anteriores, os valores a considerar são os que, nos termos da legislação aplicável, devam constar de cada declaração a apresentar à administração tributária, estamos perante uma norma penal em branco verificando-se um procedimento de reenvio para legislação tributária. 11. A problemática das normais penais em branco é discutida tendo por base o conflito com o princípio da legalidade (problemáticas inerentes a questões de reserva de lei) e de emanações daquele como, por exemplo, o princípio da tipicidade. (a lei penal tem obrigatoriamente de ser certa, precisa e determinável sendo percetível pelos seus destinatários.) 12. O princípio da legalidade penal é um liminar mínimo de exigência do direito penal que se expressa pela formulação latina nullum crimen nulla poena sine lege , (a este respeito ver artigo 29 n.º 1 da CRP) sendo que pre- cisa descrição escrita das normas constitui uma exigência do direito penal na medida em que surge como garantia elementar de liberdade. A lei é portanto a única fonte formal de produção de direito penal. 13. Assim, sendo este principio uma garantia fundamental dos cidadãos é exigível que exista uma lei escrita anterior ao facto e que nessa se descreva um facto determinado assistindo-se neste âmbito a uma ligação entre o princípio da legalidade e a tipicidade da lei penal. É pois imperiosa a predeterminação normativa. 14. Se a norma punitiva é incapaz de precisar limpidamente o que é ou não objetivo da punição ela transmuta- -se numa norma inconstitucional. A norma penal terá pois de conter um si mesma determinação suficiente para não colocar em causa o princípio da legalidade tendo de ser concretas, precisas e inteligíveis. 15. Ora, através da técnica das normais penais em branco o legislador tipifica crimes cujas situações de facto são diferiras para outras normas através de remissões o que poderá colocar em causa a sua legitimidade constitucional. 16. Sendo as normas penais em branco normas que necessitam de complemento e que tal complemento há de surgir em disposições externas que originarão uma formulação acabada viola-se o artigo 29 da CRP quando a remissão que o tipo faz para legislação tributária origina uma indefinição dos elementos objetivos da incriminação não sendo os mesmos apreendidos de forma clara pela comunidade sendo tal materialmente inconstitucional. 17. A remissão operada pelo artigo 103 n.º 3 do RGIT não é compatível com o principio da legalidade já que a lei penal por si só não permite conhecer aquilo que é proibido já que só pela leitura do CIVA e pela determinação do regime de IVA aplicável ao agente é que poderemos apreender a conduta proibida.
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