TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 104.º volume \ 2019
284 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL A vertente negativa do direito à proteção da saúde interliga-se assim com outros princípios e direitos fundamentais, tais como o princípio da dignidade da pessoa humana, o direito à vida e o direito à integri- dade pessoal (neste sentido, Rui Medeiros, in Jorge Miranda/Rui Medeiros, Constituição Portuguesa Anotada , Tomo I, p. 653). Admitindo-se esta conexão, pode considerar-se que o bem jurídico protegido pelas normas do artigo 15.º n.º 2, e 30.º n.º 1, alínea e), da Lei n.º 37/2007, de 14 de agosto «situa-se numa zona de sobreposição do direito à saúde com o direito à integridade física» (Acórdão n.º 423/08). De resto, foi o que o Estado Português reconheceu quando aderiu à Convenção Quadro da Organização Mundial de Saúde para o Controlo do Tabaco, adotada em Genebra em 21 de maio de 2003, onde, de forma inequívoca, se considerou estar cientificamente comprovado que a exposição ao fumo do tabaco “provoca doenças, incapacidades e morte” (artigo 8.º da referida Convenção Quadro, o qual vigora na ordem jurídica portuguesa, por força do n.º 2 do artigo 8.º da CRP). Daqui decorre que as partes contratantes dessa Con- venção Quadro – incluindo Portugal – reconhecem que o tabaco é causa direta de doenças, incapacidade e morte, pelo que o bem jurídico protegido pelas normas que visam evitar os malefícios do tabaco não pode deixar de ser, para além da saúde, também a integridade física das pessoas. 11. Tendo em vista o objetivo da proteção da saúde e integridade física dos menores, não se afigura, desde logo, inadequado sancionar a pessoa coletiva com uma coima pela omissão do dever de afixar no local de venda o aviso de proibição de venda a menores. Independentemente do seu montante, não se poderá ajuizar em abstrato que não seja um meio capaz de alcançar aqueles objetivos. Pelo contrário, quanto maior for o quantum de coima maior será a eficácia na proteção dos bens jurídicos por ela visados. De igual modo, não se levanta qualquer questão da necessidade da coima para atingir aqueles fins. Como o juízo de indispensabilidade implica uma ponderação de soluções alternativas, mas não impõe neces- sariamente uma delas, será difícil sustentar que uma coima de menor montante, além de menos lesiva, tem eficácia em medida idêntica a outra de maior montante. O facto de se concluir que determinada sanção contraordenacional teria sido menos onerosa do que a prevista na alínea e) do n.º 1 do artigo 25.º (coima) e n.º 2 do artigo 26.º da Lei n.º 37/2007 (sanção acessória) não exclui a possibilidade da existência de outras ainda porventura mais apropriadas. Ora, reconhecendo-se ao legislador uma ampla margem de liberdade quanto aos montantes das coimas a aplicar, não é evidente que a sanção prevista naqueles preceitos não seja necessária para obter os fins que se propõe realizar ou que existem outras com o mesmo grau de eficácia que se mostrem menos lesivas. Já não goza da mesma margem de liberdade para fixar limites idênticos ou superiores relativamente a contraordenações de menor gravidade, no âmbito do mesmo domínio contraordenacional. Com efeito, a coima que o legislador fixa para um determinado escalão pode ser decisiva, já que a partir daí torna-se pos- sível a comparação, ficando o legislador vinculado a efetuar aquilo a que se pode chamar um «juízo de pere- quação» (José de Faria Costa, Direito Penal Especial. Contributo a uma sistematização dos problemas “especiais” da Parte Especial, Coimbra Editora, 2004, p. 57). Como já se referiu, numa determinada escala de gravidade, as sanções mais graves devem ser aplicadas às contraordenações mais graves, as menos graves às contraorde- nações mais leves, valendo o mesmo critério para os escalões intermédios de gravidade. Daí que o legislador, ao definir aos montantes das coimas, não possa deixar de ponderar a gravidade da infração: quanto mais intensa for a agressão aos bens, interesses ou valores prosseguidos pela proibição tanto mais intensa deverá ser a sanção contraordenacional; e inversamente, quanto menor for peso da infração, tanto mais cuidado merecerá a fixação dos limites da coima. 12. Assim sendo, pode questionar-se se o limite mínimo de € 30 000, reduzido a metade nas infra- ções negligentes, aplicável à omissão do dever de afixação do dístico informativo da proibição de venda de tabaco a menores não pecará por excesso. Desde logo, porque a gravidade deste ilícito não é equiparável à gravidade das demais contraordenações cobertas pela mesma moldura de coima; depois, porque a sanção
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