TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 104.º volume \ 2019

237 acórdão n.º 25/19 aplicado após a cessação do segredo interno e quando há uma vontade justificada e expressa do arguido, formulada antes do trânsito em julgado da decisão de destruição, no sentido de ter acesso aos produtos de certas interceções telefónicas. 47. Não se pretende a afirmação de um princípio de contraditório pleno e irrestrito a favor do arguido. Até se pode admitir, como resulta da fundamentação do acórdão n.º 70/2008 que, numa fase preliminar, se justifique o regime adoptado a fim de não tolher a iniciativa de averiguação do Ministério Público. Coisa diferente é quando já não há segredo interno, tendo os arguidos acesso aos autos e há a manifestação de uma vontade, devidamente justificada, no sentido de aceder aos produtos de certas interceções telefónicas. 48. Nessa fase – após a cessação do segredo interno –, afigura-se como desproporcionado continuar a investir a autoridade judiciária no poder de ouvir tudo e escolher a seu bel-prazer, podendo inclusive fazer o seu próprio juízo de relevância e apresentá-lo ao juiz de instrução; isto, enquanto o arguido – mesmo no quadro supra referido – apenas tem acesso a um conjunto eventualmente truncado e selecionado de produtos das escutas, sem que, em qualquer caso, possa ajuizar sobre o que é relevante do seu próprio ponto de vista, o qual é evidentemente o único relevante para as garantias de defesa do arguido (e não o do juiz de instrução, e muito menos o do MP ... ). 49. Por outro lado, é também claro que, no presente caso, não estão em causa elementos “manifestamente estranhos ao processo”, do ponto de vista da estratégia de defesa do arguido, como acontecia na situação fáctica subjacente ao acórdão n.º 293/2008, também citado na decisão sumária. 50. In casu , não está em discussão o mero não conhecimento das escutas pelo arguido somado a um juízo de não relevância destas pelo juiz de instrução. Na dimensão normativa em causa – impugnada no RAI, na Contes- tação, no Recurso para o T.R.P. e no recurso para o T.C. –, invocou-se, como diferença com relevância substancial em relação às já apreciadas, o facto de a destruição das escutas ocorrer “depois da cessação do segredo interno e contra a vontade expressa de arguido que tenha manifestado interesse em examiná-las antes do trânsito em julgado da decisão de destruição»”. Esta é uma diferença com relevância substancial, mesmo para quem mantenha a adesão à linha dos acórdãos n. os 70/2008 e 293/2008. 51. Bem sabemos que há um clamor mediático para que sejam presos arguidos poderosos – categoria em que muitos julgam poder incluir o ora Recorrente –, mas isso não pode servir para ultrapassar o caminho legal na apre- ciação do recurso de inconstitucionalidade em apreço. 52. A questão em pauta não é nem simples nem está coberta por jurisprudência pretérita do Tribunal Consti- tucional. 53. Deve dar-se por isso oportunidade ao Recorrente de formular alegações, debatendo mais profundamente a inconstitucionalidade suscitada, razão pela qual deve ser revogado o segmento da decisão sumária que assim não julgou, determinando-se a produção de alegações e deferindo-se, a final, o pedido de declaração de inconstitucio- nalidade suscitado no n.º 53 do requerimento de interposição de recurso. 54. É chocante que se considere como simples e arrumada uma questão tão controversa, a qual, de resto, o ora Recorrente já colocou em participação apresentada ao Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, em 11 de outubro de 2017, a qual foi admitida e está a ser tramitada sob o n.º 74017/17. Termos em que deve ser revogada a decisão sumária no que diz respeito às primeira, segunda e terceira questões suscitadas, as quais devem ser admitidas, com as legais consequências. Requer a emissão de guias para o pagamento da multa prevista no art. 139.º, n.º 5 do C.P.C. (3.º dia).» 5. Notificados os recorridos do teor do requerimento de arguição de nulidade (de fls. 4074-4076) da Decisão Sumária n.º 635/18 e do teor da reclamação para a conferência dessa mesma Decisão Sumária (apre- sentados pelo recorrente, ora reclamante), para, querendo, responderem no prazo de dez dias, decorrido o prazo, apenas o representante do Ministério Público neste Tribunal se pronunciou (cfr. cota de fls. 4156). 5.1. O representante do Ministério Público neste Tribunal, quanto ao teor do requerimento de arguição de nulidade (junto a fls. 4074 a 4076 e supra transcrito em I, 3), veio dizer o seguinte (cfr. 4144-4145):

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