TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 104.º volume \ 2019

228 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL direitos de defesa do arguido e os direitos de pessoas escutadas e afetadas nos seus direitos fundamentais com tais escutas, e que nesse juízo de ponderação possa considerar que estes devem prevalecer em absoluto, por estarmos perante conversas sem qualquer interesse para a investigação em apreço (verdadeiramente, nem che- gará a haver conflito nestes casos). Esse juízo é feito sem audição do arguido precisamente porque essa audição viria frustrar a salvaguarda que se pretende acautelar: com o acesso do arguido aos produtos das escutas já esta- ria consumada a devassa que a destruição pretende evitar (sendo certo que já não se pode evitar a que se já se consumou com uma interceção que se veio a revelar injustificada, quando isso não era inicialmente previsível). O legislador deposita confiança no critério do “juiz das liberdades”, mesmo que a destruição tenha efeitos irre- versíveis (como sucede no caso em apreço). A alternativa seria fazer depender do critério arbitrário do arguido sobre o que possa ser útil à sua defesa a tutela de direitos fundamentais de pessoas afectadas pelas escutas. Este regime, com esta interpretação, é hoje tido por constitucional pela jurisprudência do Tribunal Constitucional entretanto firmada (ver os acórdãos 70/08, 293/08, 300/08, 378/08 e 621/09, citados no douto acórdão recor- rido): E não contraria a jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, como bem se demonstra no douto parecer emitido pelo Ministério Público junto desta instância. Não interessa (nem é possível) saber agora se os direitos de defesa do arguido foram afetados com a decisão do Juiz de Instrução (neste caso o Sr. Presidente do S.T.J.) de destruição dos produtos de escutas telefónicas em apreço. Basta que este tenha considerado que isso não se verificava, e tenha ordenado essa destruição, para salvaguarda de direitos das pessoas alvo de tais escutas, com a legitimidade que lhe confere o disposto no artigo 188 n.º 6, do CPP. O arguido ora recorrente parece não contestar agora, na motivação do recurso, a linha da mencionada jurisprudência do Tribunal Constitucional, ao contrário do que sustentou na contestação e que é sustentado no douto parecer de Paulo Pinto de Albuquerque que então juntou aos autos (na linha do que este também sustenta em Comentário ao Código de Processo Penal, Universidade Católica Editora, 3.ª edição, 2008, anotação 9 ao artigo 188.º, pgs. 517 e 518). Alega, porém, que a tese dessa jurisprudência constitucional não cobre uma situação como a que está em apreço, seja porque ele desde o início da sua intervenção no processo afirmou o seu interesse no exame do produto das escutas em apreço, seja porque no momento da destruição em causa já no processo havia cessado a fase do segredo interno. No entanto, como já vimos e pelas razões que indicámos, a circunstância de o arguido afirmar o seu inte- resse no exame das escutas desde o início da sua intervenção no processo não faz com que essa sua invocação leve a que essa sua intenção se sobreponha ao juízo do juiz de instrução de prevalência dos direitos das pessoas afectadas pelas escutas, prevalência que justifica a destruição destes sem esse exame prévio pelo arguido. Por outro lado, a questão não depende da vigência do regime de segredo interno. Os direitos a salvaguardar (das pessoas afetadas pelas escutas) não coincidem com os interesses que tal regime pretende também salvaguar- dar e vão para além da fase em que esse regime vigora.» À prolação de uma decisão simples com base em jurisprudência anterior deste Tribunal não obstará o facto de o recorrente, na dimensão normativa ora sindicada e alegadamente retirada do arco normativo abrangente com- posto pelos artigos 188.º a 190.º do CPP – parecendo distanciar-se, como sublinha o TRP, da sua anterior posição versada na contestação pondo em causa a linha da jurisprudência deste Tribunal a partir do Acórdão n.º 70/08 (cfr. p. 636 do acórdão ora recorrido) – integrar dois segmentos que o recorrente sustenta não estarem abrangidos pela jurisprudência exarada naquele Acórdão n.º 70/08 deste Tribunal: o interesse afirmado pelo recorrente desde o início da sua intervenção no processo no exame das escutas e, ainda, o facto de no momento da destruição em causa já ter cessado no processo a fase do segredo interno. Isto, já que no entendimento do TRP, esta última não se afigura determinante na ponderação da situação dos autos para efeitos de aplicação da norma em causa na decisão ora recorrida, considerando aquele que a aplicação do regime normativo impugnado não depende da vigência do regime de segredo interno.

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