TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 104.º volume \ 2019
218 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL “Deve, contudo, sublinhar-se que o imposto previsto na Verba 28.1, como é próprio dos impostos sobre o património, delimita o seu âmbito de incidência por referência exclusiva à titularidade de determinados valores patrimoniais, «independentemente da função desempenhada por tais ativos (capital produtivo, aplicação de fundos ou poupança ou consumo duradouro)» (Decisão Sumária n.º 214/17). Por outro lado, sendo um imposto sobre o património, também não individualiza nem distingue os respetivos sujeitos passivos por recurso a outro critério que não seja precisamente a titularidade desses valores patrimoniais. Assim, aplica-se indistintamente a pessoas singulares e pessoas coletivas e, dentro desta categoria, a associações, fundações e sociedades comerciais, indepen- dentemente do ramo económico em que estas últimas operem e dos específicos riscos comerciais existentes nos respetivos sectores de atividade, aliás próprios de toda e qualquer atividade comercial. Ora, como vimos, a opção por tal modelo de tributação é constitucionalmente legítima, sendo virtualmente apta, com tal configuração, a prosseguir o programa que a Constituição lhe associa de contribuir para a igualdade entre os cidadãos, não decorrendo da argumentação expendida na decisão sob recurso a demonstração fundada de que efetivamente ocorre «arbitrariedade intolerável» na opção normativa de alargar a incidência do referido imposto aos terrenos para construção. De facto, se é certo que a simples titularidade de terrenos para construção de habitações de valor igual ou superior a € 1 000 000 não permite, só por si, determinar a concreta e completa situação económico-financeira em que se encontra o sujeito passivo do imposto – o que, repete-se, não é constitucionalmente exigível –, também não autoriza juízos extrapolativos sobre o tipo de contribuintes atingidos por tal norma de incidência, o ramo de atividade em que atuam e as vicissitudes conjunturais, nomeadamente de mercado, a que poderão estar sujeitos. Como se referiu, a norma em causa parte da ponderação de concretas situações jurídico-patrimoniais, delimi- tadas em função do valor patrimonial tributário do imóvel e sua afetação social normal, integrando no seu âmbito subjetivo de aplicação um conjunto indeterminado de contribuintes de acordo com um critério uniforme: a titula- ridade de terrenos para construção de edifícios para habitação de elevado valor patrimonial tributário. Em relação a nenhum deles é valorada a sua concreta situação económico-financeira (rendimentos ou lucros), a sua natureza (singular ou coletiva), estrutura de organização (empresarial ou não empresarial), concreta forma jurídica assumida (sociedade comercial ou outra) e, muitos menos, os diversos setores de atividade em que eventualmente atuam os comerciantes abrangidos e os riscos específicos inerentes a cada um desses ramos de atividade. A mera probabilidade estatística de serem atingidos pela norma em questão sociedades comerciais dedicadas à promoção imobiliária, associada à ponderação de varáveis económicas de verificação incerta, como seja o impacto económico do imposto nesse particular ramo de atividade comercial – cujo valor, aliás, não deixará de ser consi- derado como custo da atividade –, não constitui razão suficientemente sólida para suportar um juízo de incons- titucionalidade da norma em causa, na específica hipótese em apreciação, considerando, além do mais, o caráter negativo do controlo constitucional ditado pelo princípio da igualdade». 7. No caso presente, a dimensão normativa impugnada corresponde a esta última, e que já foi apreciada nos Acórdãos n. os 378/18 e 605/18: aplicação da verba 28.1 da TGIS a situações em que os terrenos para construção pertencem a empresas que se dedicam à comercialização de terrenos para revenda. Nesta vertente, em aplicação daquele primeiro Acórdão e respetivos fundamentos – nos seus números 11, 12 e 13 – é de concluir igualmente no sentido da não inconstitucionalidade. Para além de não se vislumbrar que a distinção efetuada na decisão recorrida, atinente ao destino habi- tacional e não habitacional dos terrenos para construção, se mostre desprovida de fundamento racional e exceda a margem de conformação do legislador no domínio fiscal, de acordo com o escopo, estrutura e natu- reza da norma em causa, há que considerar que, tal como o IMI, o imposto do selo sobre os prédios urbanos de elevado valor é um imposto de natureza real, que incide apenas sobre o valor patrimonial tributável de cada prédio individualmente considerado, sem atender à situação social do contribuinte e sem agregar sequer o valor dos prédios de que é titular. Como refere Cardoso da Costa, o imposto real é aquele «que atinge a matéria coletável objetivamente determinada, isto é, abstraindo do condicionalismo económico em que se encontra o obrigado tributário» ( Curso de Direito Fiscal , 2.ª edição, Almedina, 1972, p. 41).
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