TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 104.º volume \ 2019
211 acórdão n.º 22/19 infundada (o que importa é que não se discrimine para discriminar, diz-nos J.C. Vieira de Andrade – Os Direi- tos Fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976 , Coimbra, 1987, p. 299)». WWW. Reforçando «só podem ser censuradas, com fundamento em lesão do princípio da igualdade, as escolhas de regime feitas pelo legislador ordinário naqueles casos em que se prove que dela resultam diferenças de tratamento entre as pessoas que não encontrem justificação em fundamentos razoáveis, perceptíveis ou inte- ligíveis, tendo em conta os fins constitucionais que, com a medida da diferença, se prosseguem”, bem como que “[e]ste princípio, na sua dimensão de proibição do arbítrio, constitui um critério essencialmente nega- tivo (...) que, não eliminando a “liberdade de conformação legislativa” – entendida como a liberdade que ao legislador pertence de “definir ou qualificar as situações de facto ou as relações da vida que hão de funcionar como elementos de referência a tratar igual ou desigualmente” –, comete aos tribunais não a faculdade de se substituírem ao legislador, “ponderando a situação como se estivessem no lugar dele e impondo a sua própria ideia do que seria, no caso, a solução razoável, justa e oportuna (do que seria a solução ideal do caso)”, mas sim a de “afastar aquelas soluções legais de todo o ponto insuscetíveis de se credenciarem racionalmente» in Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 187/13 de 5 de abril. XXX. Ora, tendo em consideração as circunstâncias históricas excecionais que presidiram à elaboração da norma em apreço, e que supra foram descritas, temos que a mesma não ofende qualquer princípio constitucional quando de forma abstrata e geral faz incidir o imposto objetivamente a toda e qualquer «Propriedade, usufruto ou direito de superfície de prédios urbanos cujo valor patrimonial tributário constante da matriz, nos termos do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI), seja igual ou superior a (euro) 1 000 000 – sobre o valor patrimonial tributário utilizado para efeito de IMI: Por prédio habitacional ou por terreno para constru- ção cuja edificação, autorizada ou prevista, seja para habitação, nos termos do disposto no Código do IMI», independentemente da natureza do proprietário, usufrutuário ou superficiário. YYY. Invocam, ainda as Recorridas que a Verba 28.1 TGIS penaliza injustificadamente as empresas que, como a Requerente, quando estas atuam no sector imobiliário. ZZZ. Pois bem, a verba 28.1 da TGIS respeita a uma tributação do património, sem visar especificamente empresas, pois compreende toda a espécie de sujeitos passivos que sejam titulares dos direitos reais enunciados sobre os prédios habitacionais em causa, independentemente de assumirem carácter empresarial ou não, abrangendo, assim, para além de sociedades, fundações, associações, pessoas singulares, em suma toda e qualquer entidade que seja titular de direitos reais sobre prédios urbanos habitacionais de valor patrimonial tributário igual ou superior a € 1000 000. AAAA. Deste modo, julga-se inviável convocar, em atenção ao âmbito de aplicação da norma em apreciação, princí- pios de vocação estritamente empresarial. BBBB. De qualquer modo, não se pode deixar de lembrar o que se disse exemplarmente no acórdão do Tribunal Constitucional n.º 846/2014, de 3.12: «A doutrina e a jurisprudência constitucional têm sido firmes no sen- tido de concluir que o exercício, por parte do Estado, do poder de tributar não pode ser concebido como uma afetação ou restrição de direitos fundamentais, face à qual seja legítimo invocar o regime dos requisitos ou exigências que valem, constitucionalmente, para as leis restritivas de direitos, liberdades e garantias. Isto mes- mo decorre, desde logo, da existência da (impropriamente) chamada «constituição fiscal», na qual se definem as garantias dos contribuintes, os princípios formais e materiais que conformam o conceito constitucional de imposto, e a configuração deste último não como afetação de um direito mas antes como obrigação pública de todos os cidadãos, quando constituída nos termos do artigo 103.º da CRP». CCCC. Na verdade, a Constituição exige que se realize uma articulação e ponderação entre direitos fundamentais reconhecidos e bens ou interesses constitucionalmente protegidos, o que implica que o conteúdo e os limites desses direitos sejam determinados em atenção àqueles bens protegidos. Ora, é manifesto que entre os interes- ses claramente protegidos pela Constituição se encontra a cobrança dos impostos em ordem à satisfação das necessidades públicas (cfr. art.º 103.º, n.º 1 da CRP), pelo que o dever de contribuir para os gastos públicos por via dos impostos é um limite imanente aos direitos de propriedade e de liberdade de iniciativa económica.
Made with FlippingBook
RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=