TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 104.º volume \ 2019

20 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Assim, o n.º 1 do artigo 33.º da referida Portaria prevê a «reclamação da nota justificativa», a apresentar no prazo de 10 dias, após notificação à contraparte, a decidir pelo juiz em igual prazo. Caso o valor da nota seja superior a 50 UC, a decisão proferida admite recurso em um grau (n.º 2), determinando-se ainda, no n.º 3, a aplicação subsidiária das normas relativas à reclamação da conta, constantes do artigo 31.º do RCP. Este o enquadramento da norma em exame, na estatuição de que «a reclamação da nota justificativa está sujeita ao depósito de 50% do valor da nota», solução normativa que vigorou até à edição da Portaria n.º 82/2012, de 29 de março, a qual alterou a redação do n.º 2 do artigo 33.º da Portaria n.º 419-A/2009, elevando a exigência para a integralidade do valor de custas de parte peticionado, por via da sujeição da rec- lamação «ao depósito da totalidade do valor da nota». 7. A referida solução normativa, na dimensão de sujeição da impugnação da reclamação da nota jus- tificativa à condição do depósito da totalidade das custas de parte, imposta pela Portaria n.º 82/2012, foi apreciada pelo Tribunal que, através do Acórdão n.º 189/16, reafirmado pelo Acórdão n.º 653/16, bem como pelas Decisões Sumárias n. os 806/16, 16/17 e 17/17, proferiu julgamentos positivos de inconstitucio- nalidade, por vício orgânico-formal. Essa orientação jurisprudencial uniforme culminou, no âmbito de processo de fiscalização abstrata sucessiva, organizado ao abrigo do artigo 82.º da LTC, na prolação do Acórdão n.º 280/17, que decidiu declarar inconstitucional, com força obrigatória geral, a norma que determina que a reclamação da nota jus- tificativa está sujeita ao depósito da totalidade do valor da nota, constante do n.º 2, do artigo 33.º da Portaria n.º 419-A/2009, de 17 de abril, na redação dada pela Portaria n.º 82/2012, de 29 de março, por violação da reserva de competência legislativa da Assembleia da República, constante do artigo 165.º, n.º 1, alínea b) , em conjugação com o n.º 1 do artigo 20.º, ambos da Constituição da República Portuguesa. 8. No Acórdão n.º 280/17, o Tribunal entendeu que a norma, consagrada em regulamento administra- tivo – uma Portaria –, pelo seu conteúdo normativo, não podia revestir tal forma, encontrando-se a matéria regulada inscrita na reserva constitucional de ato legislativo da Assembleia da República contida, nome- adamente, nos artigos 164.º e 165.º da Constituição. Para o efeito, reafirmou os fundamentos exarados no Acórdão n.º 189/16, nestes termos: «[I]mporta sublinhar que a específica imposição de condições à possibilidade de reclamação de questões ati- nentes a custas judiciais, como é o caso das custas de parte, afeta, sem dúvida, o direito fundamental de acesso ao direito e à tutela jurisdicional efetiva, consagrado no artigo 20.º, n.º 1, da CRP, tendo sido configurada como uma restrição por este Tribunal nos acima referidos Acórdãos n.º 347/09 e n.º 678/14. (…) 7. Possuindo, como vimos, a matéria respeitante à reclamação da nota justificativa das custas de parte uma natureza restritiva de um direito fundamental – o direito de acesso à justiça e à tutela jurisdicional efetiva – importa notar que tanto a doutrina (cfr., por todos, Jorge Miranda / Rui Medeiros, Constituição Portuguesa Anotada , vol. I, 2.ª edição, Wolters Kluwer, Coimbra Editora, 2010, p. 304) bem como a jurisprudência deste Tribunal têm considerado este direito como análogo a um direito, liberdade e garantia (cfr. Acórdão n.º 237/90 de 3 de julho de 1990, disponível em  http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos ) e que é igualmente pacífico que o regime jurídico material e orgânico dos direitos, liberdades e garantias se deve aplicar ao direito de acesso à justiça (ainda que este mesmo consenso não se verifique em relação a todos os direitos análogos: cfr. Jorge Miranda / Rui Medei- ros, op. cit. , p. 308). Partindo destes pressupostos, a matéria em causa deve ser regulada por lei da Assembleia da República ou por decreto-lei autorizado, por força do artigo 165.º, n.º 1, alínea  b) , da CRP, e, além disso, ainda deve respeitar a reserva de lei, constante do artigo 18.º, n.º 2, da CRP. Vejamos:

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