TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 104.º volume \ 2019

198 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL perseguição criminal, que o Estado proceda à regulamentação da prescrição – incluindo o regime de interrupção e suspensão dos prazos prescricionais – de uma forma precisa e concreta, obviando a situações em que se opere, na prática, a ineficácia do instituto da prescrição». 8. Por outro lado, uma recensão da jurisprudência do Tribunal Constitucional acerca dos prazos de prescrição fixados pelo legislador em específicos domínios contraordenacionais conduz à conclusão de que o legislador também não está sujeito a especiais constrangimentos decorrentes do princípio da igualdade na definição dos concretos prazos de prescrição que entenda deverem aplicar-se aos vários ilícitos previstos no ordenamento jurídico. Desde que os defina da maneira «precisa e concreta» acima indicada, o legislador tem liberdade para associar prazos de prescrição de duração distinta a ilícitos materialmente distintos, mesmo que punidos com coimas de montante idêntico. Pode o legislador entender que certos domínios de atividade, pelas suas especificidades, justificam que o Estado preserve aí as suas prerrogativas sancionatórias durante períodos mais longos do que noutros domínios. Assim, por exemplo, decidiu-se já que não é inconstitucional a norma constante do artigo 35.º, n.º 1, do Código de Processo Tributário, que fixava um prazo fixo de 5 (cinco) anos para a prescrição do procedimento por contraordenações fiscais, quando o regime geral, na redação que à data vigorava, previa prazos de (1) um e 2 (dois) anos, consoante o montante da coima aplicável – vide os Acórdãos n. os  302/97, 303/97, 213/98,  251/98 e 355/98. No primeiro de tais arestos afirmou o Tribunal, cabalmente, que: «7.1. É sabido que o princípio constitucional da igualdade, entendido como limite objetivo da discricionarie- dade legislativa, não veda à lei a realização de distinções. Proíbe-lhe, antes, a adoção de medidas que estabeleçam distinções discriminatórias – desde logo, diferenciações de tratamento fundadas em categorias meramente subje- tivas, como são as indicadas, exemplificativamente, no n.º 2 do artigo 13.º da Lei Fundamental (diferenciações baseadas na ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, ins- trução, situação económica ou condição social) –, ou seja, desigualdades de tratamento materialmente infundadas, sem qualquer fundamento razoável ( vernünftiger Grund ) ou sem qualquer justificação objetiva e racional. Numa expressão sintética, o princípio da igualdade, enquanto princípio vinculativo da lei, traduz‑se na ideia geral de proibição do arbítrio ( Willkürverbot ). Cfr., por todos, os Acórdãos do Tribunal Constitucional n. os 186/90, 187/90 e 188/90, publicados no Diário da República , II Série, de 12 de setembro de 1990. 7.2. Ora, a esta luz, não vê o Tribunal como possa considerar‑se que a norma do artigo 35.º, n.º 1, do Código de Processo Tributário, ao estabelecer um prazo prescricional para as contra‑ordenações fiscais mais longo do que o estatuído para as contra‑ordenações em geral, encerra uma desigualdade de tratamento arbitrária, sem funda- mento razoável ou material bastante dos arguidos em processos de contra‑ordenação fiscal em comparação com os arguidos em outros processos de contra‑ordenação. É que, por um lado, toda a nossa tradição jurídica vai no sentido de se fixar um prazo de prescrição das transgressões que atualmente são contra‑ordenações fiscais superior ao que era estabelecido para as transgressões em geral. Por outro lado, como sublinha o Exm.º Procurador‑Geral Adjunto nas suas alegações, “a relevância das funções cometidas pela Lei Fundamental ao ‘sistema fiscal’ (artigos 106.º e 107.º da Constituição da República Portuguesa) constituirá suporte material bastante para legitimar o estabelecimento de um regime especial de prescrição do procedimento contra‑ordenacional fiscal menos favorável aos infratores, dificultando e desincentivando a fuga ao cumprimento dos deveres fiscais – essenciais à satisfação das necessidades financeiras do Estado e demais entidades públicas e à realização de relevantes objetivos de justiça social”. Por último, como salientam A. Barros Lima Guerreiro / M. Silvério Elias Mateus (cfr. Código de Processo Tributário Comentado, Lisboa, Edifisco, 1991, p. 68), a norma impugnada no presente recurso visou harmonizar o prazo de prescrição do processo de contra‑ordenação fiscal com o prazo de caducidade do direito de liquidação dos impostos, pelo que “um prazo mais curto de prescrição do procedimento por contra‑ordenações fiscais dificultaria a liquidação das obrigações tributárias no prazo legal, retirando qualquer incentivo à regularização tributária do contribuinte no período que faltasse para a caducidade da liquidação, (e) criaria situações de desigualdade entre os infratores”.

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