TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 104.º volume \ 2019

179 acórdão n.º 20/19 do agente, o que será avaliado em função das específicas nuances do evento e do pleno das circunstâncias enformadoras do concreto sucesso submetido a juízo. III – Na análise a efetuar há que ter presente, por um lado, a “natureza do meio/instrumento/arma, que é utilizado”, e por outro, averiguar as “circunstâncias acompanhantes”, isto é, o real, o naturalístico modo de execução do facto, e o conjunto concreto de circunstâncias em que aquela concreta arma/meio/ins- trumento de agressão, no caso de bens eminentemente pessoais, foi utilizada: a distância a que o agressor se encontrava da vítima (a curta distância, com disparo à queima-roupa, ou não), a situação em que esta se encontrava (prevenida ou desprevenida, desprotegida, descuidada, indefesa, com possibilidade de resistência ao agressor ou não), a zona do corpo atingida, o momento e o local escolhido para a agressão, com actuação em espaço fechado, ou aberto, com ou sem espera, com ou sem emboscada, com ou sem estratagema, com ou sem traição, com ou sem perfídia, disfarce, surpresa, dissimulação, engano, abuso de confiança, ou distração da vítima, ou não, de forma sub-reptícia, ou não, de forma imprevista ou não, com ataque súbito, inesperado, sorrateiro, ou não, com ou sem possibilidade de a vítima oferecer resistência, enfim, todo o conjunto de factores envolventes e circunstâncias acompanhantes/determinantes do evento letal, ou quase letal, no traço de um desenho panorâmico, de uma imagem multifacetada, de supervisão, de síntese, a final, de um retrato vivencial, de uma fotografia, guardadora de eventos ocorridos, condensada, definida, a juzante, com todos os contornos e pormenores, independentemente dos retoques, e que mais do que a natureza da arma ou instrumento utilizado, indiciam o meio utilizado naquele analisado concreto agir, como particularmente perigoso ou insidioso. 32. Os exemplos jurisprudenciais e Doutrinários supra mencionados que se poderiam multiplicar “ad nau- seam”, servem bem para ilustrar a imprecisão, indeterminação ou o carácter vago que o conceito de “meio insi- dioso” inculca para poder servir de critério balizador do tipo de culpa que o n.º 1, do art.º 132.º do C.P. encerra, tipo de culpa integrado pela indeterminação da cláusula geral de especial censurabilidade ou perversidade. 33. Precisar-se uma cláusula geral com um conceito vago equivale à manutenção da imprecisão. Já se viu que à luz da orientação deste Tribunal, por força das exigências da legalidade penal, não basta para a qualificação do homicídio que o facto ou a conduta do agente se revele especialmente censurável ou perversa. Necessário se torna, que o caso sub juditio passe pelo crivo orientador de qualquer das circunstâncias padrão expressas pelo menos, numa das alíneas do n.º 2, do preceito em análise. Razão pela qual, os tipos expressivos que geram exemplos regra ou padrão não poderem, eles mesmos, padecer do vício da imprecisão, sob pena de se atentar contra o tipo de garantia ou determinabilidade das normas penais que fundamentam ou agravam a responsabilidade jurídico-penal, tanto mais, no tipo incriminador que é considerado o mais grave do nosso ordenamento jurídico. 34. A interpretação das normas previstas nos n. os 1 e 2, al. i) , do art.º 132.º, como no caso do objeto do presente recurso, permitindo a qualificação do homicídio por referência à utilização de meio insidioso, como susceptível de evidenciar uma especial censurabilidade ou perversidade é inconstitucional por violação do princípio da legalidade e da tipicidade, na vertente da determinação da lei penal incriminadora, porquanto não permite a determinabi- lidade objetivamente controlável que o balizamento da citada cláusula geral postula, porque o exemplo-padrão consignada na parte final da referida al. i) constitui um conceito vago e indeterminado que não permite uma área e um fim de protecção de norma claramente determinados. 35. Unanimidade Doutrinária e Jurisprudencial existem quanto ao facto de não bastar que o facto se subsuma na previsão normativa de qualquer das circunstâncias vertidas no n.º 2, do art.º 132.º, do C.P. para que, sem mais, se possa qualificar o homicídio como agravado. 36. Diz-se, em síntese conclusiva, que o funcionamento dos exemplos-padrão não é automático (no sentido de fundamentar a qualificação do homicídio). De outro modo, mal se compreenderia a referência legislativa feita no corpo do n.º 2 do preceito em análise, à mera susceptibilidade das referidas circunstâncias revelarem a especial censurabilidade ou perversidade a que se refere o número anterior. 37. Teresa Serra retira dois indícios da técnica dos exemplos-padrão: um efeito de indício negativo, postulando que não se verificando qualquer das circunstâncias previstas nas alíneas do n.º 2, do art.º 132.º, do C.P. tal é

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