TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 104.º volume \ 2019
148 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL , em nota ao então artigo 168, CRP, «(....) A CRP de 1976 não aboliu a figura do Governo-legislador, mas, pri- meiro, alargou substancialmente o elenco das matérias reservadas (primitiva redação do art.º 167.º) para, depois, na revisão constitucional de 1982, criar uma esfera de reserva absoluta (atual art.º 167.º, aumentando ao mesmo tempo a esfera da reserva legislativa (tendo sido acrescentadas as atuais als d , e , f , g , h , p , s , u , x e z). A LC n.º 1/89 também ampliou, embora em menor medida, o leque da competência reservada, aditando as als r e aa. II. E fácil reunir em três grupos as múltiplas alíneas deste artigo: matérias respeitantes aos direitos fundamen- tais (als a a h ); matérias respeitantes à «constituição económica» (als i a p , x e aa ); matérias respeitantes à organiza- ção política e administrativa do Estado (als q e v ). (....). IV. O alcance da reserva de competência legislativa da AR não é idêntico em todas as matérias. Importa distinguir três níveis: (a) um nível mais exigente, em que toda a regulamentação legislativa da matéria é reservada à AR–, é o que ocorre na maior parte das alíneas; (b) um nível menos exigente, em que a reserva da AR se limita ao regime geral (als d, e, h e p ), ou seja, em que compete à AR definir o regime comum ou normal da matéria, sem pre- juízo, todavia, de regimes especiais que podem ser definidos polo Governo (ou, se for caso disso pelas assembleias regionais); (c) finalmente, um terceiro nível, em que a competência da AR é reservada apenas no que concerne às bases gerais do regime jurídico da matéria (als f, g, n, v e x ) (....) VIII. A al b) – direitos, liberdades e garantias – inclui seguramente a regulamentação de todos os direitos fundamentais anunciados no Titulo II da Parte I da Constituição, mas parece abranger também os direitos cons- titucionais de natureza análoga mencionados no art.º 17.º (que, segundo esse preceito, gozam do mesmo regime). Desde logo os arts 20.º,21.º, 22.º e 23. Mais problemático é o caso dos direitos fundamentais de natureza análoga previstos na lei. (....). X. Em relação aos restantes direitos sancionatórios explicitamente previstos na Constituição –o direito disciplinar e o de mera ordenação social–, constitui reserva legislativa de AR apenas o respetivo «regime geral» (al. d ). Cabe assim à AR definir a natureza do ilícito e os tipos de sanções, bem como os seus limites, além das regras gerais do respetivo processo incluindo o processo de execução, mas não a definição de cada infração concreta e a cominação da respetiva pena. Ao referir o ilícito de mera ordenação social, omitindo toda a referência à figura das contravenções (que era tradicional no direito português até ao Código Penal de 1982), a Constituição deixou entender claramente que ela desapareceu como tipo sancionatório autónomo, pelo que as contravenções que subsistirem (ou que forem ex novo criadas) têm de ser tratadas de acordo com a natureza que no caso tiverem (criou de mera ordenação social). Problemático é também o caso das chamadas sanções penais administrativas, cuja autonomia é discutível, face ao silêncio da Constituição. Na medida em que possam ser admitidas como figura independente do direito contraor- denacional, então por identidade de razão deve a sua disciplina legislativa genérica ser considerada também como reserva parlamentar. (....)». O direito contraordenacional não é direito administrativo. O direito contraordenacional é um direito de tipo penal, dito penal especial ou, noutra formulação, direito para-penal, que, por isso, tem como direito subsidiário substantivo o Código Penal [CP], e como direito adjetivo subsidiário o Código de Processo Penal [CPP], nos ter- mos, respetivamente, dos artigos 32 e 41, ambos do RGCO. E por isso se encontra no quadro do artigo 32 da CRP. No âmbito do direito criminal, o artigo 32-10, da CRP, sob a epígrafe «(Garantias de processo criminal)» impõe que «10. Nos processos de contraordenação, bem como em quaisquer processos sancionatórios, são assegu- rados ao arguido os direitos de audiência e defesa». Assim, o direito contraordenacional é um direito para-penal, com garantia constitucional do cidadão, e serve, como o direito penal, para punir comportamentos ilícitos, pela violação de bens jurídicos ordenacionais, que, podendo ser axiologicamente neutros, têm em regra uma menor ressonância ética 5 [5 Expressões do Prof Doutor Figueiredo Dias, vide, entre muitos, e pedindo vénia para tal, as n/ Reflexões sobre o Direito Contraordenacional» 1997 , SPB Editores (esgotado), pg 42, e referências bibliográficas, pata além de outras mencionadas no texto, de fls 45; e as nossas Contraordenações e Coimas. Regime Geral. Anotado . 2.ª Edição, Petrony Editora, 2013, p 13-25. 51/ss, doutrina e jurisprudência ali citadas, bem como os Acórdãos doutrinários e de fixação de jurisprudências, do STJ, transcritos a fls 719/ss, desta última obra.]
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