TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 104.º volume \ 2019
125 acórdão n.º 11/19 e aos tribunais constante do artigo 20.º, n.º 1, da Constituição, como se evidencia pela passagem em que se refere, «à semelhança do decidido no Acordão do Tribunal Constitucional n.º 654/06, (…) que a aplicação do anexo à Lei n.º 34/2004 que remete a apreciação da insuficiência económica para o rendimento relevante do agregado familiar e para a fórmula matemática prevista nos artigos 6.º a 10.º da Portaria n.º 1085-A/2004, determina um resultado contrário ao direito fundamental de acesso ao direito e aos tribunais». 6. O instituto do apoio judiciário visa obstar a que, por insuficiência económica, seja denegada justiça aos cidadãos que pretendem fazer valer os seus direitos nos tribunais, decorrendo, assim, a sua criação do imperativo constitucional plasmado no artigo 20.º, n.º 1, da Constituição. Como se escreveu no Acórdão n.º 98/04, deste Tribunal, «não basta, obviamente, para cumprir tal imperativo, a mera existência do referido instituto no nosso ordenamento; impõe-se que a sua modelação seja adequada à defesa dos direitos, ao acesso à Justiça, por parte daqueles que carecem dos meios económi- cos suficientes para suportar os encargos que são inerentes à instauração e desenvolvimento de um processo judicial, designadamente custas e honorários forenses». O sistema do apoio judiciário visa concretizar o direito fundamental de acesso ao direito e aos tribunais consagrado no artigo 20.º, n.º 1, da Constituição, garantindo a todos «o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesse legalmente protegidos», e estabelecendo que a justiça não pode ser denegada por insuficiência de meios económicos. Esta garantia é imprescindível à proteção dos direitos fundamentais e, como tal, inerente à ideia de Estado de direito: sem prejuízo da sua natureza de direito prestacionalmente dependente e de direito legal- mente conformado, a Constituição assegura a todos que não se pode ser privado de levar a respetiva causa à apreciação de um tribunal (cfr. Gomes Canotilho e Vital Moreira, anotação I ao artigo 20.º, Constituição da República Portuguesa Anotada, vol. I, 4.ª edição, Coimbra Editora, Coimbra, 2007, p. 408). Além disso, o conteúdo deste direito não pode ser esvaziado ou praticamente inutilizado por insuficiência de meios económicos. Se os serviços de justiça não têm de ser necessariamente gratuitos, também não podem ser «tão onerosos que dificultem, de forma considerável, o acesso aos tribunais», pelo que «os encargos [com tal acesso terão] de levar em linha de conta a incapacidade judiciária dos economicamente carecidos e observar, em cada caso, os princípios básicos do Estado de direito, como o princípio da proporcionalidade e da adequa- ção» (vide idem , ibidem , anotação VI ao artigo 20.º, p. 411). Nesta perspetiva, a concessão de proteção jurí- dica garantidora do direito de acesso aos tribunais corresponde a uma dimensão prestacional de um direito, liberdade e garantia (vide idem , ibidem ); não a uma simples refração do direito à segurança social (cfr. idem , ibidem , p. 412). Tratando-se de um instrumento jurídico-financeiro que dá cumprimento à dimensão «prestacional» compreendida naquele direito fundamental, deve cumprir a função constitucional de «garantir uma igual- dade de oportunidades no acesso à justiça, independentemente da situação económica dos interessados», como tem sido reconhecido em vários momentos pelo Tribunal Constitucional (cfr., a título de exemplo, os Acórdãos n. os 433/87 e 352/91). Mas se é assim, temos que a igualdade de oportunidades no acesso à justiça que releva é uma igualdade material referida aos elementos pertinentes do sistema de justiça que são suscetíveis de impedir ou dificultar a motivação do cidadão de recorrer a ela, na defesa dos seus direitos e interesses legítimos, decorrendo, desde logo, do artigo 13.º, n.º 2, da Constituição. São, essencialmente, dois os fatores que condicionam o acesso dos cidadãos ao sistema de justiça: a pos- sibilidade económica de suportar os honorários do patrono judiciário e a de arcar com as custas da respetiva ação judicial, no caso de se ter de recorrer a juízo. Daí que a previsão do benefício, por parte do legislador ordinário, se traduza nas modalidades de infor- mação jurídica e de proteção jurídica, decompondo-se esta, por seu turno, na consulta jurídica e no apoio judiciário (cfr. artigos 4.º e 6.º da Lei do Apoio Judiciário).
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