TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 104.º volume \ 2019
113 acórdão n.º 7/19 E sendo assim, é possível identificar, também no caso da recorrente, uma contrapartida presumivel- mente provocada e aproveitada pela recorrente, enquanto sujeito passivo, que o legislador faz repercutir, através da CESE, nestes operadores económicos sujeitos a regulação, e não na comunidade em geral. Como se refere na decisão recorrida, no contexto do Estado regulador, «as contribuições financeiras impostas aos operadores económicos, quer para financiar os sobrecustos do sistema, quer para financiar novos encargos no contexto da regulação social, cumprem ainda a exigida “conexão entre a origem das receitas [o pressuposto do tributo] e o destino [finalidade] que a lei lhes assinala”; conexão que neste caso é reconduzida a uma ‘relação causal’ entre o Estado, na qualidade de garantidor do funcionamento eficiente e socialmente equitativo do sistema (neste caso do sector energético), e o sujeito passivo»; e «a CESE, ao ser exigida aos operadores do sector energético com o intuito de financiar políticas do sector energético de cariz social e ambiental, relacionadas com medidas de eficiência energética e com a redução do stock da dívida tari- fária do Sistema Elétrico Nacional, inscreve-se claramente neste tipo de contribuições exigidas pelo modelo económico-social do Estado regulador». Neste sentido pronunciou-se igualmente o Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República, no seu Parecer n.º 4/2016 (publicado no Diário da República , 2.ª série, de 2 de março de 2018): «[A] CESE, correspondendo a uma relação de bilateralidade genérica, no sentido acima referido, [trata-se] de uma contribuição financeira. A CESE é uma contrapartida para o financiamento da eficiência energética e da redução da dívida do SEN, exigida pelo modelo do Estado regulador.» 11. Evidentemente, ao contrário do que pretende a requerente, o facto de a CESE ter, igualmente, como objetivo a redução da dívida tarifária do SEN, encarado, também ele, como um mecanismo que promove a sustentabilidade sistémica do sector energético, tal não faz obnubilar aquela outra contrapartida. Deixando de lado o problema de saber se a CESE assume natureza extraordinária, ponto relativamente ao qual o Tribunal Constitucional, atendendo ao objeto do pedido, não tem de se pronunciar – in casu está em causa apenas a apreciação da aplicabilidade da CESE pela primeira vez e no ano para o qual a mesma foi originariamente criada (ano de 2014) – é de acompanhar, sem reservas, a apreciação deste aspeto realizada na decisão recorrida: «Em relação à afetação de um terço da receita da contribuição à redução da dívida tarifária do Sector Elétrico Nacional, cumpre sublinhar que, efetivamente, nesta parte, existe uma redução intensa (senão mesmo uma exclu- são) do nexo causal que é pressuposto desta afetação do tributo, uma vez que é especialmente difícil sustentar que a exigência da CESE aos operadores económicos do sector do gás natural tem sentido no contexto da amortização de um stock de dívida que foi gerado pela adoção de medidas de regulação social no subsector da energia elétrica (o stock da dívida tarifária do sector elétrico é consequência da cláusula-travão na admissibilidade da repercussão inte- gral dos custos do Sistema Elétrico Nacional nas tarifas a suportar pelos consumidores finais), mesmo sabendo que as empresas que hoje são credoras dessa dívida tarifária (pelo menos uma parte significativa das que recebem custos de manutenção do equilíbrio contratual ou garantia de potência e que operam centrais termelétricas) são consumi- doras de gás natural que é fornecido pelas operadoras deste segundo sector e através das respetivas infraestruturas. Todavia, essa atenuação (ou mesmo interrupção) do nexo causal respeitante a um terço do valor da contribui- ção não se afigura suficiente para determinar a se uma situação de desproporção significativa entre a exigência do tributo e a finalidade a que o mesmo se destina, pois não só dois terços do valor do mesmo mantêm, como veremos, aquele nexo causal, como ainda a CESE assume um carácter extraordinário. Este carácter extraordinário está logo expresso na sua mesma qualificação legal – sendo que não pode deixar de atribuir-se a esta toda a relevância. Naturalmente que, se o legislador qualifica e designa ab initio um tributo como “extraordinário”, é porque o seu fundamento está numa circunstância ou razão excecional, que “exige” a sua insti- tuição, e a sua instituição com a configuração que o legislador lhe dá. Ainda que a lei não estabeleça expressamente
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