TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 104.º volume \ 2019
110 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL O imposto, enquanto prestação unilateral, não corresponde a nenhuma contraprestação específica atribuída ao contribuinte por parte do Estado; ele terá apenas a contrapartida genérica do funcionamento dos serviços estaduais. Ao carácter unilateral da prestação de imposto contrapõe-se a natureza sinalagmática das taxas. A sinalagmaticidade que caracteriza as quantias pagas a título de taxa só existirá quando se verifique uma contrapartida resultante da relação concreta com um bem semipúblico, que, por seu turno, se pode definir como um bem público que, satisfaz, além de necessidades coletivas, necessidades individuais (vide Teixeira Ribeiro, em “Noção jurídica de taxa”, na Revista de Legislação e de Jurisprudência , ano 117.º, p. 291). A taxa “pressupõe, ou dá origem, a uma contraprestação específica resultante de uma relação concreta (que pode ser ou não de benefício) entre o contribuinte e um bem ou serviço público”, sendo “grande a variabilidade do conteúdo jurídico do conceito, resultante da diversidade das situações que geram as obrigações de taxa e das múltiplas delimitações formais da respetiva noção financeira” (Sousa Franco, na ob. cit. , pp. 63-64). Mas, fugindo a esta divisão dicotómica dos tributos, tem sido apontada a existência de outras figuras marginais designadas como tributos parafiscais [artigo 3.º, n.º 1, a) , da Lei Geral Tributária], nos quais se incluem, com especial visibilidade, as contribuições cobradas para a cobertura das despesas de pessoas coletivas públicas não territoriais, que resultam numa verdadeira consignação subjetiva de receitas (sobre os tributos parafiscais, nomea- damente as referidas contribuições, vide Alberto Xavier, em Manual de direito fiscal , vol. I, pp. 64 e seg., da ed. de 1974, Sousa Franco, ob. cit., pp. 74 e seg., Casalta Nabais, em Direito fiscal , p. 32, da 3.ª edição, da Almedina, e em O dever fundamental de pagar impostos , pp. 256 e seg., da ed. de 1998, da Almedina, e Saldanha Sanches, na ob. cit. , pp. 58-65). A criação de tais contribuições a favor de determinadas pessoas coletivas públicas distintas da Administração estadual, regional ou local, visam o seu sustento financeiro, escapando à disciplina jurídica clássica, como forma de evitar o crescimento do défice das contas públicas e contornar a rigidez do regime dos impostos, através da previsão de meios financeiros mais dúcteis. Como escreveu Sousa Franco: “Nas contribuições parafiscais há (…) uma maior agilidade atribuída à administração pública, quanto ao modo de criação e agravamento e quanto ao próprio regime geral dessas receitas, tornando mais fácil o seu processo de lançamento, liquidação e cobrança” (na ob. cit. , p. 76). Após estes considerandos, cabe agora perguntar se é possível, conforme pretende a Recorrente, atribuir a natu- reza de imposto, à “taxa” sub judice . Obviamente, na economia do presente recurso de constitucionalidade, apenas relevará o regime jurídico concreto da “taxa de regulação e supervisão”, sendo completamente irrelevante o nomen juris atribuído na lei. Como resulta do disposto no artigo 4.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 103/2006, de 7 de junho, a “taxa” de regu- lação e supervisão é precisamente uma contribuição para o financiamento da ação quotidiana da ERC, a qual é exigida pela natureza da atividade desenvolvida pelos sujeitos passivos da taxa. São os custos do serviço de moni- torização e acompanhamento contínuo e permanente de cada entidade que prossiga atividades de comunicação social, operando nesse mercado, em ordem a assegurar o cumprimento das competências que estão atribuídas à ERC, que esta taxa visa satisfazer. Sendo a atividade desenvolvida por essas entidades a causa da necessidade da ERC ter que empreender ações de regulação e de supervisão contínuas, e beneficiando aquelas da vigilância no cumprimento das regras estabelecidas para o sector e da efetiva concorrência ao nível dos produtos oferecidos, entendeu-se que devem os seus agentes contribuir proporcionalmente para o financiamento dos custos dessas ações essenciais à existência de um mercado plural. Foi esta a filosofia que presidiu à criação desta “taxa”. Não estamos, pois, no seu aspeto dominante, perante uma participação nos gastos gerais da comunidade, em cumprimento de um dever fundamental de cidadania, nem perante a retribuição de um serviço concretamente prestado por uma entidade pública ao sujeito passivo, pelo que a referida “taxa” não se pode qualificar nem como imposto, nem como uma verdadeira taxa, sendo tais tributos antes qualificáveis como contribuições, incluídas na designação genérica dos tributos parafiscais (vide, adotando esta qualificação relativamente às “taxas” financiadoras
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