TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 103.º volume \ 2018
516 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL sejam imunes a um controle de constitucionalidade que verifique, nomeadamente, se esses ónus são funcio- nalmente adequados aos fins do processo, ou se as cominações ou preclusões que decorram do seu incum- primento se revelam totalmente desproporcionadas perante a gravidade e relevância da falta, ou ainda, se de uma forma inovatória e surpreendente, face ao texto legal em vigor, são impostas às partes exigências formais que elas não podiam razoavelmente antecipar, sendo o desculpável incumprimento sancionado em termos irremediáveis e definitivos». E a propósito da conformidade dos ónus processuais com o princípio da proporcionalidade refere-se no Acórdão n.º 462/16 que «os ónus impostos não poderão, por força dos artigos 13.º e 18.º, n. os 2 e 3, da Cons- tituição, impossibilitar ou dificultar, de forma arbitrária ou excessiva, a atuação procedimental das partes, nem as cominações ou preclusões previstas, por irremediáveis ou insupríveis, poderão revelar-se totalmente desproporcionadas face à gravidade e relevância, para os fins do processo, da falta cometida, colocando assim em causa o direito de acesso aos tribunais e a uma tutela jurisdicional efetiva (cfr., sobre esta matéria, Carlos Lopes do Rego, “Os princípios constitucionais da proibição da indefesa, da proporcionalidade dos ónus e cominações e o regime da citação em processo civil”, in Estudos em Homenagem ao Conselheiro José Manuel Cardoso da Costa , Coimbra Editora, 2003, pp. 839 e seguintes e, entre outros, os Acórdãos n. os 564/98, 403/00, 122/02, 403/02, 556/08, 350/12, 620/13, 760/13 e 639/14 do Tribunal Constitucional)». 8. No que respeita ao ónus processual previsto no artigo 351.º do CPC – promoção do incidente de habilitação de herdeiros – tem todo o sentido que o legislador, dentro da liberdade de conformação que tem na modelação do processo civil, o faça recair sobre as «qualquer das partes que sobreviverem». A lei diz «qual- quer» dos sobreviventes para significar que, havendo uma pluralidade de autores ou de réus, a habilitação pode ser deduzida por qualquer um dos autores ou por qualquer um dos réus que sobreviverem, não sendo indispensável que se apresentem todos as requerer a habilitação, basta que a requeira um deles. Como referimos, o falecimento de uma das partes provoca alterações nos elementos subjetivos da rela- ção jurídica processual inicialmente constituída. Como a ação não pode prosseguir contra a parte falecida, impõe-se substitui-la pelos seus sucessores. Daí que se diga que o incidente de habilitação de herdeiros tem carácter obrigatório, no sentido de que enquanto a habilitação não for decretada, a ação não prossegue (Alberto Reis, Código de Processo Civil Anotado, Vol. I, p. 575). Estamos, assim, perante um “acidente” no desenvolvimento do direito de ação, que as normas dos artigos 270.º e 351.º convertem em ónus impen- dente sobre qualquer das partes sobrevivas. O incidente de habilitação por sucessão, para determinar quem têm legitimidade para ocupar no litígio a posição da parte falecida, interessa a todas as partes sobrevivas. Todas elas se encontram numa situação jurídica que implica a necessidade de requerer a habilitação dos sucessores da parte falecida para que a ação possa prosseguir. A lei entende por esse modo prestar às partes um meio para a tutela do seu interesse próprio no desenvolvimento da ação; trata-se, pois, de um poder que há de ser exercido no interesse próprio de cada uma das partes sobrevivas. Na prática, o ónus de promoção desse incidente recai sobretudo sobre os autores sobrevivos, pois não é de esperar que os sucessores do réu venham a juízo por iniciativa espontânea, nem que o réu sobrevivo tenha empenho em habilitar, contra si, o autor; e, tratando-se de pluralidade de autores, bem pode acontecer que os sucessores do autor falecido não tenham sequer conhecimento da ação. Num processo civil de tipo dispositivo, tal como se encontra estruturado no CPC, não surpreende a existência de ónus processuais: a relação jurídica processual não se exprime apenas por direitos e deveres, mas também por ónus e sujeições. Com efeito, não obstante os amplos poderes de gestão processual de que dispõe o juiz e a exigência de cooperação entre o tribunal e as partes, a direção ativa do processo pelo juiz faz-se «sem prejuízo do ónus de impulso especialmente imposto pela lei às partes» (n.º 1 do artigo 6.º do CPC). Assim, para além do impulso processual inicial (artigo 3.º do CPC), preceitos especiais podem impor às partes (autores ou reconvintes) ónus de impulso subsequente, mediante a prática de determinados atos cuja omissão impede o prosseguimento da causa.
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