TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 103.º volume \ 2018

479 acórdão n.º 566/18 desconformidade constitucional imputada a normas jurídicas ou a interpretações normativas, e já não das questões de inconstitucionalidade imputadas diretamente a decisões judiciais, em si mesmas consideradas. Constitui jurisprudência uniforme do Tribunal Constitucional que o recurso de constitucionalidade, reportado a determinada interpretação normativa, tem de incidir sobre o critério normativo da decisão, sobre uma regra abstratamente enunciada e vocacionada para uma aplicação potencialmente genérica, não podendo destinar-se a sindicar o puro ato de julgamento, enquanto ponderação casuística da singularidade própria e irrepetível do caso concreto, daquilo que representa já uma autónoma valoração ou subsunção do julgador – não existindo no nosso ordenamento jurídico-constitucional a figura do recurso de amparo de queixa constitucional para defesa de direitos fundamentais. A distinção entre os casos em que a inconstitucio­ nalidade é imputada a interpretação normativa daqueles em que é imputada diretamente a decisão judicial radica em que, na primeira hipótese, é discernível na decisão recorrida a adoção de um critério normativo (ao qual depois se subsume o caso concreto em apreço), com carácter de generalidade, e, por isso, suscetível de aplicação a outras situações; enquanto, na segunda hipótese, está em causa a aplicação dos critérios nor­ mativos tidos por relevantes às particularidades do caso concreto (cfr. o Acórdão deste Tribunal n.º 138/06, acessível, assim como os demais adiante citados em http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/ ). Nos recursos interpostos ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC – como ocorre no pre- sente processo –, a sua admissibilidade depende ainda da verificação cumulativa dos requisitos de a questão de inconstitucionalidade haver sido suscitada «durante o processo», «de modo processualmente adequado perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida, em termos de este estar obrigado a dela conhecer» (n.º 2 do artigo 72.º da LTC), e de a decisão recorrida ter feito aplicação, como sua ratio decidendi , das dimensões normativas arguidas de inconstitucionais pelo recorrente. Consistindo a competência do Tribunal Constitucional, no domínio da fiscalização concreta, na facul- dade de revisão, em via de recurso, de decisões judiciais, compreende-se que a questão de constitucionalidade deva, em princípio, ter sido colocada ao tribunal a quo, além de que permitir o acesso a este Tribunal com base numa invocação da inconstitucionalidade unicamente após a prolação da decisão recorrida, abriria o indesejável caminho à sua utilização como expediente dilatório. Daí que só tenha legitimidade para pedir ao Tribunal Constitucional a fiscalização de constitucionalidade de uma norma quem tenha suscitada previa- mente essa questão ao tribunal recorrido, em termos de o vincular à sua apreciação, face às normas procedi- mentais que regem o processo em que se enxerta o recurso constitucional. Por outro lado, considerando o caráter ou função instrumental dos recursos de fiscalização concreta de constitucionalidade face ao processo-base, exige-se, para que o recurso tenha efeito útil, que haja ocorrido efetiva aplicação pela decisão recorrida da norma ou interpretação normativa cuja constitucionalidade é sin- dicada. É necessário, pois, que esse critério normativo tenha constituído ratio decidendi do acórdão recorrido, pois, só assim, um eventual juízo de inconstitucionalidade poderá determinar uma reformulação dessa deci­ são (cfr. o artigo 80.º, n.º 2, da LTC). Refira-se ainda que o objeto do recurso constitucional é definido, em primeiro lugar, pelos termos do requerimento de interposição de recurso. Tem sido entendimento constante do Tribunal Constitucional que, ao definir, no requerimento de interposição de recurso, a norma ou interpretação normativa cuja cons- titucionalidade pretende sindicar, o recorrente delimita, em termos irremediáveis e definitivos, o objeto do recurso, não lhe sendo consentida qualquer modificação ulterior, com exceção duma redução do pedido, nomeadamente, no âmbito da alegação que produza. Expostos, sumariamente, os pressupostos essenciais ao conhecimento do recurso de constitucionali- dade interposto nos termos do artigo 70.º, n.º 1, alínea b) , da LTC, cumpre verificar o seu preenchimento, relativamente às questões colocadas pela recorrente neste processo, tomando em consideração as normas ou interpretações normativas enunciadas nos pontos 1.1, 2.1., 3.1, 4.1. e 5.1. do requerimento de interposição de recurso (em cada caso, «exatamente [o] entendimento geral e abstrato que a ora recorrente pretende con- testar, por ser contrário à Constituição da República Portuguesa»).

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