TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 103.º volume \ 2018

363 acórdão n.º 496/18 Não obstante também terem sido interpostos recursos da segunda decisão, tanto pela demandada como pelo Ministério Público, só a primeira decisão (recorrida apenas pelo Ministério Público) foi objeto da Decisão Sumária. Com efeito, decorre do ponto 9 da Decisão Sumária (último parágrafo antes da Decisão, na página 30) que, “atenta a natureza instrumental do recurso de constitucionalidade, se deva considerar prejudicado, por inutilidade, o conhecimento da segunda questão objeta do recurso interposto pelo Ministério Público, bem como da questão objeto do recurso da demandada C., Lda.”. 2. Da primeira decisão apenas o Ministério Pública recorreu, fazendo-o ao abrigo do artigo 72.º, n.º 3 da LTC. Os recursos de fiscalização concreta – como o presente – são necessariamente interpostos nos termos do artigo 75.º-A da LTC (…), preceito que é aliás convocado pelo Magistrado do Ministério Público no requerimento de interposição do recurso que apresentou. E de acordo o n.º 1 desse artigo 75.º-A da LTC, o recorrente tem de indicar a norma cuja inconstitucionalidade ou ilegalidade se pretende que o Tribunal aprecie. No caso, estamos perante um recurso interposto ao abrigo do artigo 70.º, n 1, alínea a) da LTC e, portanto, de uma decisão que recusou a aplicação de uma norma. A “norma”, nos termos desses dois preceitos, pode consistir numa determinada interpretação normativa, no sentido de o tribunal a quo ter veiculado na decisão recorrida apenas uma determinada dimensão interpretativa dessa norma. O que releva, como aponta o Venerando Conselheiro Carlos Lopes do Rego, é que “como é evidente, tal inter- pretação normativa, especificada pelo recorrente, deverá identificar o “critério normativo” que subjaz à decisão recorrida” […] 3. Mas a verdade é que no recurso que interpôs, o Ministério Público se limita a transcrever o artigo desapli- cado, sem “especificar o critério normativo que subjaz à decisão recorrida”. Essa ausência teria imposto a prolação de um despacho de aperfeiçoamento ao abrigo do artigo 75.º-A, n.º 5 da LTC que, tanto quanto se sabe, não existiu. A prolação do despacho de aperfeiçoamento era decisiva para o desfecho destes autos. Por um lado, o Ministério Público poderia nem responder ao convite endereçado, o que levaria à rejeição ime- diata e em termos puramente formais (processuais) do recurso interposto. Mas o recurso poderia vir também a ser rejeitado em termos materiais. Com efeito, na resposta que o Ministério Público poderia dar a esse despacho concorreriam duas circunstâncias que poderiam levar à não admissão do recurso: – é que “ao definir, no requerimento de interposição de recurso, a norma ou interpretação normativa que pre- tende submeter ao Tribunal Constitucional, o recorrente delimita, em termos irremediáveis e definitivos, o objeto do recurso” […], sendo que – essa norma ou essa interpretação normativa que foram definidas no requerimento de interposição do recurso deverão “inteiramente coincidir com a que foi [na decisão impugnada] adotada, como ratio deci­ dendi […]. Caso o Ministério Público não respondesse ao despacho de aperfeiçoamento ou não lograsse identificar a interpretação normativa que foi a ratio decidendi da decisão recorrida, o recurso interposto deveria ser rejeitado. Pelo que é evidente que a omissão verificada influiu na decisão da causa. A ausência de prolação de despacho de aperfeiçoamento determina a nulidade da Decisão Sumária, ao abrigo do artigo 195.º, n.º 1 do Código de Processo Civil, aplicável ex vi artigo 69.º da LTC. 4. Poder-se-á então dizer que o Venerando Relator considerou que a norma objeto do recurso interposto pelo Ministério Público é simplesmente o artigo 3.º, n.º 1 da Lei n.º 62/2011 e não uma sua qualquer dimensão inter- pretativa, não o tendo portanto convidado a aperfeiçoar o requerimento de interposição. Mas, nesse caso, a norma não “coincide inteiramente com a que foi adotada na ratio decidendi da decisão impugnada”.

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